Pesquisa mapeia os impactos da esclerose múltipla
Um estudo inédito com 1724 pessoas portadoras da condição descortina as repercussões físicas, psicológicas e sociais do convívio com a doença
Dar voz ao paciente para descobrir o que pode ser feito para melhorar sua qualidade de vida: é assim que podemos resumir o objetivo do estudo As Múltiplas Faces da Esclerose Múltipla, realizado pela revista SAÚDE e pela área de Inteligência de Mercado do Grupo Abril, com o apoio da farmacêutica Biogen e a parceria da AME – Amigos Múltiplos pela Esclerose. Recrutando brasileiros com a condição pelas redes sociais, a pesquisa entrevistou 1 724 paciente com esclerose múltipla, o que representa algo em torno de 10% dos portadores em tratamento no país.
O projeto investigou, com base em questionários respondidos pela internet, os efeitos físicos, psicológicos e sociais, bem como a relação com o médico, os remédios e a infraestrutura de assistência à saúde. Evidencia pontos positivos e avanços, sem deixar de apontar lacunas e desafios para aperfeiçoar as condutas que levam a um melhor convívio com a esclerose múltipla. O estudo ajuda a identificar e quantificar percepções, comportamentos e dificuldades individuais presentes no dia a dia de quem tem a doença, considerada o problema de saúde que mais atinge adultos jovens no mundo.
“Ao compreender que cada pessoa convive de forma muito particular com a esclerose múltipla, temos como uma de nossas prioridades a urgência na busca pelo diagnóstico precoce e por um tratamento individualizado, o que aumenta as chances de que essas pessoas possam se manter produtivas mesmo convivendo com deficiências não aparentes”, analisa Paula Prado Kfouri, diretora da AME.
Entre os aprendizados gerados pela pesquisa, está o de que a consulta em que o paciente recebe o diagnóstico e as primeiras orientações influencia significativamente toda a sua futura postura diante da doença e do tratamento. Quando o médico acolhe o paciente e lhe dá explicações claras, o portador de esclerose múltipla desenvolve uma visão mais positiva dos seus desafios e do plano terapêutico, o que tende a se refletir em uma melhor adesão e controle do quadro.
“Outro dado importante é que, apesar de todas as dificuldades encontradas na atenção à saúde, os pacientes possuem uma boa relação com o médico e acesso aos medicamentos”, observa o neurologista Douglas Sato, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Praticamente oito em cada dez entrevistados disseram que não mudariam nada nas consultas com os profissionais.
Segundo o levantamento, os sintomas físicos são os que mais atrapalham a busca pelo bem-estar. E o destaque absoluto nesse sentido é a fadiga: 91% dos participantes relataram conviver com a sensação de cansaço extremo. Além disso, ela é a manifestação da doença sentida com maior intensidade.
“Queixas como fadiga, alterações motoras, ansiedade e depressão foram muito frequentes na pesquisa, sendo que esses sintomas possuem impacto social e na qualidade de vida dos pacientes”, nota Sato. “Esse achado reforça a necessidade de termos centros especializados com uma visão global do cuidado, o que inclui equipes multiprofissionais para dar suporte médico, psicológico, fisioterápico e de enfermagem”, completa o neurologista.
O abalo na autoestima, o isolamento social e a sensação de medo, comum tanto no diagnóstico como nos momentos dos surtos do problema, revelam, ainda, uma carência por atenção psicológica ainda não preenchida no cotidiano.
O apoio da família e dos amigos é tido como principal fator de sustentação da qualidade de vida — seguido pela espiritualidade ou religião. Fortificar os laços sociais e trazê-los para o ambiente do cuidado com a saúde parece ser uma via inclusive para incentivar a adesão às orientações médicas. Nesse quesito, o estudo descobriu que 73% dos pacientes admitem não seguir todas as recomendações dadas em consultório. Os entrevistados apontaram como as principais dificuldades associadas ao tratamento os efeitos colaterais das medicações e a aplicação das versões injetáveis.
Em que pesem as limitações impostas pela esclerose múltipla, a pesquisa Múltiplas Faces indica que a maior parte dos pacientes passou a cuidar mais de si, incorporando hábitos bem-vindos ao organismo, após o diagnóstico. E, sim, apesar dos desafios, o otimismo em relação ao amanhã está presente na vida desses homens e mulheres que encaram o que muitos deles classificam como uma “luta diária”.