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Flexibilidade é vida: conheça o poder dos exercícios que alongam o corpo

Alongamento e outras práticas devem ganhar espaço na rotina, inclusive para quem deseja comemorar mais aniversários pela frente

Por Lucas Rocha (reportagem e texto) | Laura Luduvig (design) | Letícia Raposo/Estúdio Coral (ilustração) e Kerrick/Getty Images (foto)
Atualizado em 27 set 2024, 09h20 - Publicado em 27 set 2024, 09h13
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Flexibilidade é um conceito diverso, o que significa que temos diversos níveis de elasticidade (Foto: Kerrick/Getty Images/Veja Saúde)
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Desde a infância, a atividade física marca presença na vida do psicanalista e gerontólogo Fernando Aishi, de 36 anos, morador do Rio de Janeiro. Flexibilidade nunca havia sido um grande desafio para ele, mas tampouco era o foco do seu treino. Até que as coisas mudaram há pouco mais de dois anos, quando ele conheceu a ashtanga yoga.

Essa modalidade de ioga consiste em seis séries fixas de posturas, com um método de desenvolvimento progressivo que respeita os limites de cada indivíduo.

“A minha evolução foi da água para o vinho”, diz Fernando. “Observava os alunos fazendo movimentos incríveis, e acreditava que nunca fosse conseguir fazer algo assim. A partir do momento em que entendi que a prática precisa ser feita regularmente e envolve toda uma disciplina, comecei a progredir bastante.”

Postulante a monge zen, o carioca sentiu os resultados da dedicação: fortalecimento muscular, consciência corporal, resistência, melhora do foco e algo que nenhum exercício até então tinha lhe proporcionado, flexibilidade. O que o psicanalista talvez não sonhasse é que uma boa elasticidade corporal não só facilita os movimentos na lida diária como está ligada a um conjunto mais amplo de benefícios à saúde.

Pois é: um estudo brasileiro pioneiro indica que a flexibilidade física está diretamente associada a quanto tempo de vida se tem pela frente. Em resumo, quanto mais você consegue se esticar sem travas, mais velinhas de aniversário poderá assoprar.

A descoberta vem de uma pesquisa liderada pelo médico Claudio Gil Araújo, da Clínica de Medicina do Exercício (Clinimex), no Rio de Janeiro, que também contou com a colaboração de instituições do Reino Unido, da Finlândia, da Austrália e dos Estados Unidos. Para chegar aos achados, foram analisados dados de mais de 3 mil homens e mulheres com idade entre 46 e 65 anos.

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Araújo explica que a flexibilidade é definida pela amplitude máxima de um dado movimento articular com o próprio esforço de um membro, sem auxílio externo. Além disso, o conceito não deve ser entendido como um atributo único e genérico.

“Você pode ser muito flexível no tornozelo, mas não no ombro. Pode ser no tronco, mas não no quadril. Não se trata de uma característica sistêmica, mas que varia entre as articulações e de um movimento para outro”, esclarece o pesquisador.

Para dar conta dessa complexidade, Araújo aplicou nos voluntários do estudo uma metodologia capaz de contemplar a elasticidade humana em toda a sua magnitude. A ferramenta utilizada foi o Flexiteste, um esquema de avaliação que Araújo criou ainda na década de 1980 para analisar 20 movimentos.

As notas do teste, por sua vez, subsidiavam um escore de flexibilidade corporal denominado Flexindex. Ele leva em consideração a combinação de 20 movimentos envolvendo sete articulações, resultando numa faixa de pontuação de 0 a 80 — quanto maior o escore, mais flexível o paciente.

Ao cruzar os dados obtidos junto aos milhares de participantes, Araújo e seu time constataram uma relação inversa entre altas notas no Flexindex e o risco de mortalidade precoce.

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Sim, flexibilidade é vida! Durante os 12 anos de acompanhamento médio do trabalho, 302 pessoas morreram.

Comparando suas avaliações com as dos sobreviventes — e excluindo o peso de fatores como idade, estado de saúde e índice de massa corporal (IMC) —, a equipe observou que homens com pontuação baixa apresentavam um risco quase duas vezes maior de morrer mais cedo em comparação com aqueles com boa flexibilidade. Entre as mulheres, o risco foi mais de quatro vezes maior!

A conclusão da pesquisa, publicada internacionalmente, chama a atenção para uma habilidade física nem sempre trabalhada na rotina de treino — e, com frequência, negligenciada. “Flexibilidade é autonomia e precisa ser priorizada tanto quanto os exercícios aeróbicos”, defende Araújo.

