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Tempere sua rotina

Ervas e especiarias provam que diversidade é palavra-chave para montar o cardápio e testar preparos e sabores. Quem mais ganha com isso? O paladar e a saúde

Por Regina Célia Pereira
4 abr 2022, 18h51
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  • Já houve um tempo em que era preciso embarcar em caravelas e encarar oceanos para apimentar a comida. Hoje, basta esticar as mãos, alcançar a prateleira, girar o moedor e dar aquele toque picante ao prato.

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    Uma das principais razões a impulsionar as grandes navegações no início da era moderna, as especiarias atravessaram séculos como tesouros gastronômicos e, ao lado das ervas aromáticas, ganharam a fama mais recente de proteger nosso organismo. Agregam perfumes, cores, texturas e sabores a qualquer receita.

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    “Os temperos abrem a cozinha para o mundo”, afirma a chef Heloisa Bacellar, de São Paulo. Com um pouco de cúrcuma, dá para passear pela culinária indiana, o manjericão nos transporta até a Itália e a hortelã remete às Arábias.

    A exemplo dos ingredientes em si, a lista de destinos e conexões é imensa. O coentro nos conduz a preparos típicos da Tailândia e de Portugal e, de volta para o Brasil, nos leva às panelas do Nordeste e do Norte.

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    Nessas bandas, marca presença em tudo quanto é canto e entra na composição do cheiro-verde, mistura das mais brasileiras. A variedade da cozinha nacional, aliás, se reflete nesse tempero.

    + LEIA TAMBÉM: Como cultivar ervas, temperos e outras plantas em casa

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    “Em outras regiões do país, o cheiro-verde conta apenas com salsinha e cebolinha”, esclarece Tatiana Saldanha, professora do Departamento de Tecnologia de Alimentos da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ).

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    Em parceria com pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Tatiana vem esmiuçando em laboratório essa dupla tão onipresente por aqui. “Apesar da popularidade, ainda não há muitos estudos sobre o uso do cheiro-verde na culinária”, contextualiza.

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    Em um dos trabalhos recém-publicados pelo seu grupo, a professora e os colegas avaliaram os efeitos desse mix no preparo da sardinha. Quando o peixe passa pelo calor, sofre alterações químicas por trás da oxidação da sua fração gordurosa.

    Esse processo também ocorre em outros tipos de carne e gera substâncias envolvidas no aumento do risco de inflamação e outros danos nas células e nas artérias — um fenômeno ligado, por exemplo, a problemas cardiovasculares.

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    Dentro da UFRRJ, uma das etapas da pesquisa reproduziu o que se passa no cotidiano de qualquer cozinha brasileira. Após ser temperado com salsinha e cebolinha, o peixe foi para a grelha. “Observamos que as ervas minimizaram significativamente a degradação do colesterol da sardinha”, relata Tatiana.

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    O resultado vem dos compostos antioxidantes do cheiro-verde, caso dos ácidos fenólicos e dos carotenoides. São os mesmos que conferem algumas das características sensoriais tão apreciadas nesses vegetais abundantes em hortas, feiras e supermercados.

    Além de ser ótima pedida para temperar pescados, a mistura pode ser adicionada às mais variadas preparações, incluindo o arroz com feijão.

    Claro que o mundo da comida não gira só em torno do cheiro-verde. Então, se a culinária da sua casa ainda não se abriu a novas experiências e combinações, que tal imitar os antigos desbravadores? Não faltam opções e culturas a descobrir — de dentro e de fora do Brasil.

    Com um quê de sagrado, ervas e especiarias desfilam pela história envolvidas em lendas e celebrações. Entre os antigos, havia quem acreditasse que elas vinham diretamente do Jardim do Éden.

    Descendo para o mundo real, hoje se sabe que os temperos reúnem uma coleção de moléculas responsáveis pelo gosto e aroma peculiares — e ainda são capazes de resguardar o corpo humano.

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    “Algumas dessas substâncias são produzidas para preservar a própria espécie vegetal”, explica a nutricionista Camile Zanchett, da Universidade do Vale do Itajaí, em Santa Catarina. Isso significa que protegem a planta das mudanças do clima, do sol, de insetos e outras pragas. É o caso dos terpenos e dos fenólicos: muitos deles são voláteis e alcançam facilmente nosso nariz, arrebatando o cérebro e dando água na boca.

    No prato em si, esses compostos realçam o sabor da comida. Por isso, são os melhores concorrentes e substitutos do sal, cujo abuso contribui para a hipertensão.

