Nunca se falou tanto de tratamento para obesidade no Brasil. Menos no SUS
Nosso colunista reflete sobre o combate a essa doença no sistema público de saúde
Dados mais recentes do Vigitel (sigla para Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico) apontam que temos cerca de 22% dos adultos com obesidade no Brasil, e cerca de 57% de pessoas acima do peso adequado para a altura.
Como outras doenças crônicas, seu tratamento deve ser crônico (obviamente) e, muitas vezes, multifatorial – ou seja, várias ações são necessárias para controlar o quadro.
Estamos falando de atividade física regular, alimentação saudável (mas atenção: tem que ser individualizada, levando em conta o perfil de cada pessoa), uso de medicamentos e, se necessária, terapia cirúrgica.
É bem estabelecido que a adoção de hábitos de vida saudáveis é a base da pirâmide do tratamento. E, assim como acontece ao combatermos a pressão alta, o diabetes ou o colesterol alterado, o tratamento com medicamentos é a regra – e não a exceção.
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Um breve histórico sobre o tratamento da obesidade
Em um passado não muito distante, alguns tratamentos medicamentosos mostravam-se pouco eficazes, e até apresentavam um grande risco de efeitos colaterais.
Com isso, na novela dos medicamentos antiobesidade, vimos de tudo. Houve suspensão de terapias após elas serem lançadas no mercado por causa dos efeitos colaterais que não tinham sido percebidos nos estudos clínicos; algumas terapias permanecem após ameaças de retirada do mercado quando estudos mostraram maior risco de doenças cardiovasculares; houve judicialização da farmacovigilância em torno de tratamentos antiobesidade…
Além disso, há até rumores de preconceito por parte de alguns cientistas sobre a importância (ou não) de estudos para tratamento da obesidade.
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De qualquer forma, temos, no Brasil, a aprovação para uso de algumas substâncias: sibutramina, orlistate, uma combinação fixa de bupropiona e naltrexona no mesmo comprimido, além da liraglutida (esta, injetável e de aplicação diária) e semaglutida.
No caso da semaglutida, cabe ponderar o seguinte: embora ela tenha sido aprovada no Brasil recentemente, ainda não é comercializada na dose indicada para a obesidade. Há uma espera pela deliberação do preço.
Em paralelo, há a cirurgia bariátrica. Trata-se de uma opção de certa forma agressiva, mas necessária para muitas pessoas que não responderam ao tratamento clínico.
A verdade é que a cirurgia está longe de ser uma saída para os milhões de brasileiros acima do peso, mas é uma excelente estratégia quando indicada adequadamente e bem realizada.
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Liraglutida em foco
A liraglutida, mencionada acima, é um medicamento injetável subcutâneo e de administração diária.
A substância faz parte da classe dos medicamentos chamados de agonistas do receptor GLP-1.
Eles foram originalmente lançados para o tratamento coadjuvante de pessoas com diabetes tipo 2. Mas, como sempre acontece na ciência, uma guinada ocorreu nos estudos clínicos: viu-se que eles são eficazes e seguros para tratamento da obesidade, mesmo em pessoas sem diabetes.
Vários artistas, influenciadores e até mesmo multibilionários endossaram a utilização dessa classe de medicamentos para perda de peso.
Vale destacar que, hoje, esses remédios ainda se mostram capazes de prevenir o diabetes em quem não possui essa condição e são capazes de reduzir os riscos de problemas como infarto, derrame cerebral e até morte de causa cardíaca.
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A realidade do sistema público é outra
Mas, no Brasil, há sempre uma lacuna: o SUS. Temos a disponibilidade (mas não em todos os lugares) de profissionais de saúde para auxiliar na perda de peso, com indicação de exercícios e alimentação saudável.
Temos também a disponibilidade (mas não em todos os lugares) de cirurgiões bariátricos.
Mas falta um ponto até hoje em aberto: a oferta gratuita de medicamentos antiobesidade.
De fato, ainda não tivemos uma política pública contra obesidade como vimos no combate ao tabagismo, no tratamento e na prevenção da AIDS, no tratamento da tuberculose, no controle da hanseníase, etc.
Mas uma luz aparece no fim do túnel. Até o dia 31 de maio está acontecendo uma consulta pública para avaliar a inclusão do medicamento liraglutida 3 mg diário subcutâneo para o tratamento de pessoas com IMC a partir de 35 Kg/m2 com pré-diabetes e com alto risco de desenvolver doenças cardiovasculares.
Seria sensacional se boa parte da sociedade pudesse participar desta consulta. Basta clicar aqui e preencher o formulário. É simples e fácil.
É um pequeno passo que poderá mudar o rumo da pandemia de obesidade que vivemos há anos.
E, freando essa situação, poderemos atingir várias outras pandemias silenciosas que ocorrem em paralelo, como a de diabetes, pressão alta, infarto, derrame cerebral e por aí vai – todas ligadas à obesidade.
Certamente, muitas cirurgias bariátricas nem precisarão acontecer.