Tratamento inovador para calvície pode ajudar pessoas com diabetes tipo 1
Remédio usado contra alopecia areata, uma doença autoimune que causa perda de cabelo, pode ajudar a controlar a glicemia de diabéticos do tipo 1. Por quê?
Para você entender o motivo pelo qual um medicamento para uma versão de calvície foi testado – com sucesso até agora – contra o diabetes tipo 1, peço um minuto de sua atenção de modo a fazer algumas explicações.
A primeira: no diabetes tipo 1, o próprio sistema imunológico dispara anticorpos e células de defesa contra as chamadas células beta do pâncreas, que produzem insulina. Resultado: esse hormônio fica em falta no corpo e, sem ele, os níveis de açúcar no sangue sobem.
A segunda: não sabemos ao certo o motivo pelo qual o sistema imunológico, cuja principal função é nos defender de vírus, bactérias, fungos e outras ameaças, resolve se virar contra as células beta. Mas o fato é que isso acontece, o que significa que o diabetes tipo 1 é uma doença autoimune.
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E a terceira: o tratamento medicamentoso padrão do diabetes tipo 1 consiste em aplicações de insulina – junto com alimentação saudável, exercícios físicos regulares, monitorização da glicose e muita informação. Sem insulina, a doença se torna letal em dias ou semanas.
No dia 6 de dezembro de 2023, foi publicado um interessante estudo australiano na revista The New England Journal of Medicine avaliando os efeitos endocrinológicos de um medicamento que bloqueia o sistema imunológico – o baricitinibe.
Este remédio ficou famoso em novembro de 2023 por ter sido aprovado no Brasil contra um tipo autoimune de calvície – a alopecia areata moderada a grave. Ele também é indicado para casos específicos de artrite reumatóide – outra doença autoimune.
Ou seja, é uma opção promissora contra certas doenças autoimunes? Seria o diabetes tipo 1 outra?
Neste estudo de fase 2, foram incluídas 91 pessoas com idade média de 18 anos e diabetes tipo 1 diagnosticado antes de 100 dias, o que é muito precoce. Metade dos voluntários fez o tratamento padrão, enquanto a outra metade fez o mesmo tratamento padrão e ainda tomou comprimidos diários de baricitinibe (a dosagem era de 4 miligrama). E o que aconteceu ao final de um ano?
Por meio de exames, notou-se que aqueles que utilizaram baricitinibe viram o pâncreas produzir mais insulina do que o outro grupo. Isto se traduziu em um menor “sobe-e-desce” da glicose e uma tendência a menores doses de insulina sendo aplicadas no organismo.
Mas atenção: nenhum dos participantes se livrou por completo das aplicações de insulina.
De uma maneira geral, os efeitos colaterais do baricitinibe foram pouco frequentes e de leve intensidade, mostrando elevada segurança.
Vale lembrar que o Brasil é pioneiro na modulação da autoimunidade usando-se de quimioterapia associada a células-tronco da medula óssea das próprias pessoas com diabetes tipo 1 recém-diagnosticadas.
Os estudos de fase 1 e 2 liderados pelo saudoso cientista, nosso amigo e professor Júlio Voltarelli mostraram que cerca de 90% dos indivíduos ficaram livres de insulina por períodos que variaram de seis meses a 14 anos. Tenho alegria de ter participado de alguns desses trabalhos.
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A diferença de resultados destes dois estudos talvez seja a intensidade da imunossupressão. No caso brasileiro, a quimioterapia suprime enormemente o sistema imunológico, porém às custas de maiores riscos e efeitos colaterais.
Já o baricitinibe é um tratamento seguro, porém com eficácia inferior, quando comparamos cada estudo isoladamente.
Com os resultados deste estudo de fase 2 com baricitinibe, abre-se uma enorme porta para as pesquisas de fase 3, que envolvem um número maior de pessoas com diabetes tipo 1 e um acompanhamento mais longo. Vamos aguardar.