    Um experimento recente com um grupo de idosos reforça esse papel: a conclusão é que apostar em temperos naturais é um jeito de estimular as papilas gustativas e, aos poucos, deixar o saleiro de lado.

    “Com o avançar dos anos, nossa percepção de sabor se altera”, pontua a nutricionista Lara Natacci, colunista do site de VEJA SAÚDE. Daí a sacada de recorrer a ervas e especiarias nas refeições dos mais velhos.

    Não só dessa turma, diga-se. “Muitos brasileiros consomem quase o dobro de sal do que é recomendado”, lamenta Camile.

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    + LEIA TAMBÉM: 22 erros na cozinha que afetam a sua saúde

    Pois saiba que os temperos vão além na defesa das artérias, como registra uma pesquisa da Universidade Estadual da Pensilvânia, nos Estados Unidos. Durante quatro semanas, 71 voluntários receberam um menu que incluía coentro, salsinha, pimenta, canela, alecrim e alho.

    Passando por um check-up depois, constatou-se uma redução significativa na pressão deles. “As espécies usadas nesse estudo são ricas em fitoquímicos que diminuem o risco cardiovascular”, comenta a nutricionista e fitoterapeuta Vanderlí Marchiori, de São Paulo.

    No caldeirão dos compostos bioativos, destacam-se os de ação antioxidante e anti-inflamatória, que ajudam a poupar os vasos sanguíneos de lesões, acúmulo de colesterol e placas de gordura.

    Esse mesmo efeito teria a ver, segundo algumas evidências, com outra capacidade festejada desse grupo de vegetais, a de blindar o cérebro. Parece que os antigos gregos já intuíam esse atributo: eles usavam o alecrim ao pé da orelha para melhorar a concentração.

    A chef Heloisa Bacellar costuma dizer que os temperos transformam o básico. “O pepino ganha mais frescor quando acrescentamos umas folhinhas de hortelã misturadas ao iogurte”, exemplifica. E que tal perfumar a salada de tomate com um pouco de manjericão? “São infinitas as possibilidades”, crava Helô.

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    + LEIA TAMBÉM: Conheça as plantas alimentícias não convencionais

    E muita gente já tem ampliado os horizontes dentro de casa. O engenheiro químico Nelusko Linguanotto Neto, da Bombay Food Service Alimentos, observa o crescente interesse do brasileiro por ervas e especiarias: “As pessoas estão cozinhando mais em casa, sobretudo após a pandemia”.

    Uma das alegações para não se arriscar na alquimia dos temperos é o medo de errar a mão. Para quem desconhece esse potencial universo em expansão, a nutricionista Ana Paula Gines Geraldo, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), aconselha buscar primeiro informação — sobre os ingredientes e os modos de usar.

    Não faltam boas fontes, até mesmo em redes sociais. “Lembrando que a variedade é sempre bem-vinda na alimentação”, ressalta Ana Paula. O recado é sair da mesmice e inovar até no arroz. Com uma pitada de cúrcuma, ele ganha um tom dourado e um gostinho especial.

    Lara sugere não sair abarrotando a despensa ou a geladeira — os temperos frescos estragam fácil — e incrementar as receitas aos poucos. “No começo, o ideal é não misturar muito, porque cada um desses ingredientes já tem características marcantes”, justifica a nutricionista e culinarista. Prove uma erva por vez, depois vá conjugando e transforme sua cozinha em um laboratório de testes.

    Helô aconselha comprar em poucas quantidades e não estocar por muito tempo os temperos: “Assim se garante toda a potência deles e não há risco de deterioração”.

    Uma unanimidade entre os experts é jamais cair na tentação do exagero na hora do preparo. Não se deixe seduzir com “um bocadinho mais”, como ditou Caymmi na canção Vatapá. O bom senso evita que a receita desande ou desagrade os convidados.

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    O coentro, aliás, é um caso emblemático nesse sentido. “Se há exagero, a tendência é que seu gosto se sobreponha e apague os outros elementos do prato”, conta a chef, que traz na pele o amor pela planta e há alguns anos tatuou uma folhinha no braço.

    Então façamos justiça: a culpa não é do coentro, mas do cozinheiro que errou a dose. Como temperos têm personalidade, os abusos fazem a gente enjoar e até sentir ojeriza. Além de respeitar as quantidades descritas nas receitas, o mestre-cuca que se preze deve ir experimentando e adequando ao paladar.

