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Crise do cacau: o que será do chocolate?

O preço da matéria-prima do doce mais querido do planeta escalou. Entenda o que tem sido feito para o chocolate não virar uma rara iguaria

Por Ingrid Luisa
2 jul 2024, 08h47
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  • Você já percebeu que aquele bombom ou tablete de chocolate que adoça a vida depois do almoço ficou mais caro?

    Pois é, seja um chocólatra, seja um consumidor eventual, todo mundo está comentando que os pacotes estão pesando no orçamento. E não é apenas impressão, não. Segundo o índice da Fundação Getulio Vargas (FGV), o preço do chocolate aumentou 12% em 2023, bem acima da inflação geral dos alimentos.

    Na última Páscoa, o valor cobrado pelos ovos bateu recorde, gerando memes e comentários após supermercados divulgarem que as delícias podiam ser parceladas em dez vezes sem juros — teve até gente sugerindo utilizar o saldo no FGTS para manter a tradição.

    Propagandas e piadas à parte, a situação está feia para quem não dispensa um dos doces mais populares mundo afora. E, infelizmente, pode piorar, já que a produção do cacau, a nobre matéria-prima, passa por sua maior crise nos últimos 40 anos.

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    Os preços da tonelada do fruto empregado para fazer os chocolates industrializados subiram estrondosamente: de 2 500 dólares em julho de 2023, o valor saltou para mais de 10 mil dólares em abril de 2024.

    No Brasil, uma arroba de cacau (cerca de 15 quilos), que antes custava até 250 reais, chegou a bater mil e hoje oscila na casa dos 700 reais. Os produtores de chocolate sentem… e os consumidores também.

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    Preço do cacau subiu muito acima do esperado (Gráfico: Letícia Raposo/Estúdio Coral/Veja Saúde)
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    Crise do cacau é questão global

    Essa crise escancara uma mistura de problemas ambientais, estruturais e sociais. Hoje, 75% do cacau comercializado no mundo vem da África, especificamente de quatro países: Costa do Marfim, Gana, Nigéria e Camarões. Em contrapartida, 75% do consumo de chocolate acontece na Europa e na América do Norte.

    Já faz alguns anos que as safras de cacau africanas sofrem por causa de pragas descontroladas, envelhecimento das lavouras e falta de recursos.

    Tradicionalmente, as fazendas de lá vendem sua produção ao governo, que é quem negocia a commodity com o mercado internacional. Só que elas são mal remuneradas, apelando inclusive a trabalho escravo e infantil, uma chaga ainda não erradicada.

    Agora, as mudanças climáticas e as poucas chuvas resultantes do El Niño foram o estopim da devassa, levando essas nações a produzirem de 40 a 50% menos frutos.

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    “O cacau é uma commodity de países pobres, e a cacauicultura na África é uma bomba-relógio”, afirma o biólogo Cristiano Vilela, diretor científico do Centro de Inovação do Cacau (CIC), no sul da Bahia. “Ali as lavouras sofrem demais com vírus, fungos e outras pragas, e o produtor africano é o que menos recebe pela matéria-prima no mundo”, completa.

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    Somado a esse dilema social, o aquecimento global parece ser o fenômeno que está acelerando o cronômetro para a bomba explodir.

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    Os maiores produtores de cacau no Brasil e no mundo (Foto: GoldStock/Getty Images; Ilustrações: Letícia Raposo/Estúdio Coral/Veja Saúde)

    A chocolatière Luciana Lobo, diretora de produtos à frente da marca nacional Dengo, concorda com esse diagnóstico sobre a complicada economia do cacau. “O mundo pagava pouco pelo fruto, considerando todo o trabalho que ele dá no campo. A conta não fechava para ninguém”, conta.

    Se antes os preços da commodity decolaram, agora estão baixando lentamente, e devam chegar, na visão de Luciana, a uma taxa mais justa. “Do jeito que estava antes, era muito difícil para os produtores sobreviverem, inclusive no Brasil”, avalia.

    A crise climática também chegou ao nosso país. No primeiro trimestre de 2024, pelas contas da Associação Nacional das Indústrias Processadoras de Cacau (AIPC), houve uma queda de 31% no volume de amêndoas de cacau nacionais recebidas pelas empresas que fazem a moagem — etapa básica para a manufatura do chocolate.

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    O Brasil é o sexto maior produtor do mundo, de acordo com a Organização Internacional do Cacau (ICCO), mas ainda não é autossuficiente e importa de 20 a 25% do cacau que processa para atender a demanda interna.

