Benefícios a curto prazo
Não significa, porém, que o jejum falhe em baixar o ponteiro na balança. Parece contraditório, né? Mas uma pesquisa recente da Universidade de Illinois, nos Estados Unidos, ilustra bem a dimensão do debate. Publicada em um respeitado periódico científico, ela contou com a participação de 100 obesos, que foram divididos em três grupos: o primeiro aderiu a um tipo de jejum, o segundo reduziu as calorias e o terceiro continuou a vida normal. Quer saber o placar?
A turma da barriga vazia seguiu um modelo assim: no dia da privação, devia consumir 25% das necessidades calóricas. Complicou? Bem, vamos supor que, normalmente, esses indivíduos pudessem ingerir 2 mil calorias. Então, no jejum, teriam à disposição somente 500 calorias. Por outro lado, no dia seguinte estavam liberados para chegar a 125% das suas necessidades calóricas, isto é, 2 500 calorias. Em resumo: ora comiam míseras 500 calorias, ora se refestelavam com cinco vezes mais do que isso. Já entre a parcela que passou pela restrição clássica, a orientação foi cortar, todos os dias, 25% das necessidades calóricas habituais – seria o equivalente a comer 1 500 calorias em vez de 2 mil.
Os voluntários ficaram um ano nessa toada. Depois disso, veio o primeiro resultado: quem caiu em um desses dois grupos (do jejum ou da restrição) emagreceu mais em comparação àquele pessoal que não recebeu nenhuma instrução dietética. Até aí, nada de novo. A grande descoberta do projeto veio, claro, ao comparar as duas intervenções. É que, no fim das contas, ambas levaram praticamente ao mesmo desfecho. Enquanto jejuar enxugou o peso em 6%, maneirar nas garfadas diariamente reduziu em 5,3%.
“Esse dado mostra que, para emagrecer, não é preciso passar por um processo que muitas vezes causa desconforto”, analisa a endocrinologista Maria Edna de Melo, presidente da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica (Abeso). Que o digam os voluntários de Illinois. “O jejum intermitente teve maior índice de rejeição entre os que seguiram esse plano”, nota o biólogo Bruno Chausse, pesquisador do Laboratório de Metabolismo Energético do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP).
Chausse, um dos cientistas brasileiros dedicados a entender os efeitos da prática no metabolismo, levanta uma hipótese para explicar por que é tão penoso mantê-lo. “Em muitos estudos, o jejum incita o aumento nos níveis de neurotransmissores que estimulam a fome”, explica. Para a nutricionista Sophie Deram, autora do livro O Peso das Dietas (Editora Sensus), isso é totalmente compreensível. “Trata-se de uma defesa do próprio corpo para fazer você comer”, resume.
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Para ter ideia, em trabalhos com animais que não comiam absolutamente nada durante 24 horas em dias alternados, Chausse reparou que, no período em que eles podiam se alimentar livremente, quase compensavam a fase da penúria. Na prática, é como se alguém ingerisse zero caloria em um dia e, no outro, em vez das habituais 2 mil calorias, devorasse incríveis 3 800. Apesar da fome desmedida, o pesquisador da USP percebeu que os bichos realmente estavam mais magrinhos ao fim da experiência.
No entanto, ele tem ponderações. A primeira diz respeito ao tempo de análise: somente um mês. É que em outro trabalho conduzido em seu laboratório, cuja duração foi de oito meses, deu para constatar que a perda de peso veio acompanhada de ameaças à saúde. “Embora magros, os animais do jejum apresentavam mais gordura corporal em relação aos que fizeram a restrição calórica”, informa. Tal característica contribui, por exemplo, para uma maior resistência à ação da insulina, quadro que dificulta o aproveitamento do açúcar no sangue e pavimenta o caminho para o surgimento do diabetes tipo 2.
Nesse estudo mais prolongado, ainda se observou que as cobaias submetidas ao jejum tinham concentrações mais altas de radicais livres – em excesso, essas moléculas instáveis danificam as células do corpo. “Portanto, levando em conta nossas pesquisas, o jejum parece gerar benefícios em curto prazo. Mas, lá na frente, poderia ser prejudicial”, interpreta Chausse.