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Como anda sua saúde mental? O psicólogo e psicanalista Francisco Nogueira, membro efetivo do Departamento Formação em Psicanálise do Instituto Sedes Sapientiae e cocriador da consultoria Relações Simplificadas, reflete sobre as questões da mente humana para lidarmos melhor com os desafios do mundo de hoje

Estamos vivendo uma epidemia de sofrimento mental?

Psicólogo estreia coluna em VEJA SAÚDE abordando um dos maiores e mais democráticos desafios destes tempos, a ascensão do sofrimento mental

Por Francisco Nogueira
Atualizado em 24 out 2022, 15h56 - Publicado em 24 out 2022, 15h56
depressão
Pesquisas estimam aumento de 25% nos transtornos de ansiedade e depressão depois da pandemia de Covid-19.  (Foto: Tomás Arthuzzi/SAÚDE é Vital)
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Nunca antes na história desse planeta o tema da saúde mental esteve tão presente na mídia, nas empresas, nas casas e até nas conversas do bar da esquina. Realmente é de se perguntar se estamos diante de uma preocupante crise, impulsionada pela pandemia.

Há uma epidemia de sofrimento mental por aí? Em resposta à questão, vamos aos fatos.

Existe uma crise de saúde mental em curso, e quem diz isso é a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Ela aponta que uma em cada quatro pessoas em nosso país sofre de transtornos de ansiedade, fazendo do povo brasileiro o mais ansioso do mundo.

Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), em seu recém-lançado Relatório Mundial de Saúde Mental, revelam que uma em cada oito pessoas pelo globo já padeciam com algum sofrimento mental diagnosticável até 2019. A pandemia piorou esse cenário. O número de indivíduos com ansiedade e depressão subiu cerca de 25% só no primeiro ano da crise.

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Mas, para além das marcas deixadas pelo coronavírus no mundo, o agravamento da nossa condição de saúde mental e a piora do bem-estar psíquico já eram uma tendência no início deste século. E representa uma confirmação de que estamos falhando de maneira incontestável na produção e no entendimento de quem somos, de nossas vidas, de nossa humanidade.

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Parte do problema está na pouca valorização da questão em si: a saúde mental recebe, em média, apenas 2% de todo o orçamento destinado à saúde pelo planeta.

Somos produtos do mundo que criamos, das relações que permeiam nossas vidas. Da mesma forma, produzimos o mundo e criamos novas formas de nos relacionarmos. Somos criaturas e criadores. Corresponsáveis pelos sofrimentos dos quais a nossa sociedade padece.

Alguns dos sofrimentos mais comuns hoje em dia se organizam em torno do mito da liberdade contemporânea. Trata-se de uma liberdade muito particular que, por um lado, nos permite empreender e inovar, exigindo que cada um de nós seja um sujeito de alto desempenho. Mas, por outro, vem acompanhada e pressionada pela precarização das condições de vida e trabalho.

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Isto é, temos um sujeito que vive livre, porém desprotegido. Nesse desenho de mundo, o sofrimento é fundante e parte constitutiva de sua mitologia.

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As histórias que contamos falam muito de quem somos. Nos achamos muito livres mesmo quando somos ultracoercitivos contra nós mesmos em nome do melhor desempenho. No campo das disputas discursivas, soluções medicamentosas e comportamentais dominam as narrativas.

Elas têm o mérito de serem extremamente incisivas no trabalho de contenção e gestão de riscos e estragos produzidos em nossa mente pela mesma sociedade que criamos. Contudo, contribuem para a construção dessa mitologia em que os heróis são marcados por altíssimo desempenho, sofrimentos psíquicos profundos e mentes anabolizadas.

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Portanto, para superarmos essa crise, além do evidente aumento do investimento em saúde mental, precisamos quebrar o ciclo que nos faz pensar que o bem-estar emocional é apenas uma ferramenta de adaptação do nosso herói a um mundo que o condena e o faz sofrer.

A tarefa é histórica, posto que ter saúde mental, o que por vezes implica simplificar e ressignificar as nossas relações conosco, com os outros e com o mundo, se converte em uma condição sine qua non para nos cuidarmos de fato, realizarmos nossas potências e buscarmos a felicidade.

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