Restrição de calorias induz alterações benéficas no DNA de mulheres obesas
Estudo brasileiro sugere que, em pessoas com obesidade, uma dieta para emagrecer altera o funcionamento do código genético, reduzindo o risco de câncer
Estudo conduzido por pesquisadores do Brasil e da Espanha mostrou que a adoção de uma dieta com restrição de calorias pode, além de reduzir o peso, induzir modificações bioquímicas no DNA de mulheres com obesidade. Essas alterações, por sua vez, reverteriam a propensão a certos tipos de câncer. Os resultados foram publicados no European Journal of Clinical Nutrition.
O trabalho integra um projeto financiado pela Fapesp cujo objetivo é avaliar, em pacientes obesas submetidas a diferentes intervenções terapêuticas – cirurgia bariátrica, cirurgia bariátrica seguida de exercícios físicos ou dieta –, o padrão de metilação do DNA. O que isso significa? É um processo bioquímico complexo, mas que, em resumo, pode alterar o funcionamento de alguns genes. Determinados padrões de metilação do DNA favoreceriam ou inibiriam o desenvolvimento de doenças, por exemplo.
“O estudo mostra que indivíduos com e sem obesidade têm um perfil diferente de metilação do DNA em alguns genes específicos e que isso pode ser modicado com a perda de peso”, explica Carolina Nicoletti, professora da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP), uma das autoras do trabalho.
“O aumento da prevalência e incidência de obesidade e comorbidades relacionadas é um dos principais problemas de saúde pública na atualidade. A melhor compreensão das interações entre estilo de vida, meio ambiente e genética é fundamental para o desenvolvimento de estratégias efetivas de prevenção e tratamento”, diz Carla Barbosa Nonino, que supervisionou a investigação. Ela é coordenadora do projeto e do Laboratório de Estudos em Nutrigenômica (LEN) da FMRP-USP.
Nesse estudo, foram avaliadas 11 voluntárias com obesidade e idades entre 21 e 50 anos. Elas tiveram amostras de sangue coletadas antes e depois de uma intervenção dietética de seis semanas. As pacientes ficaram internadas durante todo o período na Unidade Metabólica do Hospital das Clínicas da FMRP-USP, onde receberam uma dieta de 1 800 e 1 500 calorias diárias no primeiro e segundo dia, respectivamente, e de 1 200 quilocalorias por dia no restante do período. É uma restrição considerável.
As pacientes tiveram acompanhamento de uma equipe de médicos, enfermeiras e nutricionistas, que garantiram a adesão à dieta. Além disso, foram estimuladas a não alterar os níveis diários de atividade física que mantinham antes da intervenção.
Após as seis semanas de intervenção, as voluntárias tiveram uma perda de peso de 1,8%, equivalente a mais ou menos um quilo por semana. “Quando se trata de uma pessoa de 150 quilos que precisa perder 50, a mudança não vai acontecer em dois meses, mas provavelmente durante o ano inteiro”, ressalta Carolina.
Possível redução no risco de câncer
Ao comparar o tal padrão de metilação do DNA das mulheres com obesidade antes e depois da intervenção, os cientistas observaram que genes como SULF2, GAL e SNORD2, envolvidos em alguns tipos de tumores (como de mama e colorretal), estavam 35% menos ativos após a intervenção.
“Encontramos muitos genes envolvidos na sobrevivência da célula, os chamados pro-oncogenes, relacionados ao desenvolvimento de câncer. Eles estavam menos metilados nos obesos, o que significa que têm uma expressão maior, favorecendo a formação de tumores”, aponta Carolina. “Mas a modificação ocorrida após a intervenção dietética sugere a diminuição dos riscos da ocorrência de câncer nessas pessoas”, arremata.
As pesquisadoras ressaltam que, apesar da melhora, a intervenção não igualou o padrão de metilação das mulheres obesas com a de voluntárias do grupo controle, que não tinham obesidade. No entanto, elas acreditam que a continuidade no emagrecimento poderia levar a isso.
Este conteúdo foi publicado originalmente pela Agência Fapesp.