Por que ler faz bem à saúde?
A leitura traz vantagens únicas para o bem-estar cognitivo, mental e social. A ciência subscreve e prescreve: é hora de se lançar às páginas
Antonio Fagundes se considera um sujeito de sorte por ter tido mononucleose, infecção comum na infância, aos 6 anos de idade. O médico prescreveu alimentação especial e repouso absoluto para combater o quadro e uma anemia profunda.
Dona Lídia, sua mãe, começou, então, a comprar revistas em quadrinhos para o filho acamado. Durante seis meses, o pequeno não fez outra coisa senão ler gibi. Passado algum tempo, trocou as aventuras de Edgar Rice Burroughs, o “pai” do Tarzan, pelas de Júlio Verne, autor de Viagem ao Centro da Terra, Vinte Mil Léguas Submarinas (clique para comprar), entre outras obras-primas. Não parou mais. Hoje, aos 74 anos, o ator calcula ler três livros por semana.
“Não saio de casa sem um debaixo do braço ou dentro da bolsa. Leio em qualquer lugar e a qualquer hora: a caminho do aeroporto, no consultório médico, na hora do almoço… Gosto de ler pelo menos três horas por dia”, conta a VEJA SAÚDE.
Certa vez, em um momento na gravação da novela Bom Sucesso, de 2019, seu personagem, dono de uma editora, desmaiava após bater a cabeça. “Isso vai durar uma meia hora”, pensou Fagundes, esperando o ensaio terminar. “O que eu faço todo esse tempo deitado?” Não teve dúvida: pegou um livro, enquanto os colegas continuavam a cena.
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A novela e o personagem ficaram tão em evidência que surgiu o podcast Clube do Livro por Antonio Fagundes e o guia Tem um Livro Aqui Que Você Vai Gostar (Sextante). “Ler faz um bem danado à saúde. Tanto que não consigo ficar um dia sem”, sentencia o leitor voraz. “O maior aliado da leitura é o interesse. O pior inimigo, o celular”, afirma, categórico.
Um dos mais de 150 autores citados por Fagundes em seu livro é a neurocientista americana Maryanne Wolf, autora de O Cérebro no Mundo Digital – Os Desafios da Leitura na Nossa Era (Contexto) — “uma obra extraordinária”, segundo o ator. Logo no início, a professora da Universidade da Califórnia, nos EUA, adverte: os seres humanos não nasceram para ler.
Não é algo que, a exemplo da fala, estamos configurados para fazer. É uma habilidade que precisa ser construída. “Começa na infância, como um ritual noturno. Os pais precisam ler para os filhos e interagir com eles. Essa interação estimula o amor pela leitura”, explica.
Maryanne esmiúça também o conceito de “leitura profunda”. Tão importante quanto o que lemos ou quanto lemos é, esclarece ela, como lemos. Não basta folhear o livro, rápida e superficialmente. É preciso se debruçar, lenta e profundamente, e compreender o que os olhos captam.
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Leitura na infância
A causa da neurocientista encontra eco no recém-lançado Faça-Os Ler (Vestígio), de outro pesquisador, o francês Michel Desmurget. Além de contar histórias para os filhos e dialogar com eles, o autor recomenda levá-los para passear em bibliotecas, dar livros de presente e enfatizar a importância da leitura em sua vida.
Como o tempo é um recurso finito, também sugere criar horários para a leitura e restringir o tempo de telas — um “antídoto”, de acordo com o neurocientista, contra a formação de “cretinos digitais”.
Na infância ou adolescência, Desmurget desencoraja tratar a leitura como algo que mereça recompensas depois: “É contraproducente dizer coisas como ‘Se você ler agora, poderá jogar videogame mais tarde’, porque transformamos a atividade em castigo e as telas em prêmio”.
Sim, ler é um trabalho árduo cujo prazer nem sempre vem de imediato. Mas vale a pena perseverar — não importa a idade. “O objetivo não é impor a leitura aos filhos. É muito mais limitar o tempo no celular ou televisão”, diz o autor.
O expert francês, preocupado com a sobrecarga de telas desde a primeira infância, enfatiza os incontáveis impactos positivos da leitura: aumenta a inteligência, estimula a criatividade, promove a empatia, pois conseguimos nos enxergar melhor na pele dos personagens dos livros e de carne e osso. Quanto mais cedo se toma gosto pela coisa, melhor.
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Mais cedo mesmo! Tanto é que a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) orienta que os pais não precisam nem esperar o bebê nascer para despertar neles o prazer das histórias.