    Será que os dias de abundância de chocolate estão contados? Há esperança! Ao menos para que ele não suma do mapa (e da mesa) ou vire iguaria raríssima. Afinal, especialistas enxergam a crise atual como oportunidade.

    O Brasil é o país com o maior potencial de crescimento na cacauicultura. Precisamos investir nela”, diz Anna Paula Losi, presidente-executiva da AIPC.

    A história do chocolate

    Mesmo o chocolate sendo um produto de indulgência, ou seja, não essencial para a sobrevivência e a nutrição, ele é idolatrado e saboreado no mundo inteiro. Daí a preocupação com a carestia de sua matéria-prima.

    Na verdade, a humanidade mantém uma relação histórica com o alimento. E aquela receita gostosa, que derrete na boca e deixa a gente feliz, não nasceu da noite para o dia.

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    Esse percurso começou em outras eras, com os olmecas, civilização que habitou o sul do México cerca de 1 500 anos antes de Cristo. Ao que tudo indica, eles foram os primeiros a transformar as amêndoas de cacau em chocolate. Quer dizer, não exatamente no chocolate que conhecemos, mas numa bebida amarga feita com as sementes torradas e moídas e apreciada em rituais.

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    Alguns séculos depois, os maias acrescentaram pimenta a essa fórmula — muito antes de Ana Francisca, a protagonista de Chocolate com Pimenta — e a batizaram de “tchocoatl”, que pode ser traduzido literalmente como “água amarga”, mas, para esse povo, tinha conotação de alimento dos deuses.

    No século 15, ainda nessa mesma região, os astecas não apenas tomavam o tchocoatl como usavam as amêndoas de cacau como moeda.

    Mas e o resto do mundo? Bem, foi só a partir das grandes navegações que os europeus conheceram o cacau. E, na Espanha, o chocolate ganhou um ingrediente do qual se tornaria praticamente inseparável, o açúcar. Começa aí a história da globalização da iguaria.

    Na Idade Moderna, o doce ganhou o paladar da aristocracia europeia e exigia uma fabricação artesanal bastante trabalhosa. Mas tudo mudaria no século 19, no rastro da Revolução Industrial. Foi aí que conseguiram separar a manteiga da massa de cacau em pó, truque que possibilitou desenvolver uma mistura mais estável e o chocolate sólido.

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    Estava criado o queridinho… Faltava apenas aprimorá-lo. Em 1875, o chocolateiro suíço Daniel Peter teve a ideia de usar o leite condensado, inventado anos antes por Henri Nestlé, para criar o chocolate ao leite.

    Pouco depois, Rodolphe Lindt inventou o método da conchagem, que eliminava a acidez e o amargor indesejáveis e deixava o alimento bem mais macio. Bingo!

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    Entenda o processo de fabricação do chocolate! (Fotos: kuangLiu, Luis Echeverri Urrea e Prostock-Studio/Getty Images; Ilustrações: Letícia Raposo/Estúdio Coral/Veja Saúde)

    A receita de sucesso caiu no gosto do povo, o que instigou empresários e governos coloniais a partir para as lavouras de cacau na África. Apesar de países como Bélgica e Suíça serem famosos por seus chocolates de alta qualidade, não existe um pé de cacau ali, pois a planta prefere o sol dos trópicos.

    Por muito tempo se acreditou que o cacau fosse nativo da América Central, mas, em 2013, um estudo revolucionário de pesquisadores do Equador e da França revelou vestígios arqueológicos de cultivo e manejo da planta no território amazônico cerca de 5 mil anos atrás, muito antes do que se imaginava.

    Reconstruindo seu trajeto, hoje se sabe que ele é natural da Amazônia e só mais tarde chegaria a México, Honduras e Guatemala.

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    Cacau em casa: a produção no Brasil

    Como commodity, o cacau só foi introduzido no nosso país no final do século 17, na região do Pará, pelas mãos dos portugueses.

    A consagração da produção, porém, aconteceria muito tempo depois, e em outro bioma, a Mata Atlântica, sobretudo na porção que ocupa o sul da Bahia.

    No livro São Jorge dos Ilhéus (1944), que encerra a trilogia conhecida como “Ciclo do Cacau”, do escritor baiano Jorge Amado, o autor afirma que “a terra dá frutos de ouro”.

