Flúor no abastecimento público de água não faz mal e previne cáries
Explicamos como funciona essa substância na proteção dos dentes para desconstruir mitos sobre as propriedades do flúor e sua ação no organismo
Cáries sem tratamento causam dor e até a perda dos dentes. Essa já foi uma questão grave no Brasil. Entre as ferramentas para evitá-la está o uso do flúor, normalmente presente em cremes dentais e outros itens odontológicos.
Só que nem todo o mundo tem acesso a produtos de higiene bucal. Por isso, a substância começou a ser colocada nas águas de abastecimento das grandes cidades. O método fez cair casos de cáries em 65%, segundo a Fundação Nacional de Saúde (Funasa).
O flúor é um mineral encontrado na natureza e tem uma ação benéfica aos dentes. Funciona assim: quando bactérias que vivem na boca entram em contato com o açúcar que ingerimos, cria-se um processo de fermentação que corrói os dentes. O termo técnico, na verdade, é desmineralização.
“O flúor estimula a remineralização. Ou seja, ele interrompe o processo de perda estrutural dos dentes”, esclarece o cirurgião-dentista Marco Antonio Manfredini, do Conselho Regional de Odontologia de São Paulo (CROSP). Tanto que dentistas aplicam flúor no consultório em lesões iniciais de cárie para impedir que ela se agrave.
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Desde os anos 1950, quando a medida foi adotada no Brasil, os dentes da população só melhoraram. Há um estudo, o SB Brasil – Pesquisa Nacional de Saúde Bucal, que faz essa avaliação a cada dez anos. Tomando como medida as crianças de 12 anos, é possível ver a mudança de diagnóstico.
“Em 1986, essa faixa etária tinha uma média de sete dentes cariados na boca. O levantamento mais recente, de 2010, chegou a uma média de duas cáries”, pontua Manfredini.
O método é recomendado, ainda, pela Organização Mundial de Saúde (OMS). “Outro órgão, o CDC dos Estados Unidos, listou as dez medidas mais importantes para a saúde pública, e a fluoretação das águas foi uma delas”, lembra o odontologista.
Movimentos anti-flúor
Apesar desses dados, existem grupos originados nos Estados Unidos que tentam condenar o flúor. E as justificativas são variadas. Há quem afirme que a substância seria poluente e até quem diga que ela faria cair o QI (quociente de inteligência) de crianças. Essas alegações são falsas.
O flúor é utilizado há, pelo menos, 70 anos pelo mundo. Os resultados para a saúde bucal das populações já estão consolidados e a segurança também foi atestada. “Cortar esse benefício é penalizar os grupos mais vulneráveis, que não têm condições econômicas de visitar regularmente o dentista, nem de comprar escovas e cremes dentais. A presença do flúor na água garante a prevenção de cáries nessas pessoas”, defende Manfredini.
O que acontece: qualquer substância consumida em exagero pode ser prejudicial à saúde – daí porque se monitora os índices de flúor nas águas periodicamente. Em excesso, ele promove a fluorose dentária. São pequenas manchas nos dentes que não impactam sua integridade, nem causam dor. Há vários graus do quadro: alguns são praticamente imperceptíveis, enquanto outros prejudicam a estética.
“Esse problema ocorre com mais frequência em crianças menores de 6 anos”, explica o cirurgião-dentista. Para evitar isso, esse público precisa escovar o dente com o creme dental adequado, na quantidade ideal. “Só um grãozinho de feijão colocado na transversal da escova já da conta do recado”, calcula Manfredini.
Hipoteticamente, o consumo exagerado de flúor também afetaria os órgãos gastrointestinais. Mas aí a ingestão deveria ser absolutamente elevada. “E a intoxicação ocorreria em longo prazo”, esclarece Angela Raimondi, professora de química da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). Isso significa anos. Ou seja, caso a dose de flúor na água esteja um pouco acima do recomendado, as autoridades são capazes de mexer isso em tempo de evitar quaisquer danos.
Além disso, o corpo se defende desse excesso. “Apenas 10% do flúor é absorvido e vai para os órgãos, dentes e ossos. O restante é eliminado por fezes, urina e suor. Consumimos o flúor em sua forma iônica (fluoreto), que dissolve em água. Ao competir com outras substâncias mais revelantes do organismo, ele perde e é eliminado”, afirma Angela.
Não há como o flúor afetar o cérebro ou outras capacidades do organismo. Isso é fake news.
Nem todo mundo tem flúor no Brasil
A preocupação dos especialistas por aqui é a falta de acesso à água fluoretada. Apesar de o custo do processo ser baixo (cerca de R$ 1 por habitante), nem toda cidade tem o serviço.
Um estudo que analisou dados de 2010 a 2015 aponta que, em média, apenas 60% dos brasileiros recebem a água com flúor em suas casas. Esse número está concentrado nas cidades com mais de 50 mil habitantes e nas regiões Sul (80,5%) e Sudeste (66,4%). O levantamento foi organizado pelos professores Paulo Frazão e Paulo Capel Narvai, da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo. No Nordeste (14,8%) e Norte (0%), há falta de fluoretação e também de vigilância desse serviço.
A conclusão: quem mais precisa da água fluoretada tem dificuldade de acesso a ela.
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O Centro Colaborador do Ministério da Saúde em Vigilância da Saúde Bucal (CECOL) oferece buscas no site e promete disponibilizar a situação da fluoretação da água em cada município.
Números
- O padrão máximo de flúor permitido nas águas, seguindo portaria do Ministério da Saúde, é de 1,5 miligramas por litro
- Mas a fluoretação não precisa chegar perto desse limite máximo para trazer benefícios. A Sabesp, companhia responsável pelo abastecimento de água em São Paulo, por exemplo, adota uma média entre 0,6 a 0,8 miligramas por cada litro.