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Amargou para o adoçante?

Estudo revela que o tipo mais usado no mundo, a sucralose, libera compostos tóxicos quando exposto a temperaturas elevadas - como no cafezinho

Por Alexandre de Santi (colaborador)
Atualizado em 15 out 2018, 13h55 - Publicado em 27 jul 2016, 15h53
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Não é de hoje que os adoçantes artificiais dividem opiniões. Eles protagonizam com frequência a arena de debates porque, embora sejam valiosos a quem precisa reduzir drasticamente a ingestão de açúcar (caso de pessoas diabéticas ou muito acima do peso), vira e mexe surge uma história de que teriam efeitos adversos sobre o organismo. Esse receio, no entanto, parecia injustificado, já que a maioria dos produtos é aprovada pelos principais órgãos de saúde do planeta. Só que agora a discussão volta a esquentar, e por motivos que nada têm a ver com teorias da conspiração. Um experimento inédito da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) descobriu que, quando aquecido, o adoçante mais popular atualmente gera substâncias tóxicas e capazes de se acumular no corpo.

Em termos científicos, a sucralose é “quimicamente instável”, ou seja, sua composição se altera se ela é exposta a altas temperaturas. Isso acontece quando despejamos o pó ou pingamos as gotas no cafezinho e no chá ou adoçamos a mistura do bolo que vai ao forno. A pesquisa liderada pelo professor Rodrigo Ramos Catharino, da Faculdade de Farmácia da Unicamp, é a primeira a demonstrar que esse tipo de adoçante chega a liberar moléculas primas-irmãs do benzopireno, já comprovadamente cancerígena e encontrada até no cigarro. É ou não é de amargar?

O achado da equipe de Catharino é tão impactante que foi publicado em um dos periódicos da revista Nature, uma das mais prestigiadas no mundo científico. Com ele, soou o alerta: seria realmente perigoso lançar mão da sucralose em bebidas e alimentos quentes? De acordo com Catharino, as moléculas que nascem desse adoçante no momento da quentura seriam ainda mais nocivas que o benzopireno por causa do cloro, componente da fórmula que eleva seu grau de instabilidade. E há outra razão para se preocupar. Tais substratos conseguem se acumular nas reservas de gordura do corpo – assim, não seriam facilmente eliminados do organismo.

As descobertas acionam um alarme, mas pedem cautela. Como as moléculas acabam de ser reveladas, o próximo passo é investigar seus verdadeiros efeitos na saúde humana. Catharino ressalta que os testes comprovaram o perfil instável e potencialmente danoso da sucralose apenas em situações de temperaturas elevadas. “Por ora, a sugestão é não consumir o produto quando ele é aquecido”, orienta. Segundo o farmacêutico, a própria indústria deveria apurar a questão e rever seus rótulos, uma vez que alguns deles estampam que o produto pode ser aquecido e levado ao forno. “O objetivo da nossa pesquisa é tornar o uso do adoçante mais seguro”, justifica. Recorrer à sucralose em um suco, por exemplo, não traria problema algum.

É claro que ainda existem divergências e ponderações no ar. O médico Bruno Geloneze, da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem), acredita que a sucralose continua segura dentro do cafezinho porque o estudo identificou a instabilidade em temperaturas na casa dos 98 °C. “Na hora em que se coloca o líquido na xícara, mesmo que isso seja super-rápido, ele já terá esfriado um pouco”, raciocina. “Ninguém faz chá ou café colocando o adoçante na água para ferver. Se fazia, agora não pode fazer mais”, brinca o endocrinologista.

Geloneze avalia, no entanto, que devemos aceitar uma das lições do trabalho: evitar o emprego da sucralose em receitas que passam pelo forno – nessa circunstância, é alta a probabilidade de o produto sofrer aquelas transformações químicas. Aliás, para os diabéticos e sujeitos acima do peso que não querem se arriscar enquanto aguardam as novas respostas da ciência, o membro da Sbem lembra que o açúcar branco não configura uma boa alternativa. A melhor saída nesses casos continua sendo outros adoçantes não calóricos ou com baixo teor energético.

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O fato é que o experimento da Unicamp já começou a repercutir. “Muitas pessoas têm falado pra mim que pararam de usar adoçante”, relata Catharino. Mas a indústria rebate os receios e um eventual alarmismo. “Não temos nenhuma dúvida sobre a segurança para consumo da sucralose. Não podemos mudar a conduta baseados apenas em um estudo”, diz a nutricionista Elaine Moreira, consultora da Linea, uma das principais fabricantes de sucralose no país. A especialista conta que a segurança do produto está comprovada até mesmo no processo de pasteurização, que submete a comida a altas temperaturas e depois a resfria. “Mais pesquisas precisam ser feitas, inclusive sobre a interação do adoçante com outros alimentos. Devemos considerar, porém, que a quantidade de sucralose nas receitas é muito pequena”, pondera.

O vice-presidente da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos Para Fins Especiais e Congêneres, Carlos Gouvêa, ressalta que a sucralose é aprovada tanto pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) como pela Joint Expert Comission of Food Aditives, ligada à Organização Mundial da Saúde (OMS). Sobre os achados da Unicamp, Gouvêa acredita que, apesar dos resultados, o ingrediente permanece seguro. “O adoçante normalmente é adicionado à bebida e logo consumido. Não haveria tempo para que ocorresse qualquer decomposição”, afirma.

Enquanto a indústria ainda digere as informações, a Sociedade Brasileira de Diabetes (SBD) se adiantou para emitir um parecer em cima das revelações da pesquisa. Em texto assinado pela nutricionista Débora Bohnen Guimarães, a SBD recomenda o uso da sucralose em baixas temperaturas e uma “alimentação livre de aditivos”. Ainda declara que, caso seja necessário o uso de adoçantes artificiais, “estes devem ser consumidos com moderação e conforme indicado, respeitando um rodízio dos tipos de adoçantes existentes no mercado para não ocorrer grande exposição a uma só substância”.

Nessa linha, o Conselho Federal de Nutricionistas divulgou uma nota neste ano orientando os profissionais a receitarem “adoçante artificial apenas a pacientes com necessidade clínica específica”. O posicionamento saiu depois de o Instituto Nacional de Câncer (Inca) ter declarado que o consumo de adoçantes artificiais “está associado ao desenvolvimento de algumas doenças, inclusive o câncer“. Recentemente, a própria sucralose foi apontada, com alta prioridade, para passar por avaliação do Grupo Consultivo da Agência Internacional de Pesquisa em Câncer, que se debruça sobre o perfil de risco de diversos compostos.

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A polêmica em torno dos adoçantes não parece ter fim e vem inspirando mudanças inclusive nas escolhas e estratégias das empresas. No ano passado, a Pepsi abandonou o controverso aspartame de sua linha diet – no lugar dele, entrou a sucralose. O curioso é que o último documento da Autoridade Europeia de Segurança dos Alimentos considerou a substância segura. A questão é que anos de acusações (de câncer a enxaqueca) arranharam a imagem do produto. “A procura vem caindo no mundo todo. Não sei se é pela polêmica, pelo custo ou mesmo por causa do sabor”, comenta Elaine, da Linea. Em comparação, ela nota que o consumo da sucralose aumentou 25,5%, de acordo com dados da consultoria de mercado Nielsen.

Discussões à parte, não dá pra negar que os adoçantes têm um papel a cumprir quando falamos na perda de peso e no controle da glicemia. Os levantamentos mais recentes registram um aumento contínuo nos índices de obesidade e diabete – e o Brasil se encontra particularmente em situação crítica. Manter o açúcar na dieta muitas vezes não é uma opção a essa parcela da população. Daí a necessidade de estabelecer um uso inteligente dos adoçantes, respeitando indicações e peculiaridades. Outro caminho é reeducar o paladar e se adaptar a receitas menos doces, ao azedinho do suco e, por que não, ao amargo do café.

O natural é melhor?

O maior representante da classe é o estévia, que tem forte apelo com o público e é priorizado por alguns especialistas. A última cartilha sobre adoçantes da Associação Brasileira da Indústria de Alimentos para Fins Especiais e Congêneres diz, porém, que os naturais não são necessariamente melhores que os artificiais. Todos precisam passar por testes para provar perfil de segurança. O estévia não é calórico e estudos associam seu uso a menos cáries e melhor controle da pressão. “Não temos nenhum relato de alguém que consumiu o produto e passou mal”, diz Airton Goto, diretor industrial da fabricante Stevita. A desvantagem recai no preço, cerca de 50% mais caro que o da sucralose.

O sobe e desce no mercado

Como andam as vendas dos principais adoçantes, segundo dados de 2014 e 2015

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Sucralose: aumento de 25,5%

Aspartame: queda de 16,4%

Estévia: aumento de 9,1%

Sacarina/ciclamato: queda de 7,6%

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Fonte: Nielsen – Retail Index MOV JUL 2014 A JUN 2015 | Global Market Study on Stevia

Com colaboração de Paula Sperb

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