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Criança pequena e tecnologia: até que ponto elas combinam?

Especialista da Sociedade de Pediatria de São Paulo esclarece quais são os limites para uma convivência saudável com tablets, celulares e afins

Por Dra. Vera Ferrari Rego Barros*
Atualizado em 18 nov 2021, 15h08 - Publicado em 10 nov 2016, 12h05
 (Maira Chiodi (ilustração)/)
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Por Dra. Vera Ferrari Rego Barros*

A realidade virtual vem progressivamente confundindo seus limites com o mundo real no cotidiano de crianças e adolescentes. Hoje em dia, eles já nascem imersos no meio digital. Basta lembrar que uma das primeiras providências dos pais ao terem um bebê é postar suas fotos nas redes sociais. Não à toa, essa é a chamada geração digital.

É natural que, com a presença marcante das tecnologias, as crianças sejam capazes de manejar e usufruir cada vez mais cedo de smartphones e tablets. Mas o uso precoce da tecnologia é benéfico ou prejudicial?

Depende de quando e como ela é utilizada.

A Academia Americana de Pediatria (APA), no que é seguida pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), orienta que até os 2 anos de idade não haja exposição à TV, ao computador, ao celular ou ao tablet. Nesse período, o cérebro está em franco processo de desenvolvimento, o que requer contato com incentivos variados e ativos.

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É preciso lembrar que crianças pequenas aprendem por meio da interação com pessoas e coisas; logo, elas precisam ter uma gama de estímulos que requeiram o uso de todas as competências envolvidas. As capacidades motoras, as interações verbais, o tato, a visão, o paladar e o olfato devem estar integrados nas experiências com seu ambiente. Estas, aliadas à socialização, são fundamentais para um crescimento saudável.

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Para uma criança pequena, convívio social, com brincadeiras criativas e atividades manuais, é o cerne do aprendizado. Brincando, ela aprende acerca das coisas e das pessoas, bem como sobre ela mesma, na medida em que vai se surpreendendo com suas habilidades.

As experiências de relação com as telas, como TV, celulares ou tablets, por mais que encantem e prendam a atenção, não são suficientes para promover estimulação semelhante como a da vida real. Além de promoverem aprendizagem por repetição – do tipo “aperte o botão!” – induzem a passividade, o isolamento e a diversão solitária, na contramão do que desejamos para a vida da criança.

O problema é que as habilidades digitais estão se sobrepondo à aquisição de competências que só adquirimos nas interações reais.

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A superexposição às tecnologias, em idade na qual a criança não desenvolveu competências básicas para interagir com seu meio, é associada ao déficit do funcionamento executivo e da atenção, atrasos cognitivos, prejuízo da aprendizagem, aumento da impulsividade, irritabilidade e agressividade.

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Bebês e crianças pequenas precisam interagir com outras pessoas. O apego às telas, de qualquer aparelho, traz o risco de causar desengajamento e vulnerabilidade, assim como poucas aptidões sociais e diminuição da capacidade de expressar empatia.

Mas, reconhecendo que o mundo digital já é a linguagem da criança de hoje, fazendo parte até mesmo dos conteúdos escolares e dos meios para acessá-los – basta reparamos que se usa cada vez mais a digitação no tablete como substituta da escrita e a pesquisa na internet como substituta dos livros –, devemos pensar nos cuidados necessários para permitir seu acesso por crianças pequenas.

Para começar, evite o uso de tablets e smatphones antes dos 3 anos. A partir dessa idade, com maior compreensão e expressão, habilidades motoras e de socialização, a criança pode se beneficiar dos conteúdos de aplicativos direcionados à sua faixa etária. Mas atenção com jogos e programas muito rápidos, confusos e barulhentos – eles podem ser assustadores. Prefira aqueles com proposta educativa.

Cabe aos pais selecionarem os apps e monitorarem o tempo de uso de qualquer dispositivo eletrônico. Nessa fase, não mais do que 60 minutos por dia, até porque o tempo de atenção e concentração delas a qualquer atividade é bem mais curto que os do adulto.

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Não vale abusar da curiosidade natural da criança e deixá-la brincando indefinidamente com os dispositivos, com a ideia de que assim ela ficará quietinha e não incomodará os mais velhos, quando estes estão conversando ou querem jantar sossegados, por exemplo.

Os adultos são os modelos das crianças para apreender como as coisas funcionam. Se os pais fazem uso indiscriminado da tecnologia no dia a dia e não dispõem de tempo para dar atenção focada aos filhos, estes tenderão a se refugiar nos aparelhos como forma de se ocupar e obter alguma satisfação mais imediata.

Só que, dessa forma, criam um hábito que, além de ser prejudicial, não elimina a frustração de um contato desatento e pouco receptivo com os pais. É preciso reservar parte do tempo para as brincadeiras “corpo a corpo” com a criança. São elas que ajudam a fortalecer a autoestima, a criar o sistema de valores, a tranquilizar e a dar segurança.

Também não devemos vincular algo da rotina da criança ao uso da tecnologia, principalmente quando se trata de atividades essenciais até à sua saúde – é muito ruim quando a criança só dorme ou só come se puder ver um desenho no tablet ou brincar com o celular. A autoridade dos pais para colocar limites é essencial para dar o valor de cada uma dessas experiências.

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Considere que nessa primeira infância os dispositivos tecnológicos são meios bem interessantes de agregar aprendizagem à criança, mas nunca substituem as experiências concretas com as pessoas e as situações do seu entorno — estas, sim, primordiais para a sua formação.

* Dra. Vera Ferrari Rego Barros é psicanalista e presidente do Departamento de Saúde Mental da Sociedade de Pediatria de São Paulo

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