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Neste mundo de dietas malucas, o que comer?

Bioquímica avalia, na Revista Questão de Ciência, diferentes dietas da moda para emagrecer, sob o ponto de vista da saúde e da eficácia

Por Alicia Kowaltowski, médica, para a Revista Questão de Ciência*
Atualizado em 6 mar 2019, 12h00 - Publicado em 27 fev 2019, 15h16

A cada dia aparece propaganda de um novo tipo de dieta para emagrecer, prometendo dar a qualquer pessoa um corpo escultural, rapidamente, sem dificuldades. Mas estudos científicos claramente demonstram que a população humana está cada vez mais obesa, e que problemas de saúde relacionados à obesidade estão aumentando. Isso sugere que ninguém está seguindo essas dietas miraculosas? Ou talvez elas não sejam tão simples e eficazes quanto prometem. No vasto mundo das dietas para perda de peso e na busca por melhor saúde, quais seriam as melhores recomendações científicas disponíveis?

Para entender efeitos de diferentes dietas na perda de peso, precisamos primeiro entender por que engordamos com tanta facilidade. Frequentemente, jogamos a culpa do engordar na pessoa obesa: porque ela come quantidades erradas, tipos de alimentos incorretos, horários indevidos etc. Mas a verdadeira razão de termos tanta obesidade no mundo, hoje, é a evolução.

Descendemos de humanos que viveram durante milhares de anos em situação de escassez, pelo menos periódica, de comida. Desse modo, somos evolutivamente programados para guardar qualquer excesso de comida ingerida como gordura, para usar essa energia armazenada em tempos de necessidade. Também evoluímos para gostar muito de comida, especialmente aquela que é rica em calorias. Isso garantia nossa sobrevivência.

O problema é que, hoje, temos acesso facilitado à comida, e, com nossa carga evolutiva de guardar gorduras e gostar de comer, fica bem fácil pra maioria das pessoas engordar.

Mas colocar a culpa da obesidade na evolução, justificadamente, não elimina o fato de que ser obeso relaciona-se a vários problemas de saúde, incluindo diabetes, infarto, cânceres e doença de Alzheimer, dentre outros. Portanto, para a maioria da população que deseja envelhecer com saúde, vale a pena ficar de olho na balança e evitar a obesidade. A pergunta que fica é: como fazer isso, com sucesso e com saúde.

O primeiro ponto a ser avaliado em relação à obesidade e dietas é se, de fato, a pessoa que deseja perder peso precisa disso para ganhar saúde. Criaram-se padrões socialmente associados à saúde ou à estética corporal que não correspondem necessariamente aos associados pela ciência a maior sobrevida ou menor incidência de doenças.

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Como exemplo, muitas modelos fotográficas têm parâmetros medicamente classificados como abaixo do recomendado, com índice de massa corpórea (IMC, que é o peso dividido pela altura ao quadrado) inferior a 18,5 Kg/m2. E essa faixa é associada a riscos à saúde bem maiores do que pesos na faixa normal de IMC (18,5 a 25 Kg/m2).

Isso significa que corpos reconhecidos como ideais na nossa cultura atual não o são em termos de saúde. Embora haja críticas ao uso do IMC, sabe-se que, até dentro da faixa de normalidade desse índice, existe maior risco de morte e doença entre as pessoas com menor peso relativo (IMC de 18,5 a 23,5 kg/m2) do que aquelas no limite superior da faixa normal (23,5 a 25 kg/m2).

Portanto, tem muita gente com peso normal que gostaria de perder uma pequena “barriguinha” ou gordura localizada por motivos estéticos, mas que não terá nenhum ganho de saúde associado, e talvez até sofra prejuízos.

É o carboidrato?

Uma vez estabelecido que a pessoa tem sobrepeso e que ganharia de saúde ao emagrecer, começa a difícil escolha de qual tipo de dieta seguir. Aqui entra um segundo conceito que muitas vezes escapa à percepção da maioria das pessoas: o de que nem toda perda de peso é um ganho de saúde.

Para perder peso e ganhar saúde, idealmente deve-se eliminar parte (não tudo!) das gorduras acumuladas, mas não perder massa muscular. Isso porque, enquanto a queima de gorduras é, na maioria dos trabalhos científicos, associada a menor incidência de doenças, a perda de massa muscular é, ao contrário, associada a problemas de saúde.

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Existe um grupo grande de dietas para redução de peso que se baseia na restrição de carboidratos. Isso inclui linhas como “low carb”, “paleo” e “cetogênicas”. Todas preconizam diminuir a ingestão específica de carboidratos. Todas também levam mesmo à perda rápida de peso, pois inibem a secreção de insulina, que é o hormônio que leva ao depósito de gorduras. Mas será que isso é bom?

Recentemente, uma meta-análise (um tipo de estudo científico que analisa os resultados de muitas pesquisas juntas e, portanto, mais confiável que trabalhos individuais) examinou os efeitos de diferentes quantidades de carboidratos na dieta sobre a mortalidade humana, e demonstrou que tanto muito carboidrato como muito pouco carboidrato aumentam a mortalidade.

O ponto ideal de ingestão de carboidratos nesse estudo ficou entre 50 e 55% das calorias totais ingeridas. A conclusão, portanto, é que nem a falta nem o excesso de carboidratos (excesso que, de fato, engorda) são bons.

