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Parece, mas não é: 10 comidas “fake” que invadiram os supermercados

Marcas se aproveitam da pressa da vida moderna e da alta no preço para lançar alimentos de qualidade nutricional duvidosa. Saiba evitar as pegadinhas

Por Valentina Bressan, Sílvia Lisboa, Maurício Brum, Clarice Sena e Thiago Müller (texto), Estúdio Coral (design)
Atualizado em 17 abr 2025, 15h38 - Publicado em 17 abr 2025, 14h16
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Letras pequenas nos rótulos podem enganar os consumidores  (Estúdio Coral (Design) - Getty Images (fotos)/Veja Saúde)
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A cena se tornou mais frequente nos últimos meses. Ao chegarem do supermercado, onde percorreram com pressa as prateleiras e sem paciência para checar as letrinhas das embalagens, o dono ou a dona de casa tomam um susto quando se detêm sobre as ofertas que agora guardam na despensa: o saco de café tem, na verdade, um pó sabor café; o azeite de oliva não passa de um óleo composto; e o leite condensado, quem diria, é uma mistura láctea.

Mistura essa que, a despeito da textura e do sabor parecidos, pode fazer a receita da sobremesa desandar. O consumidor pagou mais barato, mas será que não levou gato por lebre? Em outras palavras, algo sensorial e nutricionalmente inferior.

Aí está o fenômeno dos alimentos similares, que englobam esses e outros exemplos de itens que até parecem, mas não são como os originais — e nem sempre deixam isso claro.

Quanto maior a inflação no mercado, mais a indústria tende a investir nesse tipo de novidade. A ponto de depararmos com o que foi apelidado de “cafake”, um produto em pó que mal tem café e despontou com a alta de 40% no valor dos grãos.

+Leia também: O presente e o futuro do café

“A classificação desses alimentos até está correta, mas o rótulo do similar é muito semelhante ao dos outros produtos e muitas vezes eles são dispostos nas mesmas gôndolas, o que leva ao engano”, alerta a nutricionista Mariana Ribeiro, do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).

Algumas categorias, ainda bem, já têm regras a seguir. Bebidas lácteas feitas a partir do soro do leite são agora uma classe própria, e não mais “iogurte barato”.

Mas os órgãos responsáveis não conseguem acompanhar a velocidade dos lançamentos, e a maioria dos similares fica sem regulação específica.

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Isso significa que cada marca de “cafake” pode trazer concentrações variadas de diferentes ingredientes. É aí que mora o problema. Um caso recorrente é o dos “ingredientes fantasmas”. “Alguns biscoitos de aveia e mel não têm mel, só aromatizante. A rotulagem está adequada, mas a forma como eles são vendidos induz ao erro”, ilustra Ribeiro.

Algo parecido ocorre quando os similares ficam próximos dos originais. “Não podemos dizer que é uma falsificação, mas as estratégias de venda são parecidas”, diz a nutricionista. E, além de frustrar o paladar, o engodo pode surtir reveses à saúde, como você pode conferir no final da reportagem.

10 alimentos que parecem, mas não são os originais

Veja, a seguir, exemplos de produtos que podem enganar o consumidor nas prateleiras:

1. Óleo composto (“sósia” do azeite de oliva extravirgem)

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(Estúdio Coral (Design) - Getty Images (fotos)/Veja Saúde)

Por que ficar de olho?

O produto similar, longe de levar apenas azeite virgem ou extravirgem, contém outros óleos vegetais na composição, e eles podem alterar acidez, gosto e cheiro.

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Sem contar que não fornece os mesmos nutrientes e compostos bioativos do original, que lhe conferem os tão falados benefícios à saúde.

Substitutos saudáveis

Óleo de girassol, soja, canola ou gergelim.

+Leia também: Por que o azeite ficou tão caro e como não deixar faltar em casa

2. Pó sabor café, mas pode chamar de “cafake”

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(Estúdio Coral (Design) - Getty Images (fotos)/Veja Saúde)

Por que ficar de olho:

Qualquer produto com mais de 1% de ingredientes que não são obtidos dos grãos de café não pode ser enquadrado na categoria que acompanha o desjejum e dá energia ao brasileiro.

O “cafake” costuma carregar milho ou até trigo torrado — daí ser um tanto quanto mais barato. Os substitutos também não possuem o mesmo teor de cafeína.

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Substitutos saudáveis:

Café 100% grão, chá-preto ou chá-verde

3. “Requeijão”

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(Estúdio Coral (Design) - Getty Images (fotos)/Veja Saúde)

Por que ficar de olho:

A base do produto pode estar misturada a amidos e gordura vegetal. Diferentemente das bebidas e compostos lácteos, as chamadas especialidades lácteas ainda não foram regulamentadas.

Substitutos saudáveis:

Queijo suíço cremoso e requeijão caseiro (feito com leite integral, limão, manteiga e sal).

