A dor crônica também é um convite à mudança
Especialista reflete sobre a necessidade de tomar a dianteira sobre a própria dor e planejar mudanças de ordem física e emocional na rotina para controlá-la
Quando você veste um calçado que incomoda e dói, o que faz? Quando só percebe que dói algumas horas depois de usá-lo, qual sua atitude? Provavelmente tira ou troca, se possível. Caso a situação não permita, vai se adaptando: fica sentado, modifica o modo de pisar, coloca um curativo, ou seja, você faz alguma mudança para obter alívio. Isso quer dizer que a dor é um alerta, um sinal de que algo não está legal.
Vamos a outro cenário: em casa, você joga o corpinho no sofá e assiste ao seu programa favorito na TV. Logo bate aquela fome, você levanta e o pescoço dói. Alonga, coloca a mão ali e pensa: “Nossa, deitei de mau jeito!” e, da próxima vez, faz exatamente a mesma coisa. Por que você não ouviu o alerta do corpo? Se identificou?
Sim, deveríamos agradecer a esses sinais que nos pedem para tomar uma atitude. Inclusive porque, às vezes, se não fizermos nada, a dor aguda pode se perpetuar e mudar de nome, virando dor crônica. Segundo a Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor (Sbed), a dor crônica é uma sensação desagradável física e emocionalmente, com uma lesão real ou potencial.
Agora eu pergunto: quando você sofre com uma sensação desagradável recorrente, quais são as mudanças que faz para mudar as coisas? Vamos refletir juntos. E pegue um caderno, ou o celular, e anote as respostas que vierem à mente.
Como você lida com o que te incomoda? Demora a perceber que está sofrendo, ou é rapidinho? O que te motiva a mudar? Quais são as suas estratégias, seus recursos e suas habilidades para tomar as rédeas da situação? Quais são suas características mais fortes que podem ajudar nesse momento de dor? Anotou?
A dor é de quem sente e o alívio também é! O que significa isso? Significa que temos responsabilidade física e emocional sobre nossa sensação de dor. Mas, veja bem, não é culpa, não somos culpados pela nossa dor. É, na verdade, responsabilidade: cabe a nós encontrar alívio, num percurso que pode (e deve) contar com apoio profissional.
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Como assumir o protagonismo da sua melhora?
1. Entendendo sobre o assunto, buscando informação de confiança sobre a dor e as possibilidades de tratamento.
2. Mensurando sua dor. Onde ela aparece? Quando? O que a piora? O que melhora? Chamamos isso de “descritores da dor”.
3. Cuidando dos seus pensamentos e das suas atitudes. O que você pensa influencia diretamente na percepção da dor. Reflita: você tem mais pensamentos pessimistas e vive reclamando ou esperando que os outros façam algo por você? Ou tem uma visão mais realista e parte para a ação? Você aposta em uma única solução para o problema? Tem pedido ajuda?
4. Percebendo que a dor é física mas também emocional, então é indispensável zelar pela saúde mental.
5. Traçando metas realistas. Duas delas que interferem no controle da dor: regular o sono, com horários definidos para deitar e levantar, e caminhar pelo menos 10 minutos três vezes por semana, aumentando gradativamente.
6. Buscando a ajuda de profissionais especialistas em dor. O acolhimento e o conhecimento técnico fazem a diferença.
7. Sendo paciente com você: se a sensação de dor oscila, você também irá oscilar. E está tudo bem. Sabendo disso, você se responsabiliza mais pelas mudanças diárias.
8. Fazendo o seu melhor, lembrando que um dia ou outro você pode oscilar, e não tem problema.
Para adquirir novos hábitos, é preciso, em primeiro lugar, querer mudar. Genuinamente estar aberto. Ter paciência consigo, flexibilidade, calma e perseverança. Pense com carinho a respeito: reflita sobre o que é mutável e o que é fixo. Sobre rigidez e fluidez. Tente modificar o que te atrapalha e valorize o que já te ajuda. Seja mais criativo e menos dolorido.
No seu ritmo, no seu tempo, do jeito que for melhor para você, as mudanças vão tomando corpo e conta do sofrimento… E a dor, por fim, irá silenciar e você tomará as rédeas do seu alívio.
* Mariana Schamas é cinesiologista, pós-graduada em estudo da dor e criadora do método ECAD