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Além da pele, herpes-zóster compromete a visão e o coração

A doença, causada pelo agente infeccioso da catapora, causa muita dor e poderá afetar até um terço da população. Saiba como prevenir

Por Chloé Pinheiro
Atualizado em 14 fev 2020, 18h22 - Publicado em 23 nov 2017, 12h46
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Vírus da catapora fica alojado no organismo e pode voltar com força total (Ilustração: Daniel Araújo/SAÚDE é Vital)
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Em uma das vezes que foi internada por complicações da esclerose múltipla, a humorista Claudia Rodrigues confirmou que uma baixa na imunidade, algo comum nesses casos, resultou em um quadro de herpes-zóster, gerando lesões na região do olho direito e ameaçando a visão da atriz. Mas qual a verdadeira origem do problema?

Pense em um bandido detido, levado à prisão e que, depois de décadas cumprindo pena, se aproveita de uma bobeada da segurança para escapar das grades e cometer um novo crime, ainda mais grave. É o que acontece com o vírus varicela-zóster. Normalmente na infância, ele provoca a catapora.

Após o organismo tomar conta da situação, o mau elemento recua e se esconde no sistema nervoso, onde fica anos quietinho aguardando o momento para dar o bote. “Ele se vale da queda na imunidade para se reativar”, explica o médico Cipriano Ferreira, da Sociedade Brasileira de Dermatologia.

E é aí que aparece o herpes-zóster ou só zóster, palavra grega que significa “cinturão” e reflete uma das principais características da doença: a formação de bolhas bem doloridas ao longo de uma faixa na pele, em geral em apenas um lado do corpo.

Uma vez que baixas no sistema imune são mais frequentes com a idade, não é de espantar que a incidência do mal aumente depois dos 50. Mas não são só os mais experientes que estão ameaçados pelo retorno do vírus. “O declínio das defesas que ocorre com o envelhecimento é um fator importante, porém existem outros gatilhos e situações a considerar”, diz o virologista Fernando Spilki, da Universidade Feevale, em Novo Hamburgo (RS).

Entram no grupo de risco indivíduos que se submeteram a um transplante e pessoas com doenças crônicas como diabetes, aids ou outras condições que exigem o uso de remédios imunossupressores. Não é pouca gente.

O drama é que se espera um crescimento no número de casos de zóster pelo mundo. Segundo análise publicada no periódico científico BMC Geriatrics, a incidência deve subir cerca de 3% ao ano até 2030. O dado reforça uma estimativa do próprio Centro de Controle de Doenças dos Estados Unidos, o CDC, que calcula que o problema já possa atingir um terço da população. Ora, o vírus está escondido no corpo de muitos adultos, e eles estão envelhecendo.

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O bicho pega mesmo porque todo mundo que já teve catapora está sujeito ao herpes-zóster. “Estima-se que pelo menos 95% da população tenha o vírus latente, esperando baixas significativas na imunidade para se expressar livremente”, conta o pesquisador Igor Brasil Costa, especialista em saúde pública do Instituto Evandro Chagas, em Belém do Pará.

Com o caminho liberado, ele passa a se replicar e avançar nas terminações nervosas, provocando uma inflamação local e generalizada. Daí vem a dor, seguida das erupções de feridas na pele. Se a infecção não for contida, pode haver complicações em outros cantos, como os olhos.

Aliás, o processo inflamatório desencadeado pelo zóster traz outras ameaças a distância. Um estudo recente publicado na revista da Associação Americana do Coração identificou que, até um ano após o controle da enfermidade, suas vítimas correm um risco consideravelmente maior de sofrer um infarto ou derrame. O que justificaria essa relação? A inflamação despertada pelo vírus, capaz de repercutir negativamente nas artérias que abastecem o cérebro e o coração.

Para entender e brecar os tormentos mais imediatos da doença, o bioquímico Thiago Mattar Cunha e colegas da Universidade de São Paulo, em Ribeirão Preto, analisaram o mecanismo da infecção e descobriram que um dos processos cruciais para o aparecimento da dor é o aumento nos níveis de uma molécula inflamatória, o TNF-alfa.

O achado tem potencial de ajudar a identificar a melhor forma de impedir e contra-atacar uma das principais complicações do zóster, a neuralgia pós-herpética quando o vírus machuca tanto os nervos que o incômodo não passa mesmo após o fim da infecção.

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O tratamento do zóster hoje é feito com comprimidos antivirais, os mesmos utilizados contra outros agentes infecciosos. “O uso dos medicamentos deve começar nos primeiros dias após o diagnóstico a fim de diminuir a intensidade dos sintomas e o risco de complicações”, esclarece o dermatologista Claudio Wulkan, do Einstein.

A dor, que costuma surgir dias antes das lesões cutâneas, junto com coceira e formigamento, é tão intensa que muitas vezes exige internação. Analgésicos comuns não dão conta do recado, o que faz os médicos partirem para fármacos que atuam diretamente no sistema nervoso. Tudo para aliviar uma sensação descrita como lancinante.

Prevenção do crime

Mais eficiente (e tranquilo) do que a estratégia polícia e ladrão é apostar em um plano de ação preventivo. O ideal é imunizar-se contra a catapora na infância, mas essa proteção só foi incluída no Calendário Nacional de Vacinação em 2013. Ou seja, serão décadas pela frente até que toda a população esteja devidamente blindada desde cedo contra o vírus.

Não é por menos que a farmacêutica MSD desenvolveu uma vacina específica para o zóster, já disponível no Brasil na rede particular. “Ela é 14 vezes mais forte que a da catapora e está indicada a partir dos 60 anos pelas sociedades médicas, embora já faça efeito a partir dos 50”, explica Maísa Kairalla, presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – Regional São Paulo.

O imunizante depende de uma única dose, comercializada com o preço médio de 500 reais, o que ainda limita o acesso a muitos brasileiros. Apesar de a vacina ser a melhor opção para se resguardar da reativação do varicela-zóster, manter a imunidade em alta é outro conselho bem-vindo. Ora, são as células de defesa que impedem que o malfeitor se reproduza e cause estragos nos nervos e na pele.

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Nesse sentido, vale prezar por alimentação balanceada, atividade física regular e exposição frequente ao sol. “O estresse do cotidiano também baixa a imunidade”, lembra Ferreira. Pois é, corpo e mente em equilíbrio são essenciais para que as forças de segurança do organismo não vacilem e deixem o bandido microscópico aprontar.

Repercussões do herpes-zóster em outros cantos

Encefalite

Ao se reativar, o varicela-zóster pode acessar e atacar o cérebro, levando a uma inflamação potencialmente fatal e capaz de gerar sequelas.

Herpes ocular

Quando aparece no rosto e alcança a linha dos olhos, o vírus pode migrar até o globo ocular e comprometer a vista.

Dor crônica

Até 40% das vítimas têm neuralgia pós-herpética, quadro doloroso que permanece depois que a infecção termina. Chega a durar meses ou anos.

Infarto e AVC

A inflamação associada à doença eleva, em um cenário de maior risco, a probabilidade de um entupimento nas artérias.

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Não confunda os vírus

Herpes-zóster

O varicela-zóster causa catapora na infância e, depois, se aloja nos gânglios nervosos, podendo se reativar mais tarde.

Herpes labial

Dois terços da população vivem com o herpes simples tipo 1, capaz de causar feridas na boca e até nos genitais.

Herpes genital

Transmitido sobretudo pelo sexo, o herpes simples tipo 2 afeta as partes íntimas, mas também pode ir para a boca.

herpes-quadro
(Ilustração: Daniel Araújo/SAÚDE é Vital)

De um lado só

A proliferação do vírus do herpes-zóster segue o caminho do nervo afetado, mas nunca passa de uma das metades do corpo. Por isso, as lesões na pele ficam só de um lado do rosto, do abdômen…

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