Proteção contra doenças da pesada
Problemas do coração
Talvez essa seja a relação que mais colocava pulgas atrás da orelha, já que um dos impactos do abuso da cafeína é o disparo dos batimentos cardíacos. Mas veja bem: falamos do exagero. “Há estudos mostrando que o consumo diário e moderado protege contra infarto, AVC e insuficiência cardíaca“, conta Mioto. E, se você já ouviu que o grão tem substâncias que elevam o colesterol, saiba que é verdade, sim. “No entanto, os filtros retêm até 80% delas”, garante o cardiologista.
É do time do expresso? Sem neura. Embora seja mais concentrado, o volume ingerido tende a ser menor. Fora isso, Mioto conta que a discreta subida de colesterol inclui a versão HDL da molécula, considerada protetora. Para limpar de vez a barra do café, o médico avaliou o impacto do consumo entre pessoas com doença coronariana – ou seja, com entupimentos nas artérias do coração – e constatou que mesmo elas não precisam abandonar as xícaras. Recentemente, a nutricionista Andreia Miranda, da Universidade de São Paulo (USP), analisou 550 homens e mulheres e notou um risco cerca de 50% menor de ter pressão alta entre quem ingeria de uma a três doses por dia. “Tudo por causa dos seus antioxidantes”, relata.
Panes no cérebro
Aqui, quem brilha é a própria cafeína. “Ela bloqueia dois importantes receptores de adenosina no cérebro“, ensina o neurocientista Marcelo Cossenza, do Instituto D’Or e da Universidade Federal Fluminense. Complicou? Saiba que essa interrupção culmina em um efeito neuroprotetor.
Não à toa, pesquisas já ligam o café à prevenção de doenças como Alzheimer, Parkinson e por aí vai. O professor de farmacologia Rui Prediger, da Universidade Federal de Santa Catarina, observou em seu laboratório que a cafeína ajuda a evitar a morte de neurônios produtores de dopamina, neurotransmissor envolvido no controle de movimentos, no humor e na memória.
A perda dessas células, cabe lembrar, está na gênese do Parkinson, marcado por rigidez e tremores involuntários. As perspectivas também animam no âmbito do tratamento. Após dar cafeína a animais com a doença, Prediger notou que, embora ela não reverta os danos aos neurônios, pelo menos melhora a memória e o humor. “E isso favorece a qualidade de vida”, diz. Com base em outra linha de pesquisa, o expert conta que a cafeína amenizaria alguns sintomas do transtorno do déficit de atenção (TDAH). Resta comprovar tal ganho em estudos maiores.
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Diabetes tipo 2
Ao analisar mais de 120 mil pessoas, cientistas da Universidade Harvard, nos Estados Unidos, concluíram que quem ampliou um tiquinho o consumo de café – coisa de uma xícara – viu cair em 11% a probabilidade de encarar a condição.
Não é o primeiro trabalho a evidenciar tal conexão. Aliás, parece que o benefício vale até para quem curte a bebida sem cafeína. “Em estudos com ratos, os ácidos clorogênicos e os produtos de sua degradação durante a torra do café diminuem a concentração de glicose no sangue e levam a um aumento da sensibilidade à ação da insulina, respectivamente”, explica a nutricionista Mônica Pinto, da Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic).
São mecanismos que impedem a circulação excessiva de açúcar no corpo – e a instalação do distúrbio. Para a médica Ana Carolina Nader, da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia/Regional Rio de Janeiro, não é para ninguém passar a se entupir da bebida com o intuito de prevenir o diabetes tipo 2. “O que sabemos hoje é que indivíduos com o hábito de tomar café têm menor risco de desenvolver a doença”, frisa. Quem já é diabético, por sua vez, não precisa aposentar a xícara. Só dispensar o açúcar.
Problemas no fígado
O elo entre o cafezinho e o bem-estar desse órgão está tão evidente que já há sugestão de consumo diante de certas situações. No último grande encontro internacional de hepatologia, ficou estabelecido que cerca de quatro xícaras diárias são vantajosas a quem possui gordura no fígado, a esteatose. Esse é um problema bem prevalente no Brasil, atingindo ao redor de 30% da população.
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“Além de elevar o risco de diabetes e doença cardiovascular, o quadro pode evoluir para uma cirrose ou um tumor”, explica o hepatologista Edison Parise, da Universidade Federal de São Paulo. O café ajudaria a barrar essa progressão.
“Mas ainda não sabemos em detalhes como ele atua aí”, avisa o hepatologista Marcio Dias, do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo. Para pessoas com hepatite C, também já se sabe que goles do líquido negro têm impacto positivo.
“Em nossas pesquisas, quem tomava de quatro a seis xícaras apresentava uma lesão menor no fígado”, comenta Parise. Com isso, cai a possibilidade de a hepatite avançar para a temida cirrose – quando as lesões e cicatrizes no órgão abalam pra valer suas funções. “Mas lembre-se: café não é remédio”, salienta o médico.
Câncer
No ano passado, uma revisão de 105 estudos publicada na prestigiada revista científica Nature concluiu que o hábito de tomar café está ligado a uma menor probabilidade de um dia ter câncer de boca, faringe, fígado, cólon, próstata, endométrio e pele. A exceção ficou por conta do tumor de pulmão – a tendência, aí, foi de aumento de risco.
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Mas esse dado é cientificamente difícil de engolir. “Muitos estudos não deduziram o perigo representado pelo cigarro“, examina Luis Felipe Ribeiro Pinto, pesquisador titular e chefe do Programa de Carcinogênese Molecular do Instituto Nacional do Câncer, o Inca.
Embora hoje seja menos comum, ainda tem gente que adora bebericar umas xícaras junto às tragadas. “O risco, portanto, vem do cigarro”, tranquiliza Pinto. Há pouco, a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer fez um pente fino sobre o papel da bebida favorita do brasileiro na prevenção de tumores. “Nos trabalhos, houve clara redução de risco para o câncer de endométrio e fígado”, descreve o pesquisador do Inca. E não importa se ele é coado ou expresso. Até agora, os compostos antioxidantes lideram as apostas como grandes responsáveis pelo efeito anticâncer.