Entenda a relação entre saúde mental e doenças autoimunes
Psiquiatra analisa como estresse e outras questões podem impactar evolução de doenças autoimunes, que prejudicam articulações e causam dor crônica
Pouco se sabe sobre as causas de doenças reumáticas, mas há um consenso entre os médicos e pesquisadores de que o estresse pode ser um gatilho para o aparecimento dos sintomas em pessoas que já são geneticamente predispostas.
Não raro, aqueles que convivem com males como lúpus, artrite reumatoide e fibromialgia também lidam com quadros de depressão e ansiedade.
“Tratar a pessoa com problemas reumáticos adequadamente é muito importante do ponto de vista psiquiátrico”, afirma Murilo Ferreira Caetano, psiquiatra e professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Goiás (UFG).
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O especialista esteve presente no 40º Congresso Brasileiro de Reumatologia para discutir a interseção entre saúde física e mental. À VEJA SAÚDE, ele fala sobre a importância da saúde mental no controle destas condições.
VEJA SAÚDE: Como a saúde mental afeta e é afetada por condições reumáticas?
Murilo Caetano: Qualquer situação de estresse crônica pode provocar modificações neurobiológicas.
Isso porque, quando o organismo se sente ameaçado, ele produz altos níveis de cortisol [popularmente conhecido como “hormônio do estresse”] a fim de se preparar para enfrentar a adversidade.
Em quantidades adequadas, esse hormônio tem efeito anti-inflamatório. Mas, quando é liberado em excesso, ele pode contribuir justamente para o contrário: torna o indivíduo mais susceptível a inflamações.
Então, ao passar por uma fase de muito estresse, podemos literalmente nos inflamar. E essa atividade inflamatória aumentada contribui para o desenvolvimento de uma série de condições reumáticas.
Da mesma forma, estas doenças também aumentam o nosso estresse, elevando o risco de desenvolvimento de quadros depressivos e ansiosos.
Quais doenças estão mais fortemente associadas a condições psiquiátricas?
A maioria dos estudos publicados são sobre a saúde mental de pacientes com lúpus, artrite reumatoide, espondilite anquilosante e fibromialgia.
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Não há tantas informações sobre doenças mais raras. Mas, quanto mais sistêmica for a condição (ou seja, quanto mais partes do corpo ela afetar), maior será a probabilidade da pessoa que a tem conviver com problemas neuropsiquiátricos.
Quais sintomas psiquiátricos estão mais associados a doenças reumáticas?
Os mais comuns são os sintomas depressivos e ansiosos, além de fadiga e insônia.
A psicose também pode aparecer em algumas doenças, como o lúpus, podendo acometer até 10% dos portadores.
Essas queixas têm relação com o risco de suicídio?
Sim. Além da depressão, dores intratáveis e crônicas também são um fator de risco para o suicídio — uma das principais causas de morte no mundo, especialmente entre jovens.
Por isso, tratar a pessoa com problemas reumáticos adequadamente é muito importante do ponto de vista psiquiátrico.
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É preciso envolver os familiares e amigos nesse tratamento, contribuindo para uma melhor integração social do indivíduo, que muitas vezes pode se sentir isolado pela doença.
Melhorar a qualidade de vida é fundamental para que nós, profissionais da saúde, possamos fazer o que fazemos: salvar vidas.
E como as pessoas podem lidar melhor com suas doenças — tanto no manejo dos sintomas como na aceitação das condições?
Não há um caminho simples e fácil que valha para todos, porque cada pessoa carrega uma bagagem própria da sua vida.
Às vezes, a mãe ou o pai sofreram muito com uma determinada doença e, quando o indivíduo adoece da mesma enfermidade, já há toda uma carga emocional que pode influenciar na forma como ele vai enfrentá-la.
Então, temos que conhecer bem o nosso paciente, antes de tudo. A partir da história de vida e das dificuldades que ele tem no presente, conseguimos direcionar cada um para uma melhora da saúde mental.
Quais medidas podem ajudar a tratar a saúde física e mental dessas pessoas?
Estimular o sono de qualidade, praticar exercícios físicos, formar vínculos, exercer a espiritualidade individual… É importante cuidar de si.
Existem algumas condições específicas em que os cuidados medicamentosos psiquiátricos se fazem totalmente necessários. Para isso, é preciso que a pessoa seja corretamente encaminhada para o tratamento.
Rever laços, rotina e propósitos para viver acaba sendo uma experiência transformadora.