“A partir da 25ª semana de gestação, o bebê já consegue ouvir a voz da mãe”, observa o presidente da entidade, Clóvis Constantino. “Caso os pais se sintam confortáveis, podem contar histórias para a criança ainda na barriga.”
Quanto ao tempo de tela, o maior ladrão de leitura, na visão de Desmurget e outros estudiosos do tema, o pediatra indica que, até os 2 anos, as crianças não deveriam ser expostas a smartphone, tablet ou TV. Dos 2 aos 5, podem ficar no máximo uma hora nesses dispositivos. Dos 6 aos 10, duas horas. Dos 11 aos 18, o ideal é não passar de três horas.
Desafiador no mundo de hoje, não? Mas há motivo. “O uso excessivo pode trazer prejuízos como atraso no desenvolvimento, problemas na visão e dificuldades para dormir”, alerta Constantino.
Por falar nisso, a Associação Brasileira do Sono (ABS) não só pede para evitar celulares e afins antes de ir para a cama como priorizar livros físicos a digitais nesse momento. “A exposição à luz azul dos aparelhos interfere na produção do hormônio do sono”, justifica a neurologista Márcia Assis, vice-presidente da ABS.
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Benefícios à saúde
Em Faça-Os Ler, Desmurget pondera que “nenhum alpinista começa pelo Everest”. Em vez de se aventurar a ler por pelo menos três horas por dia, como Fagundes, que tal começar por apenas 30 minutos? Parece pouco, mas é o suficiente para quem quer colher seus efeitos e viver mais.
É o que mostra um projeto batizado de Um Capítulo por Dia, realizado pela Universidade de Yale, nos EUA. Os cientistas estudaram o hábito de leitura de 3,6 mil voluntários cinquentões ao longo de 12 anos. Eles dividiram os participantes em três subgrupos: leitores, não leitores e superleitores.
O primeiro lia por até três horas e meia por semana, o segundo não tinha o hábito de ler e o terceiro lia mais de três horas e meia semanais. Resultado: os leitores tinham 17% menos chance de morrer antes de chegar aos 62 anos e os superleitores, 23%. “Trinta minutos por dia é um investimento modesto para um benefício enorme”, afirma o pesquisador francês.
Dois neurocientistas brasileiros também exaltam as vantagens únicas da leitura. São eles: Sidarta Ribeiro, autor de O Oráculo da Noite (Companhia das Letras) e As Flores do Bem (Fósforo), e Suzana Herculano-Houzel, que publicou A Vantagem Humana: Como Nosso Cérebro Se Tornou Superpoderoso (Companhia das Letras).
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Para Ribeiro, se jogar nos livros e afins reduz o estresse, exercita a cognição e contribui para a prevenção de déficits mais comuns com a idade. Em pesquisas que compararam o estilo de vida de gêmeos monozigóticos, cita o professor, observou-se que o hábito de leitura retardava a chegada do Alzheimer em até cinco anos. “Para o cérebro, ler um livro equivale a ir a uma academia de ginástica”, compara.
Já Suzana explica que, ao ler, nosso cérebro ativa redes de neurônios que, entre outras funções, transportam o leitor para lugares nunca antes visitados — a Hogwarts de Harry Potter ou a Terra Média de O Senhor dos Anéis, por exemplo. “A leitura expande nossos horizontes, mentes e vidas”, sintetiza.
Estantes nos hospitais
Ler faz tão bem que clínicas e hospitais já montam até bibliotecas. É o caso do Instituto Fernandes Figueira (IFF), no Rio de Janeiro, e do Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba, ambos voltados para o atendimento de crianças e adolescentes.
“Temos um acervo de 8,6 mil livros”, orgulha-se Magdalena Oliveira, coordenadora do Núcleo de Apoio a Projetos Educacionais e Culturais do IFF, ligado à Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). “Em geral, as mães gostam de religião e os filhos, de dinossauros”, relata.
No Pequeno Príncipe, uma biblioteca móvel circula pelas enfermarias, distribuindo as atrações — a mais disputada é A Culpa É das Estrelas, do americano John Green. Quem pode está liberado para ir até a sala que reúne os volumes.
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“O hábito da leitura não reduz o tempo de internação, mas cria um ambiente favorável à recuperação”, diz o neurologista pediátrico do hospital paranaense Anderson Nitsche. Magdalena assina embaixo: “Isso diminui o impacto do adoecimento na vida do paciente e da família”.