O líder do trabalho reconhece que existem obstáculos no caminho rumo a uma vivência mais maleável. Um deles é sair da zona de conforto, uma vez que os efeitos do alongamento dependem de um esforço que pode ser incômodo a quem andava muito parado. Outro é a suposta falta de tempo. Os benefícios só vêm à tona quando a prática é regular: portanto, devemos separar um espaço na agenda (e no treino) para alongamentos e afins.

O empenho compensa. “A flexibilidade ajuda a melhorar a amplitude de movimento das articulações e dos músculos em geral, reduzindo o risco de lesões, especialmente durante atividades físicas ou movimentos repentinos”, destaca o médico Gustavo Starling Torres, diretor da Sociedade Brasileira de Medicina do Exercício e do Esporte (SBMEE).

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E não para por aí: a elasticidade corporal financia posturas mais corretas e menos dores, principalmente em regiões que são alvo de tensão, como a coluna, o pescoço e os ombros. Se ficamos menos maleáveis com o envelhecimento — fato! —, isso só reforça a necessidade de recrutar ainda mais as atividades que atuam na mobilidade articular, assim como checar quão flexíveis estamos nas consultas periódicas.

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Clique para ampliar (Foto: Kerrick/Getty Images/Veja Saúde)

Longevidade e autonomia

De Minas Gerais, um dos estados com a maior porcentagem de população idosa no Brasil, desponta uma iniciativa que inspira. Há oito anos, o projeto Universidade Amiga da Pessoa Idosa reúne homens e mulheres longevos em torno de atividades que permitem o exercício da criatividade, desafiam os limites da força física e estimulam a socialização.

A iniciativa, idealizada pela gerontóloga Karina do Valle Marques, professora da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), já recebeu ao longo dos anos quase 500 pessoas.

A primeira etapa do programa consiste em uma triagem que avalia as necessidades de cada um. A partir disso, são indicadas diversas aulas e oficinas, incluindo artesanato, pintura, cultivo de plantas em horta, pilates, além de uma boa dose de dinâmicas cognitivas, a chamada “academia do cérebro”.

Em uma fase da vida em que o corpo teima em apresentar algumas limitações, o estímulo ao movimento se faz presente e vai além da sessão de alongamentos.

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“Cada idoso precisa ter um plano de ação específico, considerando também sua flexibilidade”, afirma Karina. Uns partem para a dança, outros para o pilates — e há quem participe de ambos. “O importante é que cada indivíduo se encontre”, ressalta a professora. Aguçar a elasticidade ajuda a preservar a independência funcional, driblando limitações da idade e permitindo a continuidade das tarefas do cotidiano sem grandes entraves.

Professora aposentada, Fátima Moreira Vieira, de 70 anos, conta que sentia falta de sair de casa e de ter uma agenda de compromissos quando chegou ao projeto de Uberlândia, há dois anos. As aulas de dança e ginástica com expressão corporal mudaram sua vida.

“A flexibilidade vai diminuindo com a idade. Então, se você fica parada, as coisas vão ficando mais difíceis”, avalia. “Agora tenho visto melhoras. Os alongamentos ajudam em movimentos que me dão autonomia e conforto. Me sinto bem no final de cada dia”, completa.

Para envelhecer bem, assim como dona Fátima, é importante começar a cuidar do corpo desde cedo. De preferência, na infância, quando ossos e músculos estão em constante crescimento e desenvolvimento. Colocar a turminha para se esticar contribui para estabelecer hábitos saudáveis que irão perdurar a vida toda.

“Crianças que desenvolvem uma boa flexibilidade têm menos chances de apresentar problemas posturais, como escoliose ou hiperlordose, que podem ser agravados por músculos tensos e desequilibrados”, explica Torres. Segundo o diretor da SBMEE, manter uma boa amplitude de movimentos também favorece a coordenação motora, essencial não só para garantir segurança nos esportes como para se sair bem numa série de exigências do dia a dia.

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Clique para ampliar (Foto: Kerrick/Getty Images/Veja Saúde)

Parte do treino

Os exercícios de flexibilidade deveriam constar no rol de afazeres de qualquer um que se aventura na academia, na pista de corrida ou em um esporte amador. Eles fazem diferença! O redator publicitário Emílio Lins de Sá Vieira, de 31 anos, assina embaixo.

“O alongamento auxilia bastante no desempenho do treino, principalmente no sentido de evitar lesões e câimbras”, afirma o mineiro, adepto da musculação há dez anos. Realmente, esse tipo de movimento colabora para aliviar a tensão e a rigidez e diminuir a incidência de dores musculares e articulares.

