Telessaúde e câncer: uma questão humanitária
Atendimento à distância ajuda na manutenção do tratamento e no acompanhamento da evolução do paciente
O tratamento do câncer requer um olhar multidisciplinar. Além dos avanços da própria oncologia, os pacientes precisam do suporte de profissionais de áreas como nutrição, psicoterapia, odontologia e outras, que demandam mais investimentos, tempo e locomoção.
Quando analisamos a rotina complexa e a realidade de um paciente oncológico, percebemos o quanto a regulamentação da telessaúde no país, recentemente conquistada através da Lei 14.510/2022, pode humanizar processos. Permitir o cuidado à distância melhora a autoestima e também a qualidade de vida.
Quem convive com o câncer sabe que, infelizmente, essa é uma doença capaz de debilitar o corpo, ao mesmo tempo em que interfere diretamente em aspectos emocionais, sociais, financeiros e familiares.
No auge do tratamento, seja por rádio ou quimioterapia, a imunidade é observada de perto e, em muitos casos, o isolamento torna-se obrigatório. É nesses momentos que a telemedicina pode auxiliar, por exemplo, na manutenção de terapias e consultas.
Além disso, há os casos em que essa se torna a alternativa mais viável e eficiente, especialmente para quem reside em áreas remotas e precisa se deslocar por quilômetros, de carro ou até mesmo de balsa.
Vivi casos de câncer na minha família. Essa vivência pessoal faz com que o meu olhar, dentro do setor de tecnologia para a saúde, esteja conectado com o das pessoas. Eu diria que é desumano não usar a telessaúde no tratamento de pacientes oncológicos.
Agora, que existe um entendimento político, social e legal a respeito do tema, é nosso dever fomentar o uso dessa ferramenta para o bem, nos casos mais sensíveis, no socorro a quem mais precisa de atenção.
Situação alarmante
Com o avanço do câncer, ao menos a conscientização de gestores começa a ganhar corpo. O próprio Instituto Nacional do Câncer (Inca) divulgou que cerca de 2 milhões de brasileiros poderão ser diagnosticados com tumores até 2025. Isto é: poderemos conviver com 704 mil novos casos de câncer por ano.
Os dados assustam, mas, mais do que isso, representam pessoas, famílias e histórias de vida. E essa análise torna-se ainda mais comovente, quando observamos o recorte do segmento infanto-juvenil e o impacto da desigualdade.
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Hoje, crianças e jovens do Norte e do Nordeste têm menos chance de sobreviver ao câncer — algo próximo de 40%, segundo o Inca —, simplesmente porque nasceram e vivem em regiões onde o atendimento de alta complexidade não existe ou é terrivelmente escasso.
Não podemos aceitar que, em pleno ano de 2023, percamos a oportunidade de ver uma criança crescer e ter um futuro brilhante, por diferenças geográficas, sociais e financeiras.
Próximos passos para a expansão
A segurança jurídica que a Lei 14.510/2022 traz impulsiona o trabalho daqueles que acreditam na saúde pública, na democratização do acesso e na ampliação dos diagnósticos precoces.
A telemedicina está aí desde a pandemia, provando ser um modelo compatível à heterogeneidade da saúde brasileira, sem desmerecer outros avanços já conquistados até aqui. A tecnologia une os melhores especialistas e essa conexão deve cumprir o seu propósito. Temos que chegar, de fato, lá na ponta, em que realmente precisa.
Por isso, é tão importante perseguir a missão de investir cada vez mais em modernização, segurança da informação e formação. Quanto mais qualificados forem os profissionais e os serviços de saúde, mais bem aproveitados serão os recursos humanos e financeiros dos hospitais e clínicas.
O câncer não escolhe hora, não respeita planos e não dá trégua. Mas, bem articulados e com soluções de ponta como a telessaúde, seremos capazes de vencer esse grande desafio, de forma mais justa, resolutiva e, principalmente, humanitária.
*Jihan Zoghbi, é cientista da computação e CEO da startup Dr. TIS