Comida precisa de história e não apenas de aroma e sabor
Professor reflete sobre a importância de entender a origem e o papel dos alimentos para bater de frente com a obesidade
Quando se fala em obesidade, muita gente a associa automaticamente ao grau de desenvolvimento do país — quanto mais rico ele for, mais pessoas acima do peso irá reunir. Na contramão dessa tendência encontramos o Japão. Enquanto Alemanha, França, Itália e Reino Unido possuem taxas de obesidade entre 21% e 26% da população e nós, brasileiros, ficamos com um índice de 17%, o Japão celebra apenas 3,7% de cidadãos obesos.
Para entendermos o sucesso dos japoneses no combate à doença de maior impacto na segurança social em todo o planeta, devemos destacar alguns pontos. Um deles é o envolvimento com todo o ritual de consumo do alimento desde a infância. Nas escolas, as crianças participam da preparação do ambiente onde a comida será ingerida, da escolha dos alimentos nas refeições e ganham conhecimento de toda a cadeia produtiva desde a origem do ingrediente até o seu consumo.
Essa questão é mais relevante do que se imagina. Em países como a França, por exemplo, batata frita recebe o nome de “frites”. Recentemente, o governo francês detectou nas escolas que as crianças não identificam que as “frites” correspondem a batata. Ocorre, assim, uma dissociação do alimento final com a sua origem agrícola.
Conhecer o alimento e sua forma de preparo cria conexão da criança com a comida e pesa em suas escolhas à mesa ao longo de todas as fases da vida. Na prática, o alimento passa a ter história e não apenas aroma e sabor.
Nos dias de hoje, em meio a ondas de proibições alimentares alegando psedomalignidades, a história dos alimentos e suas verdadeiras propriedades podem fazer a diferença na hora das refeições. As crianças japonesas do nosso exemplo estabelecem uma relação com a comida, ritualizam a refeição e compartilham aprendizados e alimentos. Repare que pratos clássicos da culinária asiática como gyosa, yakisoba e harumaki são ricos em glúten e amplamente consumidos pelos mais jovens, que ainda assim são magros.
Todos esses aspectos são conhecidos há tempos, mas a evolução (se é que podemos chamar de evolução) tirou o tempo e o foco da mesa e fez com que os amigos reais fossem substituídos por virtuais — já falamos disso por aqui.
Me lembro da minha avó fazendo a lasanha dos domingos. Ela preparava a massa com a farinha, abria na máquina manual, estendia em um varal… Até acomodar as camadas de massa, muçarela e molho de tomate na tigela e levá-la ao forno…
Voltar a cuidar da refeição atribuindo aos alimentos história, e não apenas calorias, carboidratos, proteínas e gorduras, é um caminho possível, de baixo custo e comprovadamente eficiente para combater a obesidade.