“Eu me amo, eu me amo, não posso mais viver sem mim”, diz o hit do Ultraje a Rigor, que embalou os anos 1980. Curiosamente, essa pode ser uma canção suportada pela ciência.
Em um estudo, o cientista Mark Alicke, da Universidade de Ohio (EUA), pediu para um grupo de pessoas julgarem a si mesmas em 40 características de personalidade. Elas também deveriam dar suas opiniões sobre a personalidade da média da população, usando uma escala entre 0 e 8.
Como os participantes se classificaram a si mesmos e aos outros em características como cooperação, lealdade e disciplina? E como seriam os julgamentos sobre falsidade, desonestidade e irresponsabilidade?
Para a surpresa de Alicke, os participantes acreditavam ter uma personalidade superior à das demais pessoas em 38 das 40 características. Ele nomeou esse fenômeno como o Efeito Melhor Que a Média.
Da mesma forma, 87% dos estudantes de MBA da Universidade Stanford (EUA) julgam ter melhor desempenho do que a média. Os CEO’s julgam ser mais éticos que seus pares, enquanto estudantes de administração e presidentes de empresas acreditam ter habilidades gerenciais melhores que os demais.
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Já casais crêem que seus riscos de divórcio são inferiores aos de outros, universitários julgam ter mais chances do que a média de viver acima dos 80 anos de idade, motociclistas pensam que vão causar menos acidentes