    E foi exatamente isso o que se viu no século 20: na década de 1970, Ilhéus enviava cerca de 300 mil toneladas de amêndoas de cacau para o exterior. E, em 1986, o Brasil quebrou o recorde de 400 mil toneladas de produção apenas na Bahia, consolidando-se como o segundo maior produtor mundial.

    E, aí, o enredo amargou. Nessa época começou a se disseminar uma praga que mudou a história do cacau brasileiro. O fungo vassoura-de-bruxa dizimou o cultivo na Bahia e fez o país enfrentar sua maior crise, da qual nunca se recuperou plenamente.

    Hoje, o Brasil inteiro produz cerca de 200 mil toneladas de cacau, número insuficiente até para abastecer a indústria nacional.

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    Mas o mundo gira e, com dedicação, investimento e olhar sustentável, há quem acredite que, com tantos aprendizados e predicados naturais, possamos nos projetar de novo globalmente. “O cacau é uma cultura tradicional com muito espaço para crescer”, diz Anna Paula.

    A líder da AIPC conta que há várias iniciativas em curso para transformar o cultivo por aqui. “Existem projetos visando melhorar a produtividade de áreas tradicionais como Bahia, Pará, Espírito Santo e Rondônia, estados que abarcam Mata Atlântica e Floresta Amazônica”, relata.

    “E também há um trabalho de expandir o cacau por áreas não convencionais, como São Paulo, Tocantins e Mato Grosso. Muita gente disse que era impossível plantar cacau no Cerrado, mas já vemos que isso não é verdade.”

    O fato é que somos uma das poucas nações a possuir todas as etapas da cadeia de produção e consumo: plantações de cacau, processadoras de amêndoas, fábricas de chocolate e mercado interno robusto.

    Mas não adianta crescer de forma predatória, como ocorreu com a monocultura baiana dos séculos 19 e 20 ou na África recentemente. Pelo contrário, numa mobilização entre entes públicos e privados, a meta hoje é tornar o Brasil a terra do cacau sustentável.

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    Essa missão de alavancar a safra sem descuidar do ambiente e das condições adequadas de trabalho nas comunidades produtoras é o que norteia o Plano Inova Cacau 2030, lançado pelo Ministério da Agricultura e Pecuária no ano passado. Ele oferece créditos, incentivos e assistência técnica a produtores para tornar o país autossuficiente nas amêndoas em seis anos.

    A ideia de fazer o Brasil voltar aos tempos áureos agrada a indústria. A Nestlé, maior fabricante de chocolates da América Latina, criou o Cocoa Plan, um programa de sustentabilidade baseado em aumento da produtividade e uso de agricultura regenerativa.

    “Mesmo a gente comprando a matéria-prima dos chocolates da indústria moageira, que já vende a manteiga e massa de cacau, sentimos que era preciso voltar à base, à plantação, para que um cacau de qualidade chegue até nós”, afirma Mariana Marcussi, diretora de marketing de chocolates da Nestlé.

    “Fornecemos auxílios aos produtores, como treinamentos para um manejo moderno e sustentável e gestão da propriedade. O objetivo é alcançar 100% de cacau sustentável até 2025.” Atualmente, o programa impacta mais de 15 mil famílias que atuam no campo nos estados da Bahia, Pará, Espírito Santo, Tocantins e São Paulo.

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    Mas, enquanto esses projetos plantam sementes, como fica o preço do chocolate? “O valor do cacau está muito acima da inflação, mas estamos fazendo um trabalho interno mitigatório para que o preço dos nossos chocolates não suba além da inflação”, revela a executiva da Nestlé.

    “Situações como essa só mostram quão essencial é investir e aumentar a produção nacional para sermos menos dependentes do cacau de fora”, prossegue Mariana.

    Esse ponto é uma unanimidade entre os especialistas do setor. “Nossa produtividade média é baixa, entre 300 e 350 quilos de cacau por hectare de plantação. Um valor rentável seria a partir de 800 a mil quilos por hectare. É preciso aumentar o número de plantas e cuidar de forma adequada para que elas gerem mais frutos”, expõe a presidente da AIPC.

    E, acredite, a crise internacional pode até render mais investimentos para nós. “Pelos preços mais altos, o cacau está cada vez mais sendo visto como um bom negócio, e muita gente que já investe em outras culturas está migrando para ele”, diz Vilela.

    Só que tem outro detalhe nessa história. Apesar da nossa tradição cacaueira, nunca fomos referência no que chamam de cacau fino, a matéria-prima premium que dá origem a chocolates de alto padrão.

