O transtorno de déficit de atenção e hiperatividade, conhecido como TDAH, afeta entre 5% e 8% da população mundial, segundo a Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA).
O tratamento é multidisciplinar e costuma envolver, além da psicoterapia e outras medidas comportamentais, o uso de medicamentos.
As únicas drogas atualmente disponíveis no país para o manejo da condição são os estimulantes, como a Ritalina (metilfenidato) e o Venvanse (lisdexanfetamina).
Elas são, em geral, eficazes, mas oferecem maior risco de dependência por atuarem de maneira inespecífica, em todo o cérebro.
Pois uma nova opção está para chegar ao Brasil. Em julho deste ano, o primeiro medicamento à base de atomoxetina foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Trata-se do Atentah, da fabricante Apsen Farmacêutica.
Ele não é considerado estimulante e tem um mecanismo de ação mais específico, que diminui a quase zero o risco de dependência, segundo estudos.
Os medicamentos estimulantes
O metilfenidato e o lisdexanfetamina elevam a disponibilidade de neurotransmissores como dopamina e norepinefrina (ou noradrenalina), o que ajuda a melhorar a concentração e o foco em pessoas com TDAH.
Mas há uma questão. Essas moléculas também estimulam o sistema de recompensa, daí a preocupação com a dependência química.
Com a ilusão de que poderiam melhor o desempenho no trabalho ou nos estudos, muitas pessoas neurotípicas (sem transtornos diagnosticados) estão tomando esses remédios por conta própria.
Mas isso é perigoso: além da alta chance de dependência, estudos ainda demonstram que essas medicações podem, na verdade, atrapalhar o rendimento desses indivíduos.
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No caso de pessoas com TDAH, as vantagens superam os ônus. Cerca de 70% dos portadores do problema respondem bem aos estimulantes.
Só que, muitas vezes, o quadro vem acompanhado de outros diagnósticos, como autismo ou transtorno de ansiedade. E, para eles, esses medicamentos são um problema.
“Eles podem piorar as estereotipias dos autistas ou aumentar a ansiedade, então não são recomendados quando há outras questões associadas”, explica o médico psiquiatra Paulo Mattos, professor do Programa de Doutorado em Ciências Médicas do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR).
Novo caminho mais específico: atomoxetina
Quando há a presença de comorbidades, países como Estados Unidos, Japão e algumas nações europeias usam a atomoxetina.
Ela também aumenta a disponibilidade de um neurotransmissor, a noradrenalina. Mas, diferente dos estimulantes, é altamente específica: age apenas no córtex pré-frontal.
Por não interferir no sistema de recompensa, sua capacidade de gerar vício ou dependência é considerada nula. Mas, justamente pela atuação mais controlada, prevê-se certa demora para apresentar resultados, em relação aos estimulantes comuns.
Depois da aprovação recebida em julho, o medicamento será precificado e a a previsão é que esteja disponível no mercado brasileiro em outubro.
“Aumentar as opções de medicamentos no Brasil será muito positivo, e vai exigir uma análise mais cuidadosa de cada caso, o que acaba evitando que o tratamento seja uma receita de bolo”, comenta o psiquiatra.
O que é o TDAH e como flagrá-lo
Ele é um transtorno do neurodesenvolvimento, ou seja, é caracterizado por alterações que ocorreram durante o desenvolvimento do cérebro do indivíduo, principalmente na área do córtex pré-frontal, região que regula atenção, foco e autocontrole.
Essas mudanças geralmente acontecem quando a pessoa ainda está na barriga da mãe, e resultam em características atípicas, como dificuldade de concentração, inquietação, impulsividade, dentre outras.
Há ainda um componente genético associado ao TDAH.
Se não for corretamente diagnosticada e tratada, a condição pode trazer prejuízos ao aprendizado, relações profissionais e até pessoais.
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O diagnóstico é feito por avaliação clínica, com informações sobre o desenvolvimento da linguagem, pedagógico e social da pessoa, além de análise do histórico familiar.
“Há diagnóstico de medicina que são mais duros. Por exemplo, no câncer, não existe meio termo: você tem ou não um tumor. Mas nem tudo é assim, existem dimensões”, explica Paulo Mattos.
“O diabetes é um bom exemplo para entender isso. Todo mundo carrega açúcar na veia, uns um pouco mais, outros um pouco menos. Só quando o nível passa de um determinado ponto é que eu chamo de diabetes. O TDAH é exatamente assim”, exemplifica o especialista.
Ao todo, essa condição possui 18 sintomas, divididos em 3 grupos: 9 relacionados à desatenção, 6 à hiperatividade e 3 à impulsividade.
É normal termos características desta lista, em especial nos dias de hoje, cheios de estresse e estímulos constantes.
“Se alguém me disser que não tem nenhum sintoma desses 18, tem alguma coisa errada. É a mesma coisa que dizer que não tem açúcar no sangue”, comenta o pesquisador.
Casos leves de desatenção e impulsividade, que são resolvidos com terapia e atividade física, não são classificados como TDAH. O que configura o transtorno é manifestar os sintomas exageradamente, com impactos significativos na qualidade de vida.
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