Saúde mental das mulheres merece atenção redobrada
Fatores fisiológicos e ambientais tornam o sexo feminino mais propenso a certos quadros psiquiátricos
O assunto saúde mental nunca esteve tão em evidência – ainda mais depois de uma pandemia. Mas os transtornos da mente não atingem a todos de maneira igual. As mulheres, por exemplo, estão mais propensas a uma dupla jornada de trabalho (no ambiente profissional e no doméstico) e a viverem experiências de violência psicológica e física ao longo da vida.
Levar em conta esse contexto e também as características fisiológicas delas (como oscilações hormonais ao longo da vida) é imprescindível. Só que dificilmente esses fatores são considerados nos consultórios.
Para disseminar esse conceito, especialistas no assunto se debruçaram em estudos diversos e criaram o e-book “Transtornos Psiquiátricos na Mulher: Diagnóstico e Manejo”, publicado pela parceria entre a Editora Artmed e a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).
Esse material, disponível no site do grupo A+, tem o objetivo de sensibilizar profissionais de saúde de todas as especialidades a entender as peculiaridades do tema. Mas a paciente, consciente dessas questões, também pode ficar melhor preparada para conversar com seu médico.
“Todos esses fatores, sejam eles biológicos ou psicossociais, tornam as mulheres mais vulneráveis à depressão”, exemplifica o psiquiatra Joel Rennó, um dos organizadores da publicação.
“Nossa missão é fazer com que o ginecologista, o obstetra, o oncologista e outros profissionais de saúde tenham em mãos mais conhecimento sobre o assunto para que o diagnóstico precoce se torne uma regra”, pontua o médico, que é professor da Faculdade de Medicina da USP.
Hoje, infelizmente, é comum ver a mulher ser medicada incorretamente ou ter sintomas de uma doença mental ignorados. Com isso, o quadro pode evoluir.
“A paciente com câncer de mama precisa de apoio adequado quando recebe a notícia do diagnóstico, já as gestantes com histórico de depressão necessitam de um cuidado especial…”, cita o psiquiatra.
Medicamentos para elas
Ser do sexo feminino também faz a diferença na escolha do tratamento, algo bastante discutido no material. Por exemplo: tratar um transtorno bipolar é diferente nas primeiras fases da vida, e há ainda mais especificidades durante uma gestação.
Já na menopausa há uma confusão hormonal capaz de abrir as portas para uma depressão. “Porém, embora saibamos que o estrogênio tem uma conexão com o sistema nervoso central, nem sempre é esse tipo de hormônio que deve ser o foco do tratamento”, informa o médico.
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Não é só a falta de conhecimento sobre esses aspectos que tende a dificultar o acesso das mulheres aos melhores cuidados. O machismo tem sua parcela de responsabilidade aqui. Afinal, faz pouco tempo que os estudos com remédios psiquiátricos começaram a considerar as variáveis femininas.
“O comum era avaliar homens e estender os resultados às mulheres, sem considerar uso de pílula anticoncepcional, ciclo menstrual e demais particularidades”, observa Rennó.
Aliás, remédios psiquiátricos em geral estão sempre na mira de novas pesquisas. A variedade só aumentou nos últimos anos, mas ainda não dá para taxar o que é melhor para cada fase da vida feminina. Por isso, o e-book indica o que tem de informação mais confiável, segundo dados científicos, para cada caso.
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Há muito preconceito por aí
Outra missão do e-book é derrubar preconceitos. É que situações como a depressão pós-parto e as doenças relacionadas ao período menstrual ainda tendem a ser minimizadas, na opinião do médico.
“O transtorno disfórico pré-menstrual está listado, hoje, como uma doença, e a gestante com histórico de depressão têm mais risco de sofrer recaídas ao longo da gravidez ou após o parto”, descreve o médico.
O tal transtorno disfórico pré-menstrual (TDPM) é como uma TPM mais grave, que provoca um golpe na qualidade de vida. A mulher se vê impedida de trabalhar, de estudar e até de levar uma vida social mais ativa. Rennó lembra que há tratamentos capazes de devolver a rotina normal à paciente em menos de uma semana. Basta ter o diagnóstico correto.
Na gravidez, o erro mais comum, segundo o médico, é parar a medicação sem trocar informações com o psiquiatra. “Interromper o tratamento é mais perigoso, pois, em caso de recaídas, o desenvolvimento do cérebro do feto pode se prejudicado. Aumenta, ainda, o risco de essa criança, no futuro, sofrer de algum quadro psiquiátrico”, alerta o médico.