Os motivos pelos quais a baixa ingestão de carboidratos leva a aumento de mortalidade ainda não foram investigados a fundo, mas é possível que estejam ligados à perda de massa muscular, pois a insulina é importante para a construção de músculos. E note que não adianta fazer dieta sem carboidratos e se encher de proteínas para “compensar” a perda de massa muscular.

E o glúten, presente em algumas fontes comuns de carboidratos, como o trigo? A não ser que você tenha doença celíaca, que é uma alergia ao glúten, pode consumir à vontade. De fato, há evidências que evitar a ingestão de glúten, na ausência dessa doença, não é saudável, embora, novamente, tenda a causar emagrecimento, por causa da restrição de carboidratos.

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É a gordura?

Fica estabelecido, então, que dietas sem carboidratos não são o ideal. E dietas sem gorduras? É verdade que a gordura é bastante calórica. Uma refeição composta só de gorduras terá o dobro de calorias do que um prato com o mesmo peso, mas composto principalmente por proteínas ou carboidratos. É por isso que comer gorduras, de fato, engorda.

Mas está cada vez mais claro que gorduras não são vilões das dietas. São, de fato, necessárias: algumas vitaminas só podem ser encontradas nelas. Além disso, gordura tem várias funções benéficas. O excesso de gorduras não é bom porque é muito calórico, mas a inclusão de quantidades moderadas na dieta é saudável.

Talvez a proteína?

E proteínas? Será que devemos comer muita proteína, ou limitar nossas proteínas? Já vimos que dietas com excesso de proteínas levam à formação de gordura. Mas dietas veganas, que não incluem produtos de animais (ou, pelo menos, de animais visíveis, porque todo alimento contém animais microscópicos, por mais nojento que isso pareça!) são consideradas saudáveis, certo? Não é tão simples.

Limitar a proteína animal tem efeitos cientificamente interessantes, em termos ambientais, mas não estamos focando no meio-ambiente aqui. Em termos de saúde, estudos já mostraram que vegetarianos ou veganos norte-americanos têm alguns aspectos de saúde melhores que onívoros. O problema é que a comparação não é muito justa, porque a dieta típica do cidadão dos Estados Unidos é muito, muito ruim.

Estudos que levam características sociais e educacionais em conta mostram que não há diferenças significativas entre a saúde de vegetarianos e onívoros, podendo haver um leve prejuízo para a saúde na comunidade vegana. Novamente, a quantidade ideal de proteínas não é nem demais, nem de menos, mas moderação.

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Detox, então?

Finalmente, existe um grupo de dietas que propõe realizar “detoxificações”, que geralmente consistem em jejuns associados a algum tipo de suplemento. É óbvio que jejuar faz perder peso (porque você não está comendo), mas, novamente, perder peso não é sinal automático de saúde.

Jejuar também não faz nada em termos de eliminar toxinas do seu corpo – seu fígado e seus rins fazem isso o tempo todo, em jejum ou não. Pelo contrário, o jejum pode aumentar a quantidade circulante de acetona, que é uma toxina.

Por esse mesmo motivo, outro tipo de dieta que tem ganhado atenção recente na mídia, o jejum intermitente, não parece ser a melhor maneira de se evitar os problemas de saúde associados à obesidade.

De fato, a Associação Brasileira de Nutrição não recomenda seu uso, entre outras razões pelas evidências, em animais de laboratório, de que pode causar diabetes tipo 2, apesar da perda de peso.

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Equilíbrio!

Falamos até agora de que dietas não seguir (basicamente qualquer dieta miraculosa da moda). Mas então, o que devemos comer? A resposta é que, cientificamente, há evidências claras que dietas moderadas em carboidratos, proteínas e lipídeos, e, acima de tudo, variadas, são as ideais em termos de saúde a longo prazo.

Isso inclui evitar produtos industrializados, não porque tudo é artificial é ruim, mas porque eles tipicamente contêm altos teores de açúcar e gorduras, incluindo aqueles com rótulos diet ou light. Aliás, “diet” significa que não tem açúcar, independentemente do teor calórico, e “light” significa uma redução nutricional de 30% ou mais em relação ao produto original, independente de qual o tipo de redução, ou do valor calórico do original.

Valorize dietas com frutas e vegetais diferentes e coloridos, grãos diversos, proteínas de fontes diferentes e gorduras, principalmente óleos. Tudo em quantidade moderada.

Para evitar obesidade e buscar saúde, vale também incluir exercício físico no seu dia a dia. Novamente, não tem que ser nada radical: pode até ser se movimentar mais em tarefas do cotidianas, como subir escadas ou brincar com crianças no jardim.

Infelizmente, a ciência comprova que as dietas da moda que muito prometem não são aliadas da saúde. Muitas acabam levando à perda de peso sem ganho de saúde ou à perda de peso temporária, insustentável, num indesejável efeito sanfona.

Infelizmente, não existe ainda dieta ou pílula miraculosa que traga um corpo esteticamente perfeito e saudável num estalar de dedos. A melhor dieta para a sua saúde é a que envolve continuidade, variedade e moderação.

*Autora do texto, Alicia Kowaltowski é professora de Bioquímica do Instituto de Química da Universidade de São Paulo.

Este conteúdo foi publicado originalmente na Revista Questão de Ciência.

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