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Será que você anda desnutrido? Veja os sinais da condição e como resolver

A ausência de nutrientes essenciais, como minerais e vitaminas, cobra um preço alto da saúde. Saiba o que está faltando no seu prato e como ajustar a dieta

Por Thaís Manarini
21 abr 2020, 10h36
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  • Se você pesquisar por “desnutrição” na área de imagens do Google, o principal portal de buscas da internet, perceberá que a maioria das fotos mostra indivíduos de ossos aparentes, olhos profundos e em situação de fome. Embora seja impossível dizer que a cena ficou 100% no passado, ela está longe de abarcar todas as nuances ligadas ao termo atualmente. “A sociedade e o corpo das pessoas foram se modificando, assim como a maneira de adoecer”, interpreta a nutricionista Nathália Paula de Souza, professora da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).

    Não exibir marcas da magreza e ter fácil acesso a alimentos não nos afasta das garras da desnutrição. Tanto é que esse quadro mais sorrateiro, que envolve a carência de vitaminas e minerais, ganhou até nome: fome oculta. O conceito não é novo, mas sua abrangência nunca foi tão atual.

    Segundo dados da última pesquisa Vigitel (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico), conduzida pelo Ministério da Saúde, 55,7% da população está com excesso de peso, enquanto 19,8% apresenta obesidade.

    “A prevalência desses dois problemas tem aumentado de forma contínua e intensa. A situação é alarmante”, afirma a nutricionista Sandra Chemin, coordenadora do curso de nutrição do Centro Universitário São Camilo, na capital paulista. Mas o que isso tem a ver com a desnutrição?

    Apesar de o ganho de peso envolver diversos fatores, incluindo características genéticas, um deles é preponderante: o consumo abusivo de alimentos desbalanceados — sobretudo os ultraprocessados, como refrigerantes, refeições prontas, biscoitos e salgadinhos. Muitos desses itens esbanjam carboidratos refinados e gorduras, especialmente as saturadas. Com isso, as calorias disparam.

    “Por outro lado, não há quantidades significativas de micronutrientes como vitaminas e minerais”, aponta a nutricionista Liliane Viana Pires, da Universidade Federal de Sergipe (UFS).

    Aproveitamento de nutrientes comprometido

    “É incontestável que o Brasil experimenta uma rápida transição nutricional”, analisa Aline Castaldi, coordenadora do curso de nutrição da Universidade São Francisco, em Campinas, no interior paulista. Ora, em paralelo à presença constante (e exagerada) de ultraprocessados no dia a dia, nota-se uma participação cada vez mais tímida de comida de verdade à mesa.

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    Em artigo publicado na revista Ciência e Saúde Coletiva, a professora Nathália cita que, nas últimas décadas, houve um aumento no consumo de refrigerantes, biscoitos, embutidos e refeições industrializadas na ordem de 425%, 218%, 173% e 77%, respectivamente.

    Na contramão, observou-se a queda na ingestão de ovos, gordura animal, peixes, raízes e tubérculos na proporção de 83%, 63%, 38% e 33%.

    “O avanço da tecnologia melhorou questões como desperdício de alimentos, controle sanitário e os impactos negativos da sazonalidade”, pondera a nutricionista da UFPE. “Só que as mudanças no sistema de produção, pautadas na desvalorização do homem do campo e na valorização do agronegócio, nos afastaram de hábitos saudáveis e alimentos regionais”, completa.

    Tem outra: os produtos de baixo valor nutricional que invadiram as gôndolas e seguem fazendo sucesso são baratos e palatáveis, o que atrai quem está com as finanças apertadas.

    E veja só a bola de neve: se o padrão alimentar desregrado repercute no ganho de peso, é possível que o aproveitamento de nutrientes acabe naturalmente comprometido. Em estudos na Universidade de São Paulo (USP), a professora Silvia Cozzolino, membro do Conselho Regional de Nutricionistas da 3ª Região (SP/MS), identificou que indivíduos obesos ficavam devendo em concentrações de zinco — e não exatamente por causa do baixo consumo de fontes do mineral.

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    “Vimos que a mudança no metabolismo fazia com que o nutriente ficasse retido no tecido gorduroso”, relata a pesquisadora. “Portanto, a pessoa obesa pode ter uma ingestão adequada e, mesmo assim, apresentar deficiências”, conclui.

    Desnutrição - nutrientes
    (Foto: Tomás Arthuzzi/SAÚDE é Vital)

     

    Desnutrição - nutrinentes
    (Foto: Tomás Arthuzzi/SAÚDE é Vital)
    Desnutrição - nutrientes
    (Foto: Tomás Arthuzzi/SAÚDE é Vital)

    Dietas restritivas promovem deficiências nutricionais

    Até quem se livrou (ou vai se livrar) do excesso de peso via cirurgia bariátrica precisa redobrar a atenção. De acordo com o médico Marcio Mancini, da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Regional São Paulo), muitos nutrientes dependem da acidez produzida pelo estômago para serem aproveitados. Só que, na operação, há uma redução no tamanho do órgão — e, com isso, cai a liberação do tal ácido.

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    “Por isso, ainda que o consumo de nutrientes seja apropriado, não há absorção plena”, diz o endocrinologista. Daí a necessidade de contar com um acompanhamento regular após o procedimento — coisa que cerca de 50% dos operados ignoram, segundo cálculos de Mancini.