    Cada etapa do preparo da comida desencadeia uma porção de reações químicas que liberam moléculas e anunciam os talentos dos temperos.

    Veja a dupla perfeita do refogado, o alho e a cebola. Ambos concentram compostos sulfurosos, estudados por um efeito anticâncer. Essas substâncias ficam guardadas dentro dos vegetais, mas, quando eles são picados, a ruptura solta as frações microscópicas responsáveis pelo sabor picante.

    “Rica em carboidrato e água, a cebola tende a ficar mais adocicada”, repara Ana Paula. É pela alta concentração de líquidos que não se indica temperar o feijão com essa hortaliça — o preparo tende a deteriorar mais rápido. Como as vovós ensinam, melhor botar só alho e uma folha de louro.

    Embora grande parte das ervas e especiarias tenha o poder de conservar os alimentos, se elas não forem bem tratadas na cozinha também podem se estragar.

    “É importante tampar os vidros rapidamente após o uso para impedir que vapores invadam o recipiente e os temperos embolorem”, indica Linguanotto. E guardar depois em um local longe da luz. Vanderlí recomenda, ainda, conhecer a procedência do ingrediente e averiguar as condições da embalagem no momento da compra.

    + LEIA TAMBÉM: A conta certa de vegetais por dia para você ter mais saúde

    Zelo é tão ou mais imprescindível para quem cultiva ervas em casa. “Cuide para que elas recebam sol ao menos três horas diariamente”, orienta a herborista Sabrina Jeha, do viveiro Sabor de Fazenda, na capital paulista. Tem que prestar atenção no tipo de vaso, na adubação, na irrigação…

    “Quando houver dúvida sobre a necessidade de regar, enfie um palito de madeira comprido na terra”, dá a dica Sabrina. Se sair seco, tem que colocar água. Hortelã, cebolinha, salsa e manjericão crescem até em varanda de apartamento — e é sempre bom ter temperos frescos à mão.

    Seguindo a onda da praticidade e da saudabilidade, as indústrias têm investido nos chamados ingredientes botânicos. “Eles têm tudo a ver com ervas, especiarias e frutos, entre outros, que são inseridos em produtos diferenciados”, descreve a química Fernanda Matta, da Tradal Brazil.

    Para garantir que as qualidades dos compostos não se percam pelo caminho, novas tecnologias entram em ação, caso do microencapsulamento. Ele permite que a substância fique protegida e seja liberada de modo programado”, traduz.

    É assim que o perfume do cravo se revela no momento certo. Como lembra Fernanda, sabores e aromas resgatam memórias e despertam sensações.

    Então por que não conviver com o tradicional sem deixar de experimentar o novo? Explorar o mar de ervas e especiarias é um roteiro de primeira para enriquecer o cardápio e a sua saúde.

    DE AÇAFRÃO A URUCUM

    Trazemos uma seleção de temperos que você precisa conhecer (ou continuar usando)

    Açafrão (Crocus sativus)

    temperos
    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Alecrim (Rosmarinus officinalis)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Alho (Allium sativum)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Anis-estrelado (Illicium verum)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Canela (Cinnamomun zeylanicum)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Cardamomo (Elettaria cardamomum)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Cebola (Allium cepa)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Cebolinha (Allium schoenoprasum)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Coentro (Coriandrum sativum)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Cominho (Cuminum cyminum)

    temperos
    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Cravo (Syzygium aromaticum)

    temperos
    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Cúrcuma (Curcuma longa)

    temperos
    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Endro (Anethum graveolens)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Erva-doce (Pimpinella anisum)

    temperos
    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Funcho (Foeniculum vulgare)

    temperos
    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Gengibre (Zingiber officinale)

    temperos
    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Hortelã (Mentha sp)

    temperos
    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Louro (Laurus nobilis)

    temperos
    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Manjericão (Ocimum basilicum)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Noz-moscada (Myristica fragrans)

    tempero
    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Orégano (Origanum vulgare)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Páprica (Capsicum annuum)

    temperos
    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Pimenta-do-reino (Piper nigrum)

    temperos
    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Pimenta-rosa (Schinus terebinthifolius)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Pimenta vermelha (Capsicum)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Salsa (Petroselinum crispum)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Salsão (Apium graveolens)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Sálvia (Salvia officinalis)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Tomilho (Thymus vulgaris)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

    Urucum (Bixa orellana)

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    (Ilustrações: Rômolo D'Hipólito/SAÚDE é Vital)

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    Combinações que são a cara de alguns países

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