Quem recebe o diagnóstico de depressão, ansiedade ou outros transtornos da saúde mental precisa redobrar os cuidados com o intestino. A síndrome do intestino irritável (SII) é uma condição diagnosticada com frequência entre esses pacientes, e embora a causa exata ainda não tenha sido desvendada, os especialistas estão certos de que o emocional tem parte da culpa.
Desde o lançamento do livro O Segundo Cérebro, do médico norte-americano Michael Gershon, em 1998, crescem as evidências – tanto nos consultórios quanto nas pesquisas – de que há uma conexão entre o cérebro e o intestino.
Estudo publicado no fim de 2021 no periódico científico Nature Genetics analisou os dados genômicos de 53,4 mil pessoas com SII e de 433,2 mil indivíduos sem o diagnóstico, e descobriu seis genes que aumentam a suscetibilidade à doença. Desses, quatro também estão associados a transtornos de humor e ansiedade.
Outro ponto em comum é a ação do hormônio serotonina. Além de ser responsável pela sensação de bem-estar, o neurotransmissor é parte importante na regulação da motilidade (movimentação) do intestino, e boa parte é produzido pelas células enterocromafins do órgão, de acordo com Carlos Walter Sobrado, membro titular e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Coloproctologia e professor do departamento de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da USP.
“Há algumas situações em que você vê a depressão [no paciente] e depois vê a síndrome do intestino irritável. Algumas pessoas não se preocupam tanto com os transtornos psicológicos, mas procuram o médico quando há os sintomas intestinais e, então, se deparam com os problemas emocionais”, relata o especialista, que orienta aos indivíduos diagnosticados com transtornos mentais a prestarem atenção aos sintomas intestinais ou buscarem auxílio médico para orientações preventivas.
O que é a síndrome do intestino irritável?
A definição da SII, segundo Joaquim Prado Pinto de Moraes Filho, diretor da Federação Brasileira de Gastroenterologia, é de uma doença “funcional digestiva”.
“Não há nenhuma alteração anatômica ou morfológica. É a função que não está indo bem. O cérebro se comunica com o intestino o tempo todo, e de uma forma muito harmoniosa. Mas, em algumas circunstâncias, essa conexão falha”, explica o médico, que também é professor associado de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da USP.
Dos sintomas mais associados à SII, estão:
• Desconforto e dor abdominal;
• Barriga inchada;
• Cólica frequente;
• Produção exagerada de gases;
• Alternância na frequência evacuatória (períodos de diarreia seguidos de prisão de ventre);
• Alteração no aspecto das fezes;
• Sensação de evacuação incompleta.
Para confirmar o diagnóstico, os pacientes devem relatar os sintomas por pelo menos 12 semanas consecutivas. “Às vezes a pessoa come alguma coisa diferente, ou está em uma semana mais estressante, e o intestino fica desregulado, mas depois volta ao normal. Então, não é intestino irritável”, explica Sobrado.
“É importante também que o médico, além de afastar as outras doenças do intestino, também exclua a intolerância à lactose e ao glúten. Às vezes o paciente vem ao consultório, cita os alimentos que causam mais sintomas e, ao pedir os testes, identificamos a intolerância”, destaca.
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Caso a pessoa apresente os sintomas e tenha lesões na estrutura do órgão, o diagnóstico muda. “Se houver alteração estrutural, pode ser a doença diverticular, neoplasia ou tumor do intestino, retocolite ou doença de Crohn. Precisamos afastar essas doenças para dizer que se trata da SII”, reforça.
Para a confirmação, podem ser necessários exames laboratoriais e de imagem, como colonoscopia ou, eventualmente, tomografia.
Fatores de risco
A prevalência da condição, de acordo com Moraes Filho, varia entre 10% a 15%, e é mais comum em mulheres entre os 30 e 50 anos.
“Isso não quer dizer que a pessoa com 24 ou 56 não possa ter a síndrome, mas o predomínio é nessa faixa etária. A prevalência cai depois dos 60 anos, e o motivo é difícil de interpretar, mas o aspecto psicoemocional e a vivência da pessoa mais velha são diferentes, bem como a sensibilidade [do intestino]”, explica o especialista.
Tratamentos
Embora não tenha cura, a condição pode ser controlada com medicamentos (que vão atuar nos sintomas mais agudos) e com mudanças na alimentação, inclusão de exercícios físicos e melhora no controle do estresse.
Evitar alimentos mais gordurosos, como as frituras, além de café, chocolate e bebidas alcoólicas são essenciais, especialmente porque esses itens aumentam a produção de gases.
Além de remédios contra a dor, podem ser indicados o uso de fibras naturais, que hidratam as fezes e ajudam a regularizar o intestino; e dos probióticos, como o kefir.
“É fundamental ter um acompanhamento multidisciplinar do paciente com SII. Apesar das orientações e dos medicamentos, o paciente também se beneficia do cuidado psicológico e nutricional”, explica Sobrado.
Esse texto foi publicado originalmente na Agência Einstein.