+Leia também: Cottage é opção de queijo mais magro, versátil e cheio de benefícios

4. Xarope de glicose (que se parece muito com mel)

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(Estúdio Coral (Design) - Getty Images (fotos)/Veja Saúde)
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Por que ficar de olho:

É um tipo de amido extraído do milho com a viscosidade muito parecida com a do mel, mas não é mel. É açúcar simples sem as propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias do néctar das abelhas.

O mel puro precisa ter selos que atestam que o produto passou por inspeção. Fique atento também a alimentos que dizem conter o ingrediente mas trazem apenas aromatizantes.

Substitutos saudáveis:

Geleias naturais à base de frutas e melado de cana (sempre com moderação).

5. Bebida láctea, que pode passar por iogurte

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(Estúdio Coral (Design) - Getty Images (fotos)/Veja Saúde)

Por que ficar de olho:

A bebida láctea, mais em conta, é feita com leite e soro de leite, um resíduo que sobra da produção de queijos e seria descartado. Tem menos proteínas, cálcio e gordura que o leite integral, e costuma vir com aditivos, como corantes e espessantes.

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Substitutos saudáveis:

Leite integral ou iogurte caseiro.

+Leia também: Leite integral: não precisa fugir dele nem de seus derivados

6. Doce sabor chocolate

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(Estúdio Coral (Design) - Getty Images (fotos)/Veja Saúde)

Por que ficar de olho:

Se o primeiro ingrediente na lista é açúcar, gordura ou outro composto, provavelmente o doce não é chocolate legítimo. Para ter essa classificação, pelo menos 25% da receita deve ser de cacau.

Doces com “sabor” chocolate costumam incluir muita gordura e vários aditivos químicos para imitá-lo.

Substitutos saudáveis:

Chocolate amargo ou meio amargo (acima de 50% de cacau).

7. Substituto de queijo

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(Estúdio Coral (Design) - Getty Images (fotos)/Veja Saúde)

Por que ficar de olho:

O substituto de queijo ou queijo processado apresenta em sua fórmula apenas gordura vegetal, amido modificado, água e um monte de aditivos químicos, como corantes, emulsificantes e, claro, o aromatizante sabor queijo para dar a impressão de que é o produto original.

Leite mesmo? Nada ou quase nada.

Substitutos saudáveis:

Tofu (o “queijo” de soja) ou queijos tradicionais mais magros, como o branco.

8. Mostarda? Olhe de novo

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Por que ficar de olho:

As aparências enganam, lembre-se disso. O molho sabor mostarda tem adição de amido modificado, um dos disfarces do açúcar, e uma série de aditivos que o tornam um ultraprocessado. Contudo, a versão similar é muito parecida com o produto original.

Substituto saudável:

A mostarda verdadeira leva o grão triturado, vinagre, cebola e temperos.

9) Pão “100%” integral

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(Estúdio Coral (Design) - Getty Images (fotos)/Veja Saúde)

Por que ficar de olho:

Típico caso em que a propaganda estampada induz o consumidor ao erro. Além de não ser possível fazer pães 100% integrais, ostentar ingredientes dessa natureza não exime o produto de ser ultraprocessado.

A indústria costuma botar inclusive conservantes e outros aditivos ali.

Substitutos saudáveis:

Pães caseiros com farinha integral e fermentação natural.

10) Linguiça tipo calabresa

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(Estúdio Coral (Design) - Getty Images (fotos)/Veja Saúde)

Por que ficar de olho:

Qualquer tipo de embutido requer moderação. Isso posto, a versão similar da calabresa pode ter até 20% de carne mecanicamente separada (CMS), um subproduto da indústria cuja composição exata se desconhece.

Possui também aromatizantes, realçadores de sabor e conservantes como nitrito e nitrato. A OMS colocou os embutidos na lista de alimentos associados ao câncer.

Substitutos saudáveis:

Prefira sempre produtos de charcutaria com menos aditivos e o tal do CMS. E não exagere!

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Cada vez mais ultraprocessados

Após anos de discussão entre a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), representantes da indústria e órgãos de saúde pública, uma nova rotulagem de alimentos entrou em vigor em 2022.

Foi então que lupas indicando alto conteúdo de açúcar adicionado, gordura saturada ou sódio, cujo excesso faz mal à saúde, passaram a aparecer nas embalagens. “Esse símbolo ajuda a identificar os produtos ‘menos piores’. É uma estratégia de redução de danos”, avalia a nutricionista Daniela Canella, professora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).

A lupa também dá pistas ao consumidor de que se trata de um produto ultraprocessado.

Proposto no final dos anos 2000 por pesquisadores da USP liderados pelo médico Carlos Monteiro, o termo se refere a alimentos com pouco ou quase nada de matéria-prima in natura e muitos compostos químicos como corantes, aromatizantes e emulsificantes, o que melhora a palatabilidade e o prazo de validade.

“Uma característica dos ultraprocessados é ter um coquetel de aditivos”, explica a nutricionista Vanessa Montera, que os investigou numa pesquisa pela UERJ.