Embora nas salas de ginástica e estúdios haja sempre um cantinho para esticar o corpo, nem sempre são disponibilizadas orientações sobre quais movimentos devem ser executados ou a duração específica de cada um deles, por exemplo. É por essas e outras que bastante gente pula essa etapa antes ou depois de suar a camisa.

Emílio conta que, apesar de ter recebido instruções de educadores físicos, sentiu necessidade de recorrer à internet em busca de informações e protocolos. “Quando deixo de fazer os exercícios de flexibilidade, costumo ter dores na região da lombar. Então, respeitar essa rotina é algo que me dá prazer ao mesmo tempo que me ajuda a lidar com os incômodos musculares”, relata.

Para tornar o corpo mais flexível, o ideal é fazer treinos específicos de alongamento, assim como são feitas as séries de musculação ou o exercício aeróbico.

“O alongamento pode ser incluído no processo preparatório de atividades, conhecido popularmente como aquecimento”, diz Torres. “Ele visa preparar o sistema muscular, ajudando-o a adaptar-se às exigências que virão em seguida, melhorando a amplitude dos movimentos e o desempenho”, continua o médico do esporte.

Já no pós-treino, a técnica pode fazer parte do método de relaxamento, conhecido também como “resfriamento”. No entanto, é preciso ter uma dose de cuidado, pois a musculatura pode estar fadigada e, por isso, mais suscetível a sofrer microlesões ou até mesmo rompimentos em um músculo estirado. “Nessas horas, devemos privilegiar movimentos mais leves e com menor amplitude”, recomenda Torres.

Mas qual é a receita certa para um bom alongamento? Quanto tempo esticar a perna ou o braço, por exemplo? Eis uma dúvida comum cuja resposta não é tão simples.

O período de extensão pode variar de acordo com o objetivo e o nível de maleabilidade de cada indivíduo e do tipo de atividade física envolvido. Existem pelo menos quatro modalidades, das mais simples às mais avançadas. Então vamos por partes. No alongamento estático, cada postura deve ser mantida por 15 a 60 segundos. Além disso, realizar de duas a quatro repetições para cada grupo muscular pode ajudar a maximizar os benefícios.

Na versão dinâmica, por sua vez, cada movimento deve ser realizado de cinco a dez vezes por aproximadamente 30 segundos. Já o modelo ativo-estático considera manter a pose por dez a 30 segundos, de maneira similar ao primeiro, mas performado com contração muscular ativa, o que também ajuda no fortalecimento.

Por fim, o método mais avançado e de nome complicado é a facilitação neuromuscular proprioceptiva. Geralmente, o ciclo consiste em contrair o músculo por cinco a seis segundos, seguido de um alongamento estático por 15 a 30 segundos.

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Clique para ampliar (Quadro: Letícia Raposo/Estúdio Coral/Veja Saúde)

É importante enfatizar que a prática de alongamento não deve ser desconfortável. “Se sentir dor intensa, é um sinal para aliviar ou ajustar a posição”, ensina Torres. “O alongamento deve ser sentido como uma leve tensão nos músculos. Manter uma respiração lenta e controlada durante o movimento ajuda a relaxar e aumenta sua eficácia”, orienta o médico do esporte.

Para não se machucar, algumas dicas são valiosas: evite focar apenas em áreas específicas do corpo, não prenda a respiração enquanto fica numa posição, fuja de movimentos rápidos e bruscos e jamais force o corpo para além de seus limites naturais.

Aliás, assim que aprender os movimentos, vale a pena levá-los para casa ou o trabalho. Ora, hoje grande parte das profissões depende de posturas um tanto quanto sedentárias, e tanto ficar sentado como em pé por longos períodos (assim como realizar tarefas repetitivas) desemboca em tensão muscular.

Na contramão, o alongamento estimula a circulação, aumentando o fluxo de sangue para a musculatura e minimizando a sensação de fadiga. “Trabalhar em um computador ou em uma estação fixa costuma levar a posturas inadequadas. Fazer pausas para alongar permite aliviar os incômodos e até melhorar a concentração e a produtividade”, argumenta o especialista da SBMEE.

Cansaço, dor, falta de energia, tensão muscular, formigamento e sensação de rigidez são apenas alguns dos sintomas da falta de elasticidade. Ignorar os sinais de alerta do próprio corpo é uma via perigosa que conduz ao surgimento de problemas mais chatos, como câimbras, hérnia de disco, distensão muscular e outros tipos de lesão.

Para além da prevenção desses perrengues pontuais, abraçar os exercícios de flexibilidade agora ganha um objetivo ainda mais nobre: somar pontos a uma vida mais longa — e sem amarras.

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