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    Sabores do chocolate

    A lei brasileira é bastante permissiva com relação aos ingredientes do chocolate. Ela exige apenas 25% de sólidos de cacau (manteiga e massa) no produto e não há limite para ingredientes adicionados.

    Na maioria dos países europeus, o mínimo é 35% de cacau, e aditivos devem ficar de fora.

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    Conheça os ingredientes básicos para o chocolate. (Ilustrações: Letícia Raposo/Estúdio Coral/SAÚDE é Vital)

    “Bons ingredientes garantes a melhor experiência sensorial com o chocolate. A manteiga de cacau, por exemplo, é essencial para fazer com que o chocolate derreta na boca, mas isso não acontece quando se adicionam outras gorduras vegetais ao produto”, afirma Zélia Frangioni, especialista em chocolate e autora do blog Chocólatras Online.

    É por isso que muita gente reclama que o chocolate mais em conta deixa a desejar ou que o gostinho do produto não é mais o mesmo de antes.

    A indústria faz ponderações. “As pessoas querem que o chocolate de hoje tenha o mesmo gosto da infância, mas o paladar evolui e há uma nostalgia”, avalia Caio Martins, diretor da fábrica de chocolates da Nestlé em Caçapava (SP).

    “Sabemos que o brasileiro prefere chocolate ao leite e hoje tudo é feito com base em testes sensoriais com consumidores”, conta João Ramalho, gerente de inovação da Nestlé Brasil. “Mesmo a gordura vegetal que a gente utiliza é compatível com a manteiga de cacau, gerando inclusive uma funcionalidade melhor no processo, pois, além de dar mais resistência ao produto, permite que ele chegue intacto ao Brasil inteiro.”

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    Um novo movimento em curso, de olho nos consumidores mais exigentes e no padrão de qualidade internacional, é o boom da produção artesanal. É assim que a onda do chocolate bean to bar cresce no Brasil, exigindo que os chocolatiers possuam todo o controle da produção (da semente à barra), tendo maior rigor com os poucos e bons ingredientes.

    Quem começou essa tendência foi a marca norte-americana Scharffen Berger, na Califórnia, no fim da década de 1990. Como lá não tem cacau, eles adquiriram seus grãos diretamente de pequenos produtores em países como Venezuela e Brasil.

    A primeira fábrica ficava na cozinha de um dos donos, e lá eles aperfeiçoaram a torrefação, moagem, e todos as outras etapas da produção, resultando em um chocolate autêntico e totalmente artesanal.

    A regra de qualidade era simples: em vez de mascarar o sabor do grão com muito açúcar ou aditivos, a intenção era deixar perceptível as notas e os verdadeiros sabores do cacau. Com o sucesso da Scharffen Berger, o movimento se espalhou pelo mundo todo.

    Mesmo nosso país sendo um tradicional fornecedor da nobre matéria-prima, essa tendência demorou a se popularizar por aqui.

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    Chocolate brasileiro bean to bar

    “Quando eu cheguei ao Brasil, em 2014, as pessoas valorizavam muito o chocolate belga, o suíço ou com avelã. Mas eu vi que há um cacau e outros sabores muito mais interessantes por aqui, coisas que o mundo desconhecia”, relata a americana Arcelia Gallardo, fundadora da marca Mission Chocolates.

    A ideia de Arcelia, confeiteira que queria também produzir chocolates, era ficar quatro anos aprendendo sobre cacau no Brasil e depois retornar a California para abrir uma fábrica própria por lá. Mas, já fazem 11 anos que essa volta nunca se concretizou.

    “Eu vim para aprender, mas percebi que também tinha muito a educar. Pouquíssimas pessoas aqui conheciam o chocolate bean to bar, que nasceu no meu bairro. Após encontrar o blog Chocólatras Online, eu e Zélia começamos a fazer degustações desses chocolates na minha própria casa, e assim fomos construindo uma comunidade”, conta.

    “Eu me apaixonei pelos sabores e possibilidades que só o Brasil tem. Por isso resolvi inaugurar uma marca de chocolate artesanal 100% brasileira”, completa a chocolatier.

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    Arcelia foi uma das fundadoras da Associação Bean to Bar Brasil, que hoje reúne cerca de 60 marcas brasileiras. Seu chocolate já ganhou mais de 32 prêmios internacionais de qualidade.

    “Quando começamos a discutir sobre como íamos trazer atenção para o chocolate brasileiro, a melhor forma que pensamos foram os prêmios. Até hoje eu envio para prêmios o chocolate de umas seis marcas de bean to bar. A intenção sempre foi mostrar que, além do cacau, o Brasil possui um chocolate único e de qualidade“, afirma a pioneira.

