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Mutações do novo coronavírus podem deixar a Covid-19 mais leve?

Foi encontrado um subtipo do Sars-CoV-2 com uma mutação que causaria sintomas menos graves. Veja como alterações genéticas podem interferir na pandemia

Por Chloé Pinheiro
Atualizado em 12 mar 2021, 12h25 - Publicado em 22 set 2020, 14h58
mutação do coronavirus causa sintomas leves?
Mutações no Sars-CoV-2 podem interferir na sua agressividade e na capacidade de transmissão. (Ilustração: Thiago Almeida/SAÚDE é Vital)
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Pesquisadores identificaram em Singapura uma mutação do Sars-CoV-2 que parece desencadear um quadro de Covid-19 mais leve. O estudo, publicado no periódico The Lancet, é o primeiro a relacionar alterações genéticas do novo coronavírus com um possível “enfraquecimento” dos sintomas. Mas ele deve ser interpretado com cautela.

Mutações nos genes podem ocorrer a todo momento nos vírus, de maneira aleatória e com efeitos mais ou menos drásticos em sua agressividade e capacidade de transmissão. Portanto, é possível que tais mudanças tornem um agente infeccioso qualquer mais brando — o que tende a representar uma vantagem evolutiva. Por quê?

“Em geral, os vírus mais letais não conseguem se disseminar tanto porque matam seus hospedeiros antes de contaminar outras pessoas”, explica Rafael Resque, doutor em genética e biologia molecular e professor da Universidade Federal do Amapá.

A própria família dos coronavírus, do qual o Sars-CoV-2 faz parte, é um exemplo disso. As linhagens de coronavírus que causam resfriados leves e diarreia circulam há décadas e são bem comuns na população. Já as versões mais agressivas (Sars e Mers) sumiram depois de epidemias curtas, porém com alta mortalidade.

No entanto, também é possível que vírus específicos sofram menos mutações e, ainda que perigosos, continuem infectando bastante gente. O sarampo é um exemplo clássico.

No caso do novo coronavírus, ainda não dá para saber o que acontecerá. “Até é possível que ocorra um enfraquecimento daqui alguns anos, mas os dados atuais não indicam que ele está ficando mais bonzinho”, destaca Raquel Stucchi, infectologista da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em São Paulo.

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E atenção: mesmo se versões do Sars-CoV-2 menos agressivas começarem a se espalhar, vai demorar muito tempo até que os subtipos mais mortais se tornem raros. Em outras palavras, não dá para aguardar isso acontecer como forma de controle da pandemia.

O caso de Singapura

Entre janeiro e fevereiro, pesquisadores do país asiático identificaram uma variedade do Sars-CoV-2 que havia sofrido uma deleção. Isto é, uma das partes do seu código genético foi eliminada no processo de replicação do vírus. Eles passaram, então, a investigar qual seria o impacto dessa modificação no curso da doença.

O grupo utilizou dados de 131 infectados com Covid-19. A maioria (70%) tinha o vírus selvagem, ou “normal”. Outros 22% haviam contraído o novo subtipo, enquanto 8% carregavam uma versão híbrida entre os dois.

Resultado: nos indivíduos que ficaram doentes, cerca de um quarto dos acometidos pelo Sars-CoV-2 “tradicional” apresentaram alto grau de inflamação e precisaram receber suporte de oxigênio. Já entre os portadores do vírus mutante, só casos leves foram registrados.

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Os pesquisadores aventam que a região deletada do código genético desse subtipo do novo coronavírus estaria envolvida na sua capacidade de estimular uma liberação exagerada de citocinas pró-inflamatórias pelo corpo dos pacientes. E, quanto menos inflamação, menor o risco de complicações.

Limitações do estudo que avaliou a nova mutação

Pesquisas futuras devem responder qual o real impacto dessa e de outras variantes genéticas se disseminarem pelo planeta. O mero fato de um subtipo do Sars-CoV-2 ser potencialmente menos agressivo não é garantia de um espalhamento global.

Tanto que, embora tenha circulado com sucesso no início do ano, esse subtipo identificado em Singapura não foi mais encontrado desde março. “Pode ser que ele não tenha capacidade de sobreviver ou que apresente menor habilidade de infectar células e se replicar”, comenta Raquel.

Várias características estruturais de um vírus influenciam em sua capacidade de sobrevivência e multiplicação. A habilidade de coexistir com o hospedeiro é uma, porém não a única.

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Mutações estariam reduzindo significativamente o ritmo de novas mortes por Covid-19?

É pouco provável. “Como vemos na segunda onda que acomete a Europa, as internações seguem aumentando, o que significa que estamos diante de casos graves”, destaca Raquel. Para essa expert da Unicamp, a diferença é que, agora, os profissionais estão mais acostumados com o manejo da doença — e isso, sim, ajudaria na queda de óbitos em alguns locais.

Outro fator que influencia positivamente é a desobstrução do sistema de saúde. “No Amapá, na época de superlotação, pessoas morreram sem atendimento”, lamenta Resque.

O outro lado da história

Mutações no novo coronavírus, em teoria, podem afetar o desenvolvimento de uma vacina. E, se essas alterações genéticas forem frequentes, eventualmente exigiriam atualizações anuais na formulação dos imunizantes — é o que ocorre com a gripe, por exemplo.

No entanto, o principal alvo das vacinas em desenvolvimento é a proteína S do Sars-CoV-2, que é usada para invadir as células humanas. E, até o momento, ela permanece praticamente inalterada.

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Outro fator a se considerar é a possibilidade de que as mutações acabem favorecendo uma segunda infecção, o que já foi demonstrado no caso da Covid-19. “A presença de variantes indica que podemos ter reinfecções com mais facilidade. Isso só reforça a necessidade de manter o distanciamento social e de usar máscaras até termos todas essas respostas, além de uma vacina segura e eficaz”, conclui Raquel.

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