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Remédio criado no Brasil mostra bons resultados contra o câncer de bexiga

Voluntários tratados com imunoterápico, desenvolvido na Unicamp, são acompanhados há dois anos e, até agora, ninguém morreu ou precisou retirar a bexiga

Por Karina Toledo, da Agência Fapesp*
Atualizado em 29 Maio 2023, 12h05 - Publicado em 1 dez 2021, 19h34
tumor na bexiga
Medicamento contra o câncer de bexiga foi totalmente desenvolvido em uma universidade pública brasileira. (Ilustração: Eber Evangelista/SAÚDE é Vital)
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Um medicamento desenvolvido na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e recentemente patenteado nos Estados Unidos tem se mostrado promissor no tratamento do câncer de bexiga. Resultados de um ensaio clínico que envolveu 44 pacientes com um quadro avançado da doença foram apresentados no 22º Congresso Brasileiro de Oncologia Clínica.

O tratamento experimental eliminou o tumor em 77,3% dos participantes e, nos demais casos, a doença voltou com menor intensidade. Os voluntários têm sido acompanhados já há dois anos e, até agora, ninguém morreu ou precisou retirar a bexiga. A investigação conta com apoio da Fapesp.

“Trata-se de um imunoterápico totalmente desenvolvido em uma universidade pública brasileira e cuja patente é 100% de seus inventores – algo disruptivo e inédito no país. Isso abre a possibilidade de negociação com grandes companhias farmacêuticas, que poderão nos ajudar a colocar o produto no mercado”, diz Wagner José Fávaro, professor do Instituto de Biologia da Unicamp e inventor do fármaco ao lado de Nelson Duran, seu colega de departamento.

+ LEIA TAMBÉM: Imunoterapia para tratar câncer de bexiga é aprovada no Brasil

Para levar adiante as fases finais de desenvolvimento do fármaco, os pesquisadores criaram a startup Nanoimmunotherapy Pharma Ltda. (NImm-Pharma) e, com o apoio da Agência de Inovação (Inova) da Unicamp, esperam em breve obter a patente do “OncoTherad” também na Europa.

O imunoterápico começou a ser desenvolvido há cerca de 13 anos com o objetivo de estimular o sistema imune a combater doenças infecciosas e tumores.

É composto por uma nanopartícula totalmente sintética, que induz no organismo uma resposta imune de células T, ou seja, ativa determinados tipos de linfócitos que produzem uma proteína chamada interferon (IFN), importante tanto para combater o câncer como também alguns vírus e bactérias.

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O trabalho também teve apoio da Fapesp por meio do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Materiais Complexos e Funcionais (Inomat), coordenado pelo professor Fernando Galembeck, do Instituto de Química da Unicamp.

Recentemente, os cientistas começaram a testá-lo no tratamento da Covid-19. O estudo mais avançado, porém, está relacionado ao câncer de bexiga.

Metodologia

O ensaio clínico apresentado no Congresso Brasileiro de Oncologia Clínica – e reconhecido com o Prêmio SBOC de Ciência – começou em 2018 no Hospital Municipal de Paulínia, município próximo a Campinas, e foi acompanhado pelo médico urologista João Carlos Cardoso Alonso.

Inicialmente foram recrutados 58 voluntários, mas somente 44 (30 homens e 14 mulheres) atendiam a todos os critérios de inclusão na pesquisa.

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“O objetivo era testar a segurança e a eficácia do imunoterápico em pacientes que não responderam ao tratamento de primeira linha para tumores não músculo-invasivo”, conta Fávaro.

Como explica o pesquisador, o câncer de bexiga geralmente começa entre as células que revestem internamente o órgão. Os tumores considerados músculo-invasivos (capazes de se espalhar para a musculatura da bexiga e potencialmente causar metástase) são considerados de alto risco e, para esses casos, o tratamento consiste na retirada cirúrgica total da bexiga (cistectomia radical).

Já nos portadores de tumores não músculo-invasivos, cerca de 70% dos casos, é feita apenas a raspagem da lesão por meio da uretra (ressecção transuretral). E a cirurgia é seguida por aplicações locais de BCG – a mesma formulação usada na prevenção da tuberculose. O objetivo dessa terapia é “acordar” o sistema imune para evitar que o tumor volte a crescer.

“A imunoterapia com BCG foi desenvolvida em 1976 e até hoje não surgiu nada melhor. O problema é que em aproximadamente metade dos pacientes o tumor reaparece”, explica Fávaro.

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Quando a doença retorna ainda na forma não invasiva, é feita uma nova cirurgia localizada seguida por imunoterapia.

“Mas quando há recidiva após dois ciclos de BCG a indicação é a retirada total da bexiga. É nesse ponto da doença que decidimos testar a eficácia do OncoTherad. Todos os participantes do estudo tinham indicação para a cistectomia radical, mas ou não apresentavam condições clínicas para a cirurgia – por conta da idade ou de doenças associadas – ou se recusavam a aceitar o tratamento recomendado”, conta o pesquisador.

Durante seis semanas, os voluntários foram submetidos a aplicações semanais de OncoTherad dentro da bexiga e por via intramuscular (nos glúteos). Nos seis meses seguintes, as aplicações passaram a ser feitas a cada 15 dias. Por último, foram feitas aplicações mensais até completar dois anos de tratamento. A cada três meses os pacientes passavam por exames para monitorar a evolução do câncer.

+ LEIA TAMBÉM: Novo remédio contra câncer de bexiga é aprovado no Brasil

Ao final do primeiro período de seguimento, aos 18 meses, 77,3% dos voluntários ainda se mantinham livres da doença. Em dez pacientes o tumor voltou com um grau mais baixo que o observado antes do ensaio clínico e as lesões foram removidas por raspagem. Em outros dois participantes o tumor voltou após os 18 primeiros meses, também de forma atenuada. Ninguém precisou remover a bexiga até o momento.

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Entre os efeitos colaterais relatados estão cistite (inflamação na bexiga), ardência ao urinar, dores nas articulações, coceiras no corpo e pele avermelhada, febre baixa e dor abdominal. “Foram sintomas leves, que conseguimos contornar com uma dose baixa de corticoide. Nenhum voluntário precisou abandonar o tratamento por conta de efeitos colaterais”, afirma Fávaro.

Segundo o pesquisador, as próximas etapas de desenvolvimento do fármaco dependem de uma interlocução com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e a indústria farmacêutica.

“Os ensaios clínicos multicêntricos de fases 2 e 3 – necessários para que o medicamento chegue ao mercado – requerem uma estrutura fabril com certificações da Anvisa. A obtenção da patente nos Estados Unidos deve nos ajudar nesse processo de interlocução com os órgãos reguladores”, avalia.

*Esse texto foi publicado originalmente na Agência Fapesp.

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