Ainda nos corredores do hospital curitibano, uma das autoras mais requisitadas é Ruth Rocha. Aos 92 anos, ela é uma das mais importantes escritoras de livros infantis do Brasil. Ao longo de seus 50 anos de carreira, já publicou mais de 180 títulos — o mais famoso deles, Marcelo, Marmelo, Martelo —, vendeu 40 milhões de exemplares, foi traduzida para 25 idiomas e ganhou oito vezes o Prêmio Jabuti.
Os livros, sublinha a autora, precisa fazer parte do cotidiano da criança, como se fossem brinquedos. “A leitura deve ser sempre um prazer, nunca uma obrigação. Se a criança não gostou de um livro, não a obrigue a ler. Passe adiante. Os pais precisam ensinar aos filhos que ler é divertido”, ressalta.
Histórias que mudam vidas
Para as unidades de saúde que (ainda) não dispõem de biblioteca, uma boa notícia: há contadores de histórias que vão até os hospitais. Roseli Bassi, fundadora do Instituto História Viva, é uma delas. Até hoje, não se esquece do dia em que foi contratada para treinar um grupo de voluntários em 2013.
Uma das etapas consistia em supervisionar a visita dos alunos a um hospital em Ilhéus (BA). Chegando lá, soube de um jovem chamado José que tinha ficado paralítico e, desgostoso da vida, queria morrer — o rapaz se recusava até a comer. Roseli foi até o leito dele e contou a fábula O Homem sem Sorte, de autor desconhecido.
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Terminada a história, voltou para sua casa, em Curitiba. Quatro dias depois, recebeu um telefonema do diretor do hospital: José tinha voltado a se alimentar e estava animado com a fisioterapia. “Histórias têm poder terapêutico. Um dos benefícios é, a partir do exemplo dos heróis, encorajar a pessoa a enfrentar as adversidades da vida”, afirma a professora.
Quem vivenciou situação parecida foi Glória de Fátima Lima dos Santos, responsável pelo projeto Ler Faz Bem à Saúde, vinculado à Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC), em Ilhéus. Em 2010, começou a contar histórias em dois centros de hemodiálise na Bahia.
Na hora de selecionar um livro, optou por As Mil e Uma Noites, antologia de fábulas árabes que inclui, entre tantas, Aladim e a Lâmpada Maravilhosa e As Aventuras de Simbad, o Marujo. “Como Sherazade, aqueles pacientes também estavam ali lutando pela vida”, compara Glória.
Não por acaso, todos se identificaram com o drama da personagem. Para não ser morta pelo sultão, ela interrompia o causo sempre na melhor parte e prometia continuá-lo no dia seguinte. “Os pacientes esperavam ansiosos para ouvir a sequência e reclamavam quando a equipe não comparecia no dia previsto”, recorda.
Certa ocasião, Glória ouviu da mulher de um paciente: “Sei exatamente quando vocês estiveram no hospital. Meu marido chega em casa contando histórias, e não falando de doenças”.
O fato, que tem até um lado mágico, é que um livro — lido ou contado — é muito mais do que uma coleção de folhas de papel, reunidas por meio de costura e recobertas por uma capa resistente, ou, mais recentemente, palavras constituídas de pixels numa tela.
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Páginas terapêuticas
“É o único remédio sem efeitos colaterais indesejáveis”, define Clarice Fortkamp Caldin, a mais famosa “terapeuta de livros” do país. Doutora em literatura pela Universidade Federal de Santa Catarina, (UFSC), ela explica que a chamada biblioterapia pode ser dividida em solitária e solidária.
O primeiro tipo é quando o próprio leitor seleciona um livro por prazer, tristeza ou solidão. “Ao ler, nós abandonamos o mundo problemático em que vivemos e podemos entrar em outro onde tudo é possível. A biblioterapia liberta, alegra e consola”, resume.
O segundo é quando o biblioterapeuta seleciona um texto, apresenta ao paciente ou ao grupo e, depois da leitura, estimula a troca de ideias. “Um dos objetivos da biblioterapia é a catarse. Queremos trazer à tona segredos que incomodam para expulsá-los de nossa mente”, diz Clarice.
A psicóloga carioca Cristiana Seixas tem três livros publicados sobre biblioterapia e até palestra no TEDx, Que História É Essa?.
Quando o tema da consulta é luto, por exemplo, costuma indicar poemas, como Ausência, de Carlos Drummond de Andrade, e Aprendizagem, de Ferreira Gullar, ou obras infantojuvenis, como O Que Faço com Esse Buraco?, de Marilu Rodrigues, e A Árvore das Lembranças, de Britta Teckentrup.
