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Endometriose: a doença está em crescimento ou o diagnóstico melhorou?

Médico avalia por que mais mulheres têm descoberto a doença, marcada por dores intensas e maior risco de infertilidade

Por Ricardo Pereira, cirurgião ginecológico*
28 mar 2023, 09h15
endometriose
A mudança marcante no estilo de vida da mulher tem um papel importantíssimo no aumento da incidência da doença, mas há outros fatores envolvidos.  (Foto: Shutterstock/Divulgação)
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A endometriose é uma das doenças mais antigas da humanidade. Papiros egípcios datados de 1 825 antes de Cristo já descreviam sintomas sugestivos do problema.

Hipócrates, o Pai da medicina, referia-se às dores, aos distúrbios da evacuação e da digestão durante a menstruação – e, de acordo com a teoria hipocrática da época, as mulheres evitariam a doença se engravidassem cedo e várias vezes.

Nos últimos anos, houve um aumento exponencial no interesse sobre a doença, tanto em publicações científicas médicas como em redes sociais e conversas cotidianas.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), a endometriose afeta uma em cada 10 mulheres em idade reprodutiva (15 a 49 anos). Estima-se que cerca de 190 milhões de mulheres sofrem com a doença em todo o mundo.

Mas o número pode estar subestimado, já que há dificuldade em diagnosticar a endometriose e, quando isso ocorre, há um atraso médio de oito a 10 anos.

Os sintomas e as consequências da endometriose

A doença determina um estado inflamatório crônico local com repercussões sistêmicas. Como resultado, a endometriose pode ter um impacto negativo na qualidade de vida e fertilidade das mulheres.

Os sintomas associados variam, e podem incluir:

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  • Menstruações dolorosas
  • Dor pélvica crônica
  • Dor durante o sexo
  • Movimento intestinal doloroso
  • Dor ao urinar
  • Fadiga
  • Depressão ou ansiedade
  • Distensão abdominal
  • Dor na região do estômago e náuseas, entre outros

+ Leia também: Endometriose: tratamento hormonal ou cirurgia?

A maioria desses sintomas se manifesta de forma cíclica, ou seja, durante os períodos menstrual, pré-menstrual e, em alguns casos, no período da ovulação – principalmente entre as mulheres que têm o ciclo menstrual espontâneo, sem o uso de medicação hormonal.

Alguns podem estar presentes continuamente, como a fadiga crônica. Já entre aquelas que usam medicação hormonal para controle do ciclo, os sintomas podem aparecer de forma irregular ou mascarada, sobretudo em caso de bloqueio da menstruação.

Afinal, o que é a endometriose

A doença ocorre quando o tecido chamado endométrio, que normalmente reveste internamente o útero e produz a menstruação, surge fora da cavidade uterina.

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Em aproximadamente 90% dos casos, o endométrio vai para a região pélvica e, em 10%, pode aparecer em outras partes do abdômen – ou mesmo no tórax, em situações mais raras.

Devido à ação do estrogênio e da progesterona, hormônios femininos que modulam o ciclo menstrual, naturalmente o endométrio cresce e descama em forma de pequenos sangramentos ao final de cada ciclo, se não ocorrer uma gravidez.

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Se o endométrio permanece dentro da cavidade uterina, esse sangramento origina o fluxo menstrual.

Mas, em mulheres com o endométrio localizado fora da cavidade uterina (e, portanto, com endometriose), o sangramento determina uma reação inflamatória, originando as lesões características da doença.

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Por que a endometriose está em alta?

Muitas teorias têm tentado explicar o aparente aumento de mulheres que buscam acolhimento frente ao diagnóstico de endometriose.

Mas uma complexidade enorme envolve o problema: não se conhece totalmente sua causa, e há muitas controvérsias em relação à forma de diagnosticar e tratar o quadro.

O diagnóstico por imagem mais efetivo das lesões endometrióticas (por meio de ultrassom ou da ressonância magnética) foi introduzido recentemente na medicina, no início deste século. Embora não esteja disponível para a maioria das mulheres com sintomas, pode ajudar a explicar por que temos mais casos vindo à tona.

+ Leia também: Conheça a endometriose profunda

Mas há outros aspectos importantes para levarmos em consideração, como mudanças comportamentais.

Veja: durante a gestação e a amamentação natural, ocorrem modificações hormonais no organismo feminino que acabam inibindo os sintomas e a evolução da doença.

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E, no passado, muitas mulheres não só iniciavam a maternidade mais cedo como passavam boa parte de suas vidas reprodutivas grávidas ou amamentando.

Nos dias atuais, por outro lado, as mulheres optaram por ter menos gestações, e geralmente em idade mais avançada – muitas escolheram inclusive não engravidar.

Segundo o IBGE, se nos anos 1960 a taxa de fecundidade (número de filhos por cada mulher) das brasileiras era 6,28, hoje esse índice está em torno de 1,7 – uma das mais rápidas reduções na história mundial.

Portanto, as mulheres acabam vivendo a maior parte de suas vidas na plenitude dos hormônios femininos.

E, quando são portadoras da endometriose, o estrogênio estimula o crescimento das lesões típicas da doença, aumentando as repercussões e o agravamento do problema.

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+ Leia também: Novo remédio para endometriose

Apesar dessa mudança marcante no estilo de vida da mulher ter um papel importantíssimo no aumento da incidência da doença e, também, na gravidade da condição, há múltiplos e complexos fatores determinantes no crescimento das lesões.

A humanidade viveu 20 séculos com a cultura educacional do menosprezo aos sintomas dolorosos femininos, assim como a medicina evoluiu de forma fantástica em diversas áreas, mas com uma enorme negligência no entendimento e acolhimento das mulheres portadoras de endometriose.

Por meio das conquistas femininas ocorridas nas últimas décadas e do combate ao machismo institucionalizado na nossa sociedade e na saúde, poderemos diagnosticar melhor a endometriose – e cuidar das mulheres que sofrem com uma doença que pode alterar o curso de uma vida feliz e saudável.

*Ricardo Pereira é cirurgião ginecológico e especialista em endometriose e cirurgia ginecológica minimamente Invasiva do Hospital e Maternidade Santa Joana (SP)

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