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    Conheça os princípios do chocolate bean to bar! (Foto: Ekaterina Budinovskaya/Getty Images; Ilustrações: Letícia Raposo/Estúdio Coral/SAÚDE é Vital)

    O estímulo a essa prática no Brasil fez aumentar a produção de cacau fino no país. E, com isso, a necessidade de locais que medissem a qualidade desse cacau surgiu. Foi assim que nasceu o Centro de Inovação do Cacau (CIC), no sul da Bahia, em 2015.

    “A gente vem desenvolvendo diversas atividades relacionadas à cacauicultura, mas nossa principal pauta é trabalhar a qualidade como fator de diferenciação e agregação de valor para melhorar a vida de pequenos produtores rurais”, explica Cristiano. “É justo que um produtor receba mais por um cacau comprovadamente de melhor qualidade”, completa.

    Um dos principais serviços que o CIC realiza são análises fisico-químicas e sensoriais de amêndoas de cacau, para atestar características e qualidade ou para identificar o que falta nas amêndoas para atingir um alto padrão de cacau fino.

    “Também temos uma fábrica de chocolate e prestamos serviço para mais de 33 marcas locais. Além disso, fazemos a ponte entre agricultores que estão produzindo uma amêndoa de boa qualidade e o mercado comprador de bean to bar”, completa.

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    A Dengo, maior empresa de chocolates artesanais do Brasil, é uma grande compradora de cacau atestado pelo CIC. E sua produção impacta mais de 200 famílias no sul da Bahia.

    “Quando fui pela primeira vez conversar com pequenos produtores, antes mesmo da Dengo existir, alguns falavam que sabiam fermentar com qualidade, mas não valia a pena por que ninguém pagava por isso. O manejo correto do cacau é custoso, exige tempo, a produção de cacau fino não compensava. Mas a razão de existir da Dengo é pagar mais por um cacau de alta qualidade”, conta Luciano Lobo, chocolatier da marca.

    “É uma relação de ganha-ganha pros dois lados: nós pagamos mais pelo cacau, mas entregamos um chocolate melhor e mais saudável para o consumidor“, completa.

    Com esse mercado a todo vapor, em 2019, pela primeira vez, nosso país recebeu um selo de nação produtora de cacau fino e de qualidade pela Organização Internacional do Cacau (ICCO).

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    Dicas para escolher um chocolate considerado de qualidade! (Ilustrações: Letícia Raposo/Estúdio Coral/SAÚDE é Vital)

    E os diferenciais e as perspectivas tupiniquins são enormes. A marca de chocolates Luisa Abram, por exemplo, só trabalha com cacau amazônico selvagem, que cresce no meio da floresta sem adubação e irrigação, ou novo plantio controlado.

    “Quando comecei, as questões eram maiores do que eu imaginava… Não existia uma cadeia pronta para a matéria-prima. As amêndoas vinham ruins porque não havia estrutura para uma fermentação adequada. Para começar a comprar cacau de lá, foi preciso um trabalho árduo, com investimento em técnicas e estrutura”, relata Luisa, dentro de sua fábrica, hoje no bairro do Socorro, em São Paulo.

    A empresária alocou parte da companhia no Acre e contratou experts para tornar a matéria-prima viável. Valeu a pena: já ganhou mais de 25 prêmios. E seu chocolate inclui sabores tradicionais brasileiros, como as recém-lançadas barras de chocolate com jambu e tucupi.

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    Ocorre que a crise não poupa os adeptos do movimento. Apesar de todos só comprarem cacau nacional, a base de trabalho para eles sempre foi o cacau fino, que custa, em média, cinco vezes mais que a versão commodity. Agora que o valor do cacau comum está se equiparando ao do fino, o de melhor qualidade tende a ficar ainda mais caro.

    Muitas marcas artesanais infelizmente não podem arcar com esses custos e correm risco de quebrar”, preocupa-se Zélia. Luisa revela que, das seis localidades de onde adquire o fruto, duas não tiveram safra devido a mudanças no clima.

    Espera-se que tudo estabilize até o fim do ano, mas não há garantias.

    Ainda não se sabe o que vai ser do tão amado chocolate daqui a algumas décadas. Mas vale provar e se deliciar com o autêntico chocolate made in Brazil desde já e cuidar do planeta para o principal ingrediente nunca faltar.

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