Depois de analisar quase 10 mil rótulos de alimentos e bebidas, ela diagnosticou que 25% deles tinham seis ou mais dessas substâncias em sua fórmula. “Um deles tinha 35 aditivos.”

Pois essa característica é marcante entre os alimentos similares. Afinal, a meta é imitar um original, mascarando eventuais diferenças. Pense novamente no “cafake”, feito de uma torra de milho ou outros cereais à qual se acrescenta uma quantidade mínima de café.

Para seduzirem o cliente, as empresas apostam numa plêiade de aditivos, em combinações e proporções inéditas. “Para aprová-los, a Anvisa estuda os aditivos de forma isolada e estipula um limite aceitável para cada um deles, mas não há estudos mostrando o que ocorre com a nossa exposição a esse coquetel”, elucida Montera.

Os órgãos regulatórios avaliam o potencial carcinogênico, mutagênico ou neurotóxico desses compostos, mas o impacto metabólico que essas substâncias podem ter no ganho de peso ou em alergias e intolerâncias ainda não é levado em conta. “Já existem trabalhos indicando que os aditivos têm efeito na microbiota intestinal, no equilíbrio da glicemia e no nível de atenção das crianças”, cita a pesquisadora. Sem falar que alguns corantes já estão proibidos em outros países.

“Idealmente, a lupa deveria informar também a presença de aditivos, como recomenda a Organização Pan-Americana de Saúde (Opas)”, defende Canella. Em resumo, no caso dos similares, o que seria ruim pode piorar.

+Leia também: “Indústria dos ultraprocessados prega ideias falsas”, diz médico

Como escolher

Mais do que colocar todos os similares na mesma lista a se evitar, o melhor caminho é prestar mais atenção nas embalagens e buscar um cardápio balanceado.

Na prática, isso significa não se contentar com a presença ou ausência da lupa no rótulo. “Como o consumidor associa esse símbolo a algo ruim, a indústria já começou a fazer alterações nas receitas para evitar o alerta”, expõe Ramon Rocha, pesquisador do Food Research Center (FoRC).

Um exemplo é a diminuição de açúcar para acrescentar adoçantes. Só que isso não torna o produto necessariamente mais saudável, apenas o molda à regra.

Assim, é preciso reservar tempo e vasculhar a lista de ingredientes: termos como maltodextrina, xarope de glicose, corantes, aromatizantes e açúcar invertido são indícios de um ultraprocessado, ou seja, de algo que exige moderação. Se eles estiverem no início da listagem, cautela extra, já que os ingredientes são enumerados em ordem decrescente.

+ Leia também: Como ler a tabela nutricional? Guia completo para escolher alimentos saudáveis

Nem todo processamento é ruim

Nem todos os alimentos industrializados, no entanto, são igualmente prejudiciais. “Leite em pó e refrigerantes são muito diferentes. O que falta é educação nutricional para a população diferenciá-los”, afirma a endocrinologista Luciana Viana, professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Enquanto o leite em pó passa apenas por um processo de desidratação, o refrigerante é uma mistura de xaropes com corante, conservantes e adoçantes. Um é processado; o outro é ultraprocessado.

É aí que a leitura, inclusive dos ingredientes, faz diferença. No ano passado, cientistas americanos publicaram uma pesquisa demonstrando que ultraprocessados ricos em “nutrientes bons” — como fibras, minerais e vitaminas, presentes em alguns pacotes de cereais matinais ou pães industrializados — não trariam o mesmo risco à saúde que outros produtos da categoria.

Além disso, uma investigação brasileira revela que pessoas com um padrão de dieta saudável não apresentaram a associação entre consumo de ultraprocessados e declínio cognitivo vista nos indivíduos com hábitos alimentares piores. Sim, o contexto todo importa.

Similar ou original, o ponto é que o alimento com aditivos deveria ser mais exceção do que regra na dieta — o ideal seria forrá-la, na verdade, de produtos in natura ou minimamente processados. E se engana quem pensa que essa troca é financeiramente inviável.

“Pesquisas mostram que não gastamos mais comprando alimentos frescos e naturais. O que falta é tempo para preparar a comida”, diz a médica Rosely Sichieri, professora titular da UERJ. Não tem erro: para viver com mais saúde, é preciso voltar às origens… E dedicar mais tempo à cozinha.

E o suco de frutas?

Encontrados junto dos sucos nas prateleiras, os néctares, em geral acondicionados em caixinhas, não são considerados similares, mas outro tipo de bebida.

Contam com pouco suco em si (entre 20 e 30%), e os “refrescos” podem conter ainda menos que isso — o restante da receita é água, açúcar, corantes e outros aditivos para estender a validade.

Um suco natural ou 100% fruta pode ter até 10% de açúcar adicionado, mas é vedado o uso de aditivos químicos. Para driblar esse limite, o suco de maçã é usado como adoçante natural.

Como o rótulo da bebida não deve induzir ao erro, você pode encontrar várias maçãs “escondidas” entre outras ilustrações da embalagem e a descrição em letras menores.

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