    Mas não vá pensando que o perigo da desnutrição ronda somente quem vê o ponteiro da balançar decolar. A turminha com peso considerado saudável também está suscetível a encarar a falta de nutrientes — basta seguir comportamentos controversos.

    “Dietas restritivas para perder peso, jejuns prolongados com tempo curto para alimentação, além de substituição de jantar balanceado pelo clássico lanche à base de pão e queijo são exemplos de fatores que promovem deficiências nutricionais”, descreve a nutricionista clínica Gabriela Maia, do Rio de Janeiro.

    Para sua colega Erika Aparecida Silveira, professora de nutrição da Universidade Federal de Goiás (UFG), os cardápios da moda que restringem ingredientes ricos em fibras, vitaminas, minerais, carne e produtos lácteos são os mais comprometedores para a saúde. Só que os adeptos podem não perceber isso logo de cara.

    “Grande parte das deficiências nutricionais se manifestará no médio ou no longo prazo”, alerta a nutricionista Clarissa Hiwatashi Fujiwara, da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica, a Abeso.

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    É claro que, em certos casos, a exclusão de ingredientes se faz necessária por causa de alergias e intolerâncias. Mas, aí, o ideal é receber orientação especializada, garantindo, assim, o aporte nutricional correto e contornando os desfalques.

    A importância do acompanhamento profissional

    Cabe frisar que, ao falarmos de modismos, o vegetarianismo e o veganismo não se enquadram na história — ainda que estejam em franca ascensão. “Em geral, são dietas muito saudáveis, já que há maior ingestão de frutas, verduras, legumes e alimentos integrais”, esclarece Erika.

    “As preocupações dizem respeito ao ferro, à vitamina B12 e às proteínas”, lista a nutricionista. Para ficar coberto nesse sentido, ela recomenda um acompanhamento nutricional pelo menos no início do estabelecimento do cardápio.

    A realidade é que a deficiência de vitaminas e minerais é traiçoeira. Embora possa se manifestar de diversos jeitos (a depender do que está em falta no prato), normalmente as pessoas nem cogitam essa possibilidade.

    Quantas vezes você já culpou o ritmo de trabalho pelo cansaço e pela falta de disposição? Ou achou que cabelos fracos e unhas quebradiças eram consequências do estresse? Esses são só alguns dos sintomas que podem denunciar uma alimentação capenga.

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    Mas o papo pode ficar mais sério. A professora Silvia lembra que a carência nutricional é capaz de abalar a imunidade. “Aí há risco de ficar doente com frequência”, resume.

    Até quadros que parecem ter causa cristalina podem apresentar o déficit de micronutrientes como pano de fundo. O nutricionista Dennys Cintra, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), no interior paulista, cita o colesterol alto.

    “Geralmente, se imagina que há abuso no consumo de gorduras”, aponta. “Mas, às vezes, o problema também está no funcionamento de uma via do organismo ligada à produção do colesterol, onde uma vitamina ou um mineral fariam toda a diferença”, explica.

    Segundo Liliane, da UFS, a monotonia à mesa, com aquele repeteco de alimentos todo dia, é uma grande pista de que o menu não oferta boa variedade de substâncias. “Além disso, é possível realizar exames para identificar a falta de nutrientes”, acrescenta. No consultório, um bate-papo sobre a rotina alimentar já ajuda a fechar o diagnóstico.

    A suplementação não substitui a comida

    Mas não pense que a saída está em se entupir de cápsulas de suplementos por conta própria. Os especialistas avisam que o excesso de micronutrientes pode fazer tão mal quanto a carência. Cintra ilustra com o caso do cálcio: “Três estudos importantes, todos baseados na análise de mais de 10 mil pessoas, indicaram que a suplementação desse mineral fez subir o risco de infarto”.

    O pesquisador diz que, para cada nutriente, há uma lista de encrencas ligadas ao exagero. Daí a importância de verificar a real necessidade dessa estratégia — e só repor a dose certinha.

    O mesmo pé atrás surge em relação aos produtos industrializados fortificados. “Nem sempre os nutrientes estão inseridos em uma matriz adequada”, diz Sandra. Ou seja, não adianta comprar um item cheio de ferro se ele for igualmente lotado de açúcar e gordura.

    A nutricionista Maria Fernanda Elias, da DSM, empresa que fornece nutrientes à indústria, concorda que o enriquecimento não torna um produto automaticamente saudável. “Mas isso também vale para aquele isento de gordura. Tem que ver o que entrou no lugar”, pondera.

    De fato, o tema merece um olhar cauteloso. Clarissa, da Abeso, lembra, por exemplo, que muita gente reduziu o consumo de leite. Nesse contexto, botar mais cálcio e vitamina D em uma porção menor de bebida tem seu valor. “Só não vale achar que a fortificação substitui a comida de verdade”, pontua.

    Uma solução para esse cenário é proposta pelo projeto Biofort, da Embrapa. Por meio de cruzamentos naturais entre espécies, os pesquisadores chegaram a versões mais ricas de arroz, feijão, mandioca, milho, trigo, abóbora e batata-doce — não é cultivo transgênico.

    “Trabalhamos com culturas que são familiares aos brasileiros”, conta o engenheiro agrônomo e líder da iniciativa, José Luiz Viana.

    Mas a população precisa voltar a investir nesses e em outros tipos de fruta, verdura, legume, cereal integral… Um cardápio variado, colorido e mais natural atua em duas frentes: resolve carências e evita excessos.

    Desnutrição - excessos

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