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Comece o dia salvando o planeta

Suas escolhas na alimentação podem combater a mudança climática, defende escritor

Por André Bernardo
27 nov 2020, 15h10

Jonathan Safran Foer tinha 9 anos quando foi convertido ao vegetarianismo. Num almoço de domingo, o americano saboreava frango com cenoura e ofereceu um pouco à babá. “Não, obrigada!”, ela recusou. “Por quê?”, quis saber o garoto. “Não quero machucar ninguém”, explicou.

Ao longo dos anos, Foer teve recaídas, mas, quando descobriu que ia ser pai, baniu os bichos do cardápio e escreveu Comer Animais (clique para comprar), sobre os bastidores da indústria da carne.

Hoje, aos 44 anos, ele expande o tema em Nós Somos o Clima (clique para comprar), que nos sensibiliza sobre o papel da alimentação carnívora e de outros fatores na crise ambiental — se as vacas fossem um país, diz Foer, estariam atrás só da China e dos EUA na emissão de gases do efeito estufa. Acompanhe uma entrevista com o autor.

Qual é a importância de mudar nossos hábitos alimentares, como diminuir o consumo de carne, para salvar o planeta?

Não precisamos nos tornar vegetarianos para salvar o planeta. Precisamos apenas voltar a consumir carne como no passado, como faziam nossos pais e avós, ou seja, com moderação. E por duas razões.

A primeira delas: a população mundial não para de crescer. Nossos recursos naturais, ao contrário, estão se tornando cada vez mais escassos. Comer carne é um dos hábitos que mais consomem energia porque exige oferecer entre 6 e 26 calorias ao animal para obter apenas 1 caloria de alimento. É também um dos hábitos mais associados à produção de gases do efeito estufa.

A segunda razão: há 50 anos, a agropecuária foi superada pela indústria e suas práticas extremamente destrutivas para o homem, o meio ambiente e os animais. Volto a dizer: não precisamos ser radicais. Precisamos apenas nos alimentar com moderação.

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Você é o primeiro a admitir que a ingestão de carne está enraizada em nossa cultura, “desde o peru do Dia de Ação de Graças ao cachorro-quente nos estádios esportivos”. Como a gente consegue reduzir esse consumo?

A dica que eu dou é: seja honesto sobre quanto consumir carne é importante para a sua vida. Nos EUA, temos o peru do Dia de Ação de Graças. E no Brasil, o que temos? Churrasco ou feijoada nos fins de semana? Quantas vezes por ano é importante comer carne? Natal, Páscoa, Dia das Mães? Sejamos honestos.

Se tivermos que consumir carne só nos fins de semana ou, ainda, em datas especiais, já estaremos fazendo a nossa parte, porque será um consumo relativamente baixo. O importante é guardar o hábito de comer carne para quando for realmente necessário. E não todo dia e a qualquer hora.

Além de consumir menos carne, você propõe voar menos, dirigir menos e ter menos filhos. O que é mais difícil de conseguir?

Essas são as quatro atividades que, segundo a ciência, mais causam impactos no meio ambiente. Veja bem: não sou um modelo de comportamento. Tenho dois filhos, voo mais do que a maioria das pessoas, tenho carro e, durante boa parte da vida, comi de tudo. Sou um modelo de esforço.

Este ano, tomei a decisão de não viajar de avião nas férias. O que acabou se revelando fácil devido à pandemia. Procuro me alimentar bem, comprei um carro elétrico, e por aí vai. Não é fácil, admito. Mas tenho feito o que posso e, com o passar do tempo, aprendi a fazer mais e mais.

Paul McCartney costuma dizer que se tornou vegetariano durante uma pescaria: “O peixe tem tanto direito à vida quanto eu”. E você?

Quando criança, eu tinha uma babá vegetariana. Um dia, ofereci a ela um pedaço de frango e ela recusou. “Não quero machucar ninguém”, respondeu, “a não ser que seja necessário.” Me pareceu um argumento convincente. Mas eu era um vegetariano não praticante, sabe? Volta e meia, comia carne.

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Se estou mais saudável hoje? Acredito que sim. Sabemos que uma pessoa pode ser perfeitamente saudável comendo carne, mas sabemos também que quem come menos carne, especialmente a vermelha, tem pressão e colesterol mais baixos e menos chance de ter câncer.

Em geral, os vegetarianos vivem mais. Mas, para ser sincero, esses não são os principais motivos para mim. O principal motivo é aquele que ouvi aos 9 anos: por não ser necessário. Não quero machucar animais nem destruir o meio ambiente, a não ser que seja necessário. E não é.

No Brasil, alguns adeptos do vegetarianismo já aderiram ao hambúrguer de soja e ao churrasco de melancia. O que acha disso? Já experimentou?

Conheço pessoas que, um belo dia, decidiram se tornar vegetarianas e nunca mais voltaram atrás. Foi a coisa mais fácil do mundo. Conheço outras, como eu, que ainda hoje sentem falta de carne. Para essas pessoas, o hambúrguer vegetariano pode ser uma alternativa.

Não é fácil mudar hábitos alimentares numa cultura que valoriza tanto a carne. O hambúrguer de soja, que você citou, não é a melhor solução. Também faz mal ao meio ambiente. Mas, se comparado ao de carne que é vendido nas lanchonetes, é melhor, muito melhor.

Você tem dois filhos, um de 14 e outro de 11 anos. Você os convenceu a serem vegetarianos?

Não, desde pequenos eles são vegetarianos. O caçula, às vezes, ainda come carne. Mas quero que ele cresça consciente das decisões que tomou. E quero que ele tome decisões de acordo com os seus próprios valores, e não de acordo com os meus.

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Em 2009, você lançou Comer Animais, que revela como é produzida a carne que comemos. Agora vem Nós Somos o Clima. Eles se complementam?

Sim. Só que os dois partiram de premissas diferentes. Enquanto um falava sobre hábitos alimentares, o outro foca mais na mudança climática. O curioso é que ambos chegaram à mesma conclusão: temos que comer menos carne.

Você chegou a invadir fazendas de criação de aves para escrever esse primeiro livro. Não temeu represálias ou por sua vida?

Não. Deveria? [risos] Bem, não lembro se senti medo ou não. A indústria agropecuária sabe que, quanto mais tocarmos no assunto, menos as pessoas vão consumir seus produtos. A única forma de ela sobreviver é continuarmos ignorantes sobre os seus efeitos sobre o meio ambiente.

Quando falamos de agropecuária, não estamos falando de fazendeiros, mas de corporações que tratam os próprios fazendeiros como inimigos. E por quê? Porque eles são os primeiros a saber que precisamos comer menos carne.

Volto a dizer: não estou pedindo a ninguém para virar vegetariano. Mas, em um mundo cuja população não para de crescer, não temos mais como arcar com essa quantidade de comida, tão esbanjadora de recursos para sua produção.

Você tem parentes que moram em São Paulo e já veio ao Brasil algumas vezes, né? O que tem achado das notícias recentes sobre o desmatamento da Amazônia e o combate à Covid-19 em nosso país?

Sim, metade da minha família mora em São Paulo. Vivemos situações parecidas tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos. Temos dois presidentes que não acreditam em ciência. Dois dos maiores países do planeta, sendo liderados por dois dos piores líderes mundiais da história moderna. Não consigo imaginar uma combinação pior e tão extraordinariamente assustadora.

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Ficha técnica

Nós Somos o Clima
(Divulgação/SAÚDE é Vital)

Nós somos o clima: salvar o planeta começa no café da manhã
Autor: Jonathan Safran Foer
Editora: Rocco
Páginas: 288

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