6 em cada 10 crianças e adolescentes vivem na pobreza no Brasil
Houve uma melhora discreta no índice entre 2019 e 2022, mas a maioria dos jovens do país ainda está em situação de vulnerabilidade, aponta Unicef
O Brasil ainda enfrenta um cenário desafiador na garantia de direitos de crianças e adolescentes, de acordo com um relatório inédito lançado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) nesta terça-feira, 10.
O documento aponta que o país avança de forma lenta na redução de privações a que os menores de idade estão expostos.
Entre 2019 e 2022, houve uma queda de 62,9% para 60,3% no percentual de meninas e meninos vivendo na pobreza multidimensional, conceito que considera não apenas a renda das famílias.
O índice corresponde a 31,9 milhões de crianças e adolescentes privados de um ou mais direitos, de um total de 52,8 milhões que vivem por aqui.
“A pobreza precisa ser olhada em suas múltiplas dimensões. Estar fora da escola ou sem aprender, viver em moradias precárias, não ter acesso a água e saneamento, ter uma alimentação inadequada e não ter acesso à informação são privações que fazem com que crianças e adolescentes estejam na pobreza multidimensional”, afirma Santiago Varella, especialista em políticas sociais do Unicef no Brasil.
Os especialistas alertam para a importância de políticas públicas direcionadas a esse público no país.
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Analfabetismo aumentou no país
O estudo contempla dados de 2016 a 2022 e analisa o acesso a seis direitos básicos: renda, educação, informação, água, saneamento e moradia. O relatório se baseia na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PnadC).
Entre as privações analisadas, destaca-se a piora recente no contexto da educação, especialmente no que diz respeito ao analfabetismo.
Entre 2019 e 2022, a proporção de crianças de 7 anos de idade que não sabem ler e escrever dobrou, passando de 20% para 40%. O índice é pior entre as crianças negras e as afetadas pela pandemia durante o período de alfabetização.
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Por outro lado, o acesso à internet e à televisão foi um dos indicadores que contribuiu para a redução observada nas privações. Em 2019, cerca de 14% da população de 9 a 17 anos não tinha acesso à informação, percentual que caiu para 6,1% em 2022.
Renda, alimentação e moradia
A dimensão renda diz respeito ao número de crianças e adolescentes existindo sem o mínimo de recursos para atender suas necessidades. No estudo, são considerados R$ 541 mensais por pessoa em áreas urbanas e R$ 386 em áreas rurais, a preços médios de 2022.
Em 2019, 40% dos jovens vivia abaixo desse limiar. Durante a pandemia, o índice variou – em parte por conta das políticas de auxílio emergencial. Em 2022, 36% estavam na pobreza monetária.
O estudo analisa ainda o montante necessário somente para prover os padrões de alimentação adequada. Nesse contexto específico, o percentual de crianças e adolescentes sem dinheiro para comer teve ligeira piora entre 2019 e 2022, de 19 para 20% do total. A alta no preço dos alimentos ajuda a explicar o cenário.
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“Importante destacar também o saneamento básico, que, embora apresente alguma melhora, continua sendo a privação que impacta esta faixa etária no país”, diz Varella.
Em 2019, 39,5% das meninas e dos meninos brasileiros não tinham acesso adequado a banheiros e rede de esgoto, percentual que fica em 37% em 2022. Em relação à água potável, 5,4% das crianças e dos adolescentes estavam privados desse direito em 2022.
A questão da moradia adequada continua a ser um desafio significativo. Os dados mais recentes revelam que 9,4% do total deste público não tinha condições adequadas de habitação em 2022.
Desigualdades internas
O estudo apresenta dados nacionais e segmentados por estado, destacando uma diferença regional significativa com relação à pobreza no Brasil.
Estados do Norte e Nordeste, por exemplo, apresentaram os maiores índices de crianças e jovens privados de um ou mais direitos.
No recorte de cor e raça, a desigualdade ainda é grande, mas se reduziu um pouco nos últimos anos, de acordo com o relatório.
Enquanto a diferença no acesso a direitos entre crianças e adolescentes brancos e negros era de cerca de 22 pontos percentuais em 2019, em 2022 ela se reduziu para pouco mais de 20 pontos percentuais.