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IA: “Faculdades de medicina ainda não ensinam sobre inteligência artificial”

O médico e cientista americano Daniel Kraft defende a capacitação profissional para a inclusão de tecnologias seguras e responsáveis nos consultórios

Por Larissa Beani
Atualizado em 11 nov 2024, 14h40 - Publicado em 11 nov 2024, 14h34
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  • Passos e batimentos cardíacos registrados em relógios de pulso, cirurgias feitas com o auxílio de braços robóticos, acesso a informações genéticas que você nem poderia imaginar… A inteligência artificial é praticamente onipresente na área da saúde — mas a interpretação dos dados por um profissional preparado sempre será mandatória.

    É o que especialistas no uso de novas tecnologias aplicadas à saúde insistem. “É preciso capacitar médicos, enfermeiros e outros profissionais de saúde para conhecer as várias soluções tecnológicas que já existem”, defende Daniel Kraft, médico e cientista dos Estados Unidos que se dedica a expandir o conhecimento sobre soluções digitais aplicadas à medicina.

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    À VEJA SAÚDE, o fundador da NextMed Health e da Digital.Health, iniciativas que buscam informar sobre as principais novidades no campo, fala sobre a importância de combinar tecnologia e humanização nos atendimentos.

    + Leia também: Inteligência artificial promove revolução na radioterapia

    VEJA SAÚDE: Como você acredita que a IA irá mudar os cuidados com a saúde na próxima década?

    Daniel Kraft: Acredito que o principal benefício seja ajudar a dar orientações cada vez mais personalizadas e precisas acerca de como cada um pode viver melhor e prevenir doenças às quais tenha predisposição.

    Isso começa pela detecção precoce de condições médicas, às vezes com base em sinais sutis demais para serem identificados a olho nu ou por um laboratório, e, em seguida, pela introdução de terapias que podem ser ajustadas ao indivíduo.

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    Podemos selecionar tratamentos que realmente correspondam à sua farmacogenômica, conhecendo a forma como você metaboliza um medicamento.

    Afinal, é preciso entender que a saúde não se resume a tratar doenças, mas também a como as pessoas terão acesso à prevenção e aos tratamentos de forma democrática, otimizada, eficaz e de menor custo.

    + Leia também: Inteligência artificial na saúde: um universo de possibilidades

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    Daniel Kraft em palestra no Afya Summit, realizado em São Paulo (Afya/Divulgação)

    Você pode dar exemplos de tecnologias emergentes que você acredita que irão ajudar nessa missão?

    Não se trata de apenas uma tecnologia, mas de como o uso delas converge para ser aplicado à vida da população. Como quando a IA encontra a robótica, por exemplo.

    Hoje, temos visto cada vez mais cirurgias sendo feitas com o uso de braços robóticos comandados por médicos — que podem estar presentes na sala de cirurgia ou até atuar de forma remota, em qualquer parte do mundo.

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    A inteligência artificial também está alavancando o desenvolvimento e uso preciso de medicamentos na era da medicina personalizada. Para um grupo de pacientes com um certo tipo de câncer, por exemplo, é possível utilizá-la para projetar uma molécula ou reaproveitar um fármaco existente para o tratamento.

    Isso pode ser aplicado em todas as áreas, na verdade, não apenas à oncologia: no desenvolvimento de vacinas de mRNA, como as de covid-19, ou terapias genéticas.

    O próximo campo que está começando a se expandir é o do uso da edição genética dentro do corpo para eliminar doenças. É o exemplo de uma empresa chamada Verve Therapeutics, que está fazendo edição genética in vivo para o colesterol severamente alto de pessoas com  hipercolesterolemia familiar, doença que aumenta muito o risco cardiovascular. 

    + Leia também: Números atestam: inteligência artificial está se tornando praxe na saúde

    Para além do uso em testes clínicos, como a inteligência artificial está presente hoje nos cuidados com a nossa saúde?

    Atualmente, os wearables [dispositivos vestíveis, como smartwatches] e alguns aplicativos podem ser úteis no acompanhamento de algumas condições e até na prevenção de doenças.

    No futuro, seu médico ou nutricionista poderá prescrever um dispositivo vestível ou um app para ajudar a controlar sua pressão arterial, monitorar outros sintomas e lembrar de tomar um remédio.

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    É algo que pode ser aplicado em qualquer situação. Um paciente que acabou de fazer uma substituição total do quadril, por exemplo.

    Quando ele tem alta do hospital e vai para a casa, ninguém sabe como ele está, mas, com o uso de aplicativos, os profissionais de saúde podem observar seus passos, se ele está caminhando mais ou menos do que se esperaria após certo tempo de recuperação. Se algo não parecer certo, é possível intervir mais cedo.

    O uso da realidade aumentada também está se expandindo, principalmente na educação de novos médicos e outros profissionais da saúde. É uma ferramenta útil para capacitá-los sobre a anatomia e a fisiologia humanas antes de encarar pacientes reais.

    + Leia também: Inteligência artificial como aliada contra as barreiras da audição

    Quando falamos sobre a introdução de novas tecnologias no mercado de trabalho, muitos temem que possam ser substituídos por máquinas. Você acredita que a IA possa substituir médicos, em alguma medida, ou apenas vá ajudá-los a tomar melhores decisões?

    Robôs cirúrgicos, hoje, são controlados completamente por humanos, mas talvez, em 10 anos, haja procedimentos que possam ser feitos de forma mais automatizada, ainda que acompanhada e orientada por médicos.

    Na aviação, os pilotos fazem toda a decolagem e aterrisagem, mas, durante o voo, o trajeto é orientado principalmente pelo computador e os pilotos apenas seguem o caminho em segurança.

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    Acredito que esta seja uma boa analogia que essa possa ser uma solução para conseguirmos suprir a falta de profissionais em certas regiões, inclusive na América Latina, tornando os tratamentos mais precisos, seguros e rápidos.

    Acho que, como há uma escassez de médicos em praticamente todas as especialidades, a IA não vai substituí-los, mas aqueles profissionais que estiverem utilizando essas tecnologias começarão a substituir os que não o fazem. Então, é mais uma colaboração do que uma substituição.

    Leia também: Healthtechs de saúde mental ajudam população a ter acesso a tratamentos

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    Daniel Kraft em palestra no Afya Summit, evento realizado em São Paulo com centenas de médicos e estudantes de medicina para discutir o futuro da profissão e da saúde no Brasil e no mundo (Afya/Divulgação)

    Quais habilidades serão esperadas de um médico no futuro?

    Essa é uma grande questão e que, inclusive, abrange mudanças que devem ser feitas no currículo. Hoje, faculdades de medicina não abordam saúde digital ou inteligência artificial.

    Eu desenvolvi um site chamado digital.health [“saúde digital”]. É uma plataforma gratuita para reunir iniciativas digitais voltadas à medicina, um reservatório com mais de 3 mil soluções para qualquer problema de saúde, como diabetes, doenças cardíacas, psiquiátricas, casos cirúrgicos etc. Qualquer pessoa que esteja lendo isto e tenha uma empresa ou startup na área pode se adicionar ao banco de dados.

    Adoraríamos construir uma versão em português ou uma versão para o Brasil!

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    Mas, além de habilidades técnicas, a inteligência emocional e trato com as equipes e pacientes também será mais exigida, porque qualquer diagnóstico depende de escuta e anamnese atentas — mesmo que algum tipo de tecnologia seja introduzida nesse processo. Algumas coisas permanecerão sempre as mesmas.

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