Depressão, ansiedade e outros inimigos invisíveis do coração
Psicóloga destrincha o impacto da depressão e da ansiedade no risco cardiovascular. Melhor dar mais atenção à saúde mental
A depressão, a ansiedade e a síndrome do pânico, desordens mentais muitas vezes negligenciadas entre a família e os amigos devido ao desconhecimento que ainda existe sobre essas doenças, são um problema sério e cada vez mais comum. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), hoje existem mais de 350 milhões de deprimidos em todo o planeta.
Além dos sintomas intrínsecos ao quadro — tristeza profunda, isolamento social, falta de entusiasmo com a vida… —, a depressão (e mesmo o transtorno de ansiedade e a síndrome do pânico) agrava ou se soma a fatores de risco tradicionalmente reconhecidos como causadores das doenças cardiovasculares, caso de obesidade, tabagismo, pressão elevada, colesterol alto, diabetes, sedentarismo…
Um estudo interessante sobre o tema, conduzido pelo médico Kalil Duaillib, professor titular de psiquiatria da Universidade de Santo Amaro (Unisa), foi apresentado no Congresso da Socesp (Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo) em 2017.
O trabalho deixa claro que o manejo do estresse e o tratamento da depressão — bem como da ansiedade e do pânico — contribuem para a redução da ocorrência de eventos cardiovasculares. Os riscos são concretos, uma vez que os problemas de origem mental estão associados a situações comprovadamente ameaçadoras para o coração.
Uma delas é a insônia, caracterizada pela demora excessiva para dormir, acordar com frequência durante o sono ou despertar antes do tempo adequado. Quem tem insônia e dorme por volta de seis horas por noite corre um risco 30% maior de desenvolver hipertensão no comparativo com pessoas com sono normal. Já quem tem insônia e dorme menos de cinco horas por noite enfrenta um risco 520% maior!
As pessoas com transtorno de ansiedade generalizada (TAG) apresentam, por sua vez, um risco 30% maior de ter uma doença cardiovascular.
Ao redor das dificuldades psicológicas rondam outros fatores nocivos ao sistema circulatório. No Brasil, assim como ocorre no México, vem aumentando de maneira expressiva o consumo de álcool pela população. Além disso, 1,5 milhão de brasileiros com mais de 18 anos fuma maconha todos os dias e 8,4 milhões o fazem quatro vezes por semana. Muitos desses comportamentos estão relacionados a depressão, estresse, ansiedade e síndrome do pânico.
É preciso considerar também que o indivíduo deprimido não raro abandona o tratamento de uma enfermidade e tende a ingerir álcool e outras substâncias.
Repito: depressão, ansiedade e síndrome de pânico são problemas graves. Esses inimigos aparentemente invisíveis da saúde e do coração não são simples crises de tristeza, abatimento ante um fato pontual da vida ou melindre, temperamento e capricho, como às vezes são interpretados pela sociedade. Falamos de doenças que merecem máxima atenção, apoio e tratamento médico especializado. Inclusive pelo bem do coração!
* Jennifer de França Oliveira Nogueira é diretora executiva do Departamento de Psicologia da Sociedade de Cardiologia do Estado de São Paulo (Socesp)