O diabetes é uma doença cada vez mais comum na população, e com consequências sérias quando não controlado direito. Mas os avanços da medicina têm trazido boas notícias: estão surgindo cada vez mais novos aprimoramentos que facilitam o tratamento e a monitorização da glicemia alta. Listamos, com o apoio de especialistas, os dez principais:
1. Picada semanal contra a doença
Nos últimos anos, uma classe de medicamentos dominou boa parte do noticiário e dos congressos médicos focados em diabetes: os análogos de GLP-1. Ao simular a ação de um hormônio naturalmente produzido pelo corpo, o tal GLP-1, esse remédio injetável controla de uma forma mais inteligente o açúcar no sangue de quem tem diabetes tipo 2.
As primeiras versões do fármaco têm de ser aplicadas diariamente. Daí a sacada da indústria ao bolar uma opção de uso semanal, a semaglutida.
Segundo Gabriel Fagundes, gerente médico da Novo Nordisk (companhia que criou a medicação), ela mostrou melhores indicadores de redução e controle da glicose, além de instigar uma significativa perda de peso, na comparação com outros tratamentos.
Outro ponto positivo é a melhora na adesão às picadas. Aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), já está disponível nas farmácias.
2. A injeção já virou comprimido
Pensando em facilitar a vida do paciente, especialmente daquele que se incomoda com as picadas, a Novo Nordisk já apresentou nos Estados Unidos a semaglutida de uso oral. A ideia é dispensar a injeção, um dos principais motivos de resistência ao tratamento.
“É muito mais fácil tomar uma medicação oral do que uma injetável. A principal diferença, nesse caso, é que a dosagem em miligramas é maior. Para uma melhor absorção, é preciso usar uma quantidade superior”, explica a endocrinologista Ana Cristina Faria, professora da Pontifícia Universidade Católica do Paraná.
Pelo fato de ser ingerida, algumas pessoas relatam mais desconforto gastrointestinal. “Mas muitos pacientes vão ter esse efeito colateral, seja com a apresentação injetável, seja com a via oral”, esclarece Ana Cristina. A previsão é que o comprimido estreie por aqui em 2020.
3. Enfim, uma insulina inalável
Disponível em terra americana desde 2014, a insulina em pó inalável foi aprovada neste ano no Brasil. De certo modo, é uma alternativa especialmente bem-vinda à turma com diabetes tipo 1 ou 2 que quer se ver livre (pelo menos em parte) das picadas.
A novidade, das farmacêuticas Biomm e MannKind, vem em uma bombinha semelhante às utilizadas no tratamento da asma. O uso deve ser feito imediatamente antes das refeições por causa da velocidade de processamento da insulina.
“Ela é muito rápida. Em dez a 12 minutos já está surtindo efeito, baixando a glicemia. Por outro lado, em até duas horas a ação terminou”, conta o endocrinologista Márcio Krakauer, da Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD). Por essas e outras, a versão inalável não substitui toda e qualquer insulina injetável, como as de longa duração.
Existem precauções para quem pretende recorrer a ela. O sujeito não pode ser fumante nem ter problemas respiratórios crônicos, o que atrapalha sua absorção nos pulmões — exames podem ser solicitados para saber se está tudo bem nesse sentido.
“Uma desvantagem é que esse tipo de insulina vem em doses pré-fixadas, ao passo que as demais opções com essa finalidade possuem doses que o médico pode detalhar melhor. Isso é algo a que teremos de nos adaptar”, observa Ana Cristina.
4. Insulina ultrarrápida também para crianças
A Anvisa liberou há pouco uma nova insulina ultrarrápida para crianças e adolescentes com diabetes. Ela melhora a vida dos mais novos (e dos pais) que hoje precisam arquitetar cada refeição e depois calcular a dose exata do hormônio.
“Nas situações em que o consumo é menor que o planejado, pode ocorrer hipoglicemia”, alerta Fagundes, da Novo Nordisk, que fabrica a versão aprovada para o público infantil.
A medicação ultrarrápida, indicada a partir de 1 ano de idade, pode ser aplicada no início da refeição ou após 20 minutos, o que aumenta a segurança caso se coma mais ou menos que o esperado.
5. Menos incômodo na hora de aplicar a insulina
É verdade que as agulhas de insulina estão cada vez mais finas. Mas, para muita gente com diabetes e que não tolera injeções, nem isso ajuda. Ainda mais porque, com frequência, é preciso utilizá-las várias vezes ao dia. A ideia do i-Port, recém-chegado ao Brasil, é contornar o desconforto.
Implantado na superfície da pele, esse pequeno dispositivo conta com um cateter que fica inserido no tecido subcutâneo. Em vez de furar a pele em cada aplicação, o paciente simplesmente injeta a insulina ali.
Concebido pela Medtronic, o aparato não atrapalha o banho ou a prática esportiva (inclusive na água). Ele só precisa ser trocado a cada três dias, permitindo até 75 aplicações durante esse período.
“Nesses três dias, a pessoa pode usar dezenas de doses em um mesmo local, e a agulha nunca atinge a pele. Isso dá um conforto maior e facilita sobretudo em casos de crianças e de pessoas que têm medo de agulha”, avalia Krakauer.
6. O app que ajuda a monitorar a glicose
Não é só a aplicação de insulina que exige furinhos constantes na pele. O próprio controle do açúcar no sangue, tão defendido pelos médicos, costuma pedir uma picada no dedo para coletar uma gota de sangue e checar a situação.
Ou melhor, costumava pedir, caso a pessoa tenha adotado o FreeStyle Libre, tecnologia da Abbott que, por meio de um sensor colocado no braço, permite verificar a glicose em tempo real e acompanhar o histórico e a tendência dos níveis de açúcar circulante.
O equipamento conta agora com o apoio de um aplicativo de celular, o LibreLink, que dispensa o leitor eletrônico convencional. “A pessoa pode usar o próprio smartphone para fazer o escaneamento do sensor. É um processo mais prático e libera o paciente de muitos aparelhos para realizar o controle”, analisa o especialista da SBD.
O app também permite compartilhar os resultados diretamente com o médico. “E outro ganho é o uso das setas de tendência, que ajudam a entender como a glicose está flutuando, para cima ou para baixo”, destaca Krakauer.
7. O remédio 3 em 1
Uma das tendências na medicina é buscar agregar em um único comprimido diversos princípios ativos para ganhar efetividade e conveniência. Um bom exemplo é um medicamento para diabetes tipo 2 que recebeu sinal verde nos EUA e reúne um combo de saxagliptina, metformina e dapaglifozina.
A ideia, testada e aprovada pela farmacêutica AstraZeneca, é agir em várias frentes simultaneamente a fim de impor melhor controle sobre a glicose. A saxagliptina regula a produção de dois hormônios com funções opostas, a insulina e o glucagon, de acordo com os níveis de açúcar no sangue.
A metformina, por sua vez, otimiza o aproveitamento da insulina pelas células, evitando que a glicose sobre na circulação. E a dapaglifozina elimina o excesso de açúcar pela urina.
“Quando você tem um comprimido 3 em 1, não oferece apenas uma terapia tripla. Você barateia o tratamento e faz o paciente ter a sensação de que está tomando um único remédio”, analisa o endocrinologista Carlos Eduardo Barra Couri, da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (USP).
E ele completa: “A grande palavra quando se fala no controle do diabetes é adesão. Daí ser bem-vinda toda estratégia que ajude o paciente a iniciar e continuar o tratamento.”
8. Medicamentos que protegem o coração contra o diabetes
“A principal causa de morte em pessoas com diabetes é a doença cardiovascular”, alerta Couri. De olho na prevenção de infarto e outras complicações, duas classes de medicamentos se destacaram recentemente devido a um valioso extra: proteger o peito. Falamos dos análogos de GLP-1 e dos inibidores de SGLT2, estes famosos por expulsarem o açúcar excedente pelo xixi.
“Quem mais se beneficia desse uso é o indivíduo com diabetes tipo 2, acima do peso e com antecedente de problemas cardiovasculares”, indica Krakauer. Mas, segundo o médico, como o foco das drogas é domar a glicemia, muitos outros diabéticos podem tirar proveito.
A principal barreira hoje é o preço. “No caso do análogo de GLP-1, o tempo médio de uso no Brasil é inferior a seis meses. Muito paciente não consegue manter o tratamento”, lamenta Couri.
É uma situação longe do ideal, uma vez que esses medicamentos são de uso contínuo. Se empregadas como manda o figurino, as duas classes diminuem significativamente o risco de morrer do coração, dizem os estudos.
9. Medicação para quem tem pré-diabetes
Eis uma cena cada vez mais comum no Brasil: a pessoa descobre que está com a glicemia elevada mas não a ponto de ser enquadrada como diabética. Só que é uma ilusão achar que está tudo bem: pesquisas atestam que o pré-diabetes já eleva o risco de infarto, por exemplo.
A recomendação básica para evitar a progressão do problema é se alimentar direito e fazer exercícios. Mas não é fácil mudar o estilo de vida da noite para o dia e, mesmo assim, nem sempre isso é suficiente para conter a glicose.
É nesse contexto que o médico pode receitar remédios como a metformina. Atenta a esse público, a Merck acaba de lançar uma versão com dosagem própria para quem tem pré-diabetes (850 mg).
“Quanto mais precoce for o tratamento para controlar a glicemia, melhor o resultado no longo prazo”, afirma Luiz André Magno, diretor médico da companhia no país.
10. Imunoterapia para deter o tipo 1
Tanto no Brasil como lá fora, cientistas vêm quebrando a cabeça para encontrar um jeito de frear o diabetes tipo 1 modulando o sistema imune, que passa a atirar contra o próprio pâncreas. Na Universidade Yale, nos EUA, uma equipe testou um medicamento imunoterápico capaz de atrasar o aparecimento da doença em pessoas com histórico familiar.
“O problema é que o diagnóstico foi retardado em apenas dois anos. A doença continua aparecendo”, pondera Couri.
Um método mais promissor e 100% nacional foi desenhado por Couri e colegas da USP de Ribeirão Preto: o transplante de células-tronco. O tratamento começa reduzindo a imunidade a quase zero, por meio de quimioterapia. As células-tronco retiradas do paciente são reinseridas para reconstruir o sistema imune, só que, nesse processo, perdem o ímpeto de agredir o pâncreas com a mesma intensidade de antes.
“Nossos pacientes ficaram, em média, seis anos sem usar insulina”, celebra Couri. “Esse é o melhor resultado já registrado, mas nosso objetivo é que nenhum deles volte a depender dela”, revela.
Os tipos de diabetes
Diabetes tipo 1: é uma doença autoimune: o corpo destrói as células que produzem insulina no pâncreas, tornando o indivíduo dependente de injeções regulares do hormônio. Representa até 10% dos casos de diabetes.
Diabetes tipo 2: é a versão mais comum, que afeta nove em cada dez diabéticos. Fatores como peso, idade e genética comprometem a fabricação de insulina ou o aproveitamento dela pelo organismo.
Pré-diabetes: é um estado de risco para desenvolver o tipo 2 pra valer. A glicemia costuma ficar entre 100 e 125 mg/dl (acima disso é diabetes). Não deve ser menosprezado, porque já aumenta a propensão a doenças, como as do coração.
Hábitos que sempre ajudam a controlar a glicemia
- Controle a quantidade de açúcar e gordura saturada (carne vermelha, queijos amarelos…) no cardápio. Privilegie verduras, legumes, frutas e cereais integrais.
- Procure reduzir o volume de alimentos industrializados.
- Pratique atividade física — tanto exercícios que fazem suar como os de força — regularmente.
- Programe-se para dormir direito e gerenciar o estresse.
- Monitore a glicemia segundo a orientação médica.
- Faça os exames de acompanhamento recomendados.
- Tome os remédios, incluindo a insulina, no momento e na dosagem indicados.
O que esperar de outras três promessas
Pâncreas artificial: já há dispositivos que checam a glicose e, automaticamente, liberam doses de insulina, como o Minimed 670G. Mas a tecnologia deve evoluir: nos EUA, 40% dos pacientes desistem do uso por problemas técnicos.
Intervenções na flora intestinal: diabéticos apresentam um desequilíbrio entre bactérias “boas” e “ruins” na microbiota, o que dificulta o controle da glicose. Pesquisas buscam agora reverter isso com probióticos ou transplante fecal.
Insulina oral: ela já está em testes na Alemanha. A vantagem em relação à injetável é que passa pelo fígado antes de entrar na corrente sanguínea, o que reduz o risco de ganhar peso e de hipoglicemia. Devemos aguardar alguns anos ainda.