Outra indicação é A Ridícula Ideia de Nunca Mais Te Ver, da espanhola Rosa Montero. “A gente não se recupera: se reinventa” é uma de suas frases favoritas do livro.
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Só se deve tomar cuidado com os títulos prescritos. Certa vez, uma paciente contou que estava sonhando com casas. Foi a deixa para Cris emprestar Se Eu Fosse uma Casa, de Carol Fernandes. Conclusão: a mulher nunca mais voltou.
“Livros são espelhos de questões que, por vezes, não desejamos ou ainda não conseguimos olhar”, nota a psicóloga. Mas pode ser a partir desse contato, um tanto incômodo, que dilemas comecem a ser resolvidos.
Prescrição: ler e escrever
O poder terapêutico das palavras não se restringe a quem lê, conta ou ouve histórias. Também se aplica a quem escreve. Foi o que aconteceu com o jornalista e escritor Mauro Ventura, um dos autores de Diário de uma Angústia – A Força da Escrita na Superação da Doença (Máquina de Livros).
Ele tinha 31 anos quando sofreu um AVC hemorrágico. Do leito de um hospital, transformou sua internação em diário. “Como jornalista, tenho escrito desde 1985. Mas foi somente em 1995 que a escrita se tornou vital para mim”, revela.
Ventura não foi o primeiro a embarcar nessa escritaterapia. A jornalista portuguesa Isabel Nery também publicou um livro, Chorei de Véspera (Esfera dos Livros), sobre o derrame cerebral que sofreu.
“A exemplo dela, eu também não tinha pretensões literárias. Escrever me permitia a ordenação do mundo fragmentado em que se transformara minha mente. Eu estava perdido e desorientado. Foi a maneira que encontrei para domesticar o caos, juntar os cacos e reparar o curto-circuito”, conta Ventura.
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Só que não tem jeito: escrevendo ou lendo, os efeitos proveitosos que reflexões e histórias propiciam só vêm à tona com a prática e a regularidade. E aqui chegamos a um ponto nevrálgico: o brasileiro precisa ler mais.
A quinta edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, do Instituto Pró-Livro (IPL), revela que, em 2019, 52% dos brasileiros declararam ter lido, inteiro ou em parte, pelo menos um livro nos últimos três meses. É um índice 4% menor do que o registrado em 2015.
Em números absolutos, significa que o país perdeu 4,6 milhões de leitores. Mas por que será que tanta gente não anda lendo ou simplesmente parou de ler?
No levantamento do IPL, segundo 47% dos entrevistados, o principal motivo para ficar longe dos livros é a falta de tempo. Mas há aqueles que reclamam da escassez de bibliotecas ou do preço das obras. Outro dado preocupante: 42% admitiram ter dificuldade para compreender o que leem.
São os chamados “analfabetos funcionais”. “E apenas 24% gostam de ler em seu tempo livre. A maioria prefere assistir TV (67%), navegar pela internet (66%) ou escutar música (60%)”, destaca Zoara Failla, coordenadora do IPL.
Já os não leitores, ou seja, aqueles que, nos últimos três meses, não leram um livrinho sequer, representam 48% da população. Algo em torno de 93 milhões (!) de um total de 193 milhões de brasileiros.
Aos que alegam falta de tempo, o audiolivro tem despontado como uma alternativa cada vez mais popular. “É o formato do enquanto…”, brinca Adriana Alcântara, diretora da Audible no Brasil. “Enquanto você ouve o livro, prepara o jantar, arruma a casa ou pratica exercícios.”
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No país desde outubro de 2023, a plataforma oferece 600 mil títulos, 4 mil deles em português. Só Antonio Fagundes narra dois: Sapiens – Uma Breve História da Humanidade, de Yuval Noah Harari, e Se um Viajante numa Noite de Inverno, de Ítalo Calvino.
Atualmente, a autobiografia de Britney Spears, o primeiro livro da saga de Harry Potter e o best-seller brasileiro Torto Arado, de Itamar Vieira Júnior, disputam o pódio dos mais vendidos e ouvidos.
Eles substituem os livros físicos? Difícil cravar. Amparado em evidências científicas, Desmurget argumenta que nem e-books nem audiobooks são páreo para o bom e velho livro físico em termos de recrutamento cerebral.
“Numerosos estudos que comparam o grau de compreensão e memorização de um conteúdo em diferentes plataformas revelam que, quando a mensagem é simples, não há diferença entre elas. Mas, quanto mais complexa ela é, maior a superioridade do papel”, diz o cientista.
Outra opção de incentivo à regularidade nas leituras é fazer parte de um clube do livro. O mais famoso deles, o Círculo do Livro, foi criado em 1973, chegou a ter 500 mil membros e chegou ao fim em 1993. Atualmente, há vários modelos de assinaturas. Um deles é a TAG – Experiências Literárias.
Há dez anos no mercado, conta com 37 mil associados. “Muitos deles entraram no clube porque queriam retomar o hábito da leitura”, conta Rafaela Pechansky, editora da TAG. Para quem não pode assinar, escolas, bibliotecas e projetos sociais mantêm circuitos de livros itinerantes, às vezes com direito até a rodas de conversa sobre as obras lidas.
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Vida longa ao leitor
E o que seria indispensável para estabelecer uma rotina entre livros? VEJA SAÚDE conversou com três dos mais bem-sucedidos profissionais do ramo.
Ao receber o prêmio de Personalidade Literária pela Câmara Brasileira do Livro (CBL) em 2023, o escritor Pedro Bandeira, autor de clássicos infantojuvenis como A Droga da Obediência (Moderna), lamentou os últimos resultados do Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), que verificou uma redução na capacidade de leitura dos nossos estudantes.
“No Brasil, a literatura infantil é mais importante do que a adulta porque quem forma os futuros leitores somos nós que escrevemos para crianças”, declarou Bandeira. O autor bate na tecla do “quanto mais cedo, melhor” e reforça a necessidade de levar em conta o contexto ao selecionar e estimular as leituras.
“São várias as fases da criança. Há aquela em que ela escolhe o livro pela ilustração e outra em que dá preferência a bichos falantes. Já adolescentes gostam quando o protagonista tem a idade deles. Os pais podem orientar os filhos, mas devem deixá-los livres para escolher o que quiserem”, afirma.
Quem também entende do assunto é Jiro Takahashi, editor de duas das mais famosas séries de livros infantojuvenis do país: Vaga-Lume — inaugurada em 1973 com A Ilha Perdida, de Maria José Dupret, e repleta de histórias de aventuras — e Para Gostar de Ler, cujos cinco primeiros volumes, lançados entre 1976 e 1981, traziam crônicas de mestres da literatura nacional, como Carlos Drummond de Andrade, Rubem Braga, Paulo Mendes Campos e Fernando Sabino.
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Por ocasião do lançamento da Vaga-Lume, muitos professores reclamaram que seus alunos gostavam mais de gibis do que de livros. O que o editor fez? Ao criar o suplemento de trabalho que encerrava as obras, propôs atividades em que o leitor tinha que preencher os “balões” das ilustrações com trechos dos diálogos.
“Muitos educadores elegem inimigos dos livros e declaram guerra contra eles. Na década de 1970, eram os quadrinhos. Hoje, são os celulares, os tablets e os videogames. Em vez de ‘ou eles ou nós’, prefiro acreditar em ‘eles e nós’, por que não?”, argumenta Takahashi.
Bateu a vontade de ler ou reler títulos como O Mistério do Cinco Estrelas, de Marcos Rey, ou O Escaravelho do Diabo, de Lúcia Machado de Almeida? Saiba que 69 livros da Vaga-Lume e 38 da Para Gostar de Ler foram relançados pela editora Ática.
“Se não sabe se um livro é bom ou por onde começar, pergunte a quem já leu. E há uma infinidade de sites, blogs e podcasts com indicações”, dá outra dica Laura Vecchioli do Prado, coordenadora editorial da Somos Educação. E a escritora Carla Madeira, a figura que mais vendeu livros de ficção no Brasil em 2023, o que será que pensa do assunto?
Aos 60 anos, a autora de Tudo É Rio (Record) superou a marca de 155 mil exemplares comercializados. Não é pouco. Segundo dados do Pró-Livro, o brasileiro lê, em média, apenas cinco livros por ano — nem todos na íntegra. Só os franceses leem quatro vezes mais.
Números assim têm tudo a ver com as más avaliações dos estudantes no Pisa… E podem inclusive estar interferindo no estado mental dos mais jovens ou mesmo dos mais maduros. Vale a pena rever as prioridades no cotidiano — e desde pequeno.
“Não durmo sem ler”, faz questão de contar Carla Madeira. “Se estou cansada, leio uma página. Se estou muito cansada, um parágrafo. Mas, se estou descansada e não tenho que acordar cedo no dia seguinte, sou capaz de ler um livro inteiro. O tempo que dedico à leitura é sagrado”, diz a romancista. Sagrado e saudável!