Sal, uma pitada de polêmica
Indispensável na cozinha, o ingrediente está envolvido em encrencas relacionadas ao coração
“O sal é um dom”, já diria Dona Canô, exímia cozinheira, mãe de oito, entre os quais Caetano Veloso e Maria Bethânia.
Saber dosar o ingrediente requer talento. Pitadas de menos e o resultado é comida insossa. Punhados além da conta tornam o prato intragável.
Não bastasse o potencial para destruir receitas, o exagero abre brechas para encrencas.
Faz disparar a sede e, quanto mais água ingerida, maior o volume de líquidos na corrente sanguínea. Aí, o aumento da pressão arterial pode dar as caras.
Esse mecanismo acontece tanto quando comemos o tipo branco, que preenche a maioria dos saleiros, quanto com as versões “gourmet” que andam desfilando por aí.
Um trabalho realizado no Centro de Pesquisa em Alimentos da Universidade de São Paulo (USP), o FoRC, mostra que a quantidade de sódio do sal refinado comum é praticamente a mesma encontrada nos especiais, como o rosa do Himalaia, o negro indiano, o marinho, a flor de sal, entre outros caríssimos.
Além disso, há poucas diferenças do ponto de vista nutricional. Pela coloração e variedade no tamanho das pedrinhas, esses produtos são bem-vindos para dar mais charme às preparações. Mas para eles também vale a dica de não errar a mão.
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Na medida certa, o sal não merece a má fama que carrega. Muito pelo contrário. Afinal, realça o sabor como nenhum outro tempero. Consegue atenuar amargor, reforçar aromas, intensificar o gosto, entre tantas mágicas culinárias.
De tão valioso servia como pagamento aos soldados do Império Romano.
Afora isso, o cloreto de sódio – seu nome técnico – é um precioso conservante. Muito antes da invenção da geladeira, a salga era a maneira mais eficiente de garantir que certos alimentos não apodrecessem.
As carnes, por exemplo, eram colocadas em soluções de água lotadas de sal. Um truque para desidratar microorganismos e frear a deterioração da comida.
Alguns estudiosos, inclusive, creditam a essa técnica milenar os excessos salgados cometidos até hoje nas cozinhas brasileiras. O exagero teria uma raiz cultural, viria da tradição europeia.
Fato é que nosso paladar se acostumou com muitas pitadas extras.
Enquanto a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) é limitar o consumo a entre 5 e 6 gramas por dia, aqui, alcançamos 12 gramas. Ou seja, o dobro.
O ideal seria comer o mínimo desde a primeira papinha, mas há trabalhos mostrando que até mesmo os bebês consomem demais.
O fogão costuma ser palco de deslizes. Mas, na contabilidade, claro, há que incluir produtos industrializados, que carregam generosas porções da substância e podem passar batidos por nós.
Atenção aos rótulos nunca é demais.
Para essa coluna, a música escolhida é a Canção do Sal, na voz de Milton Nascimento e da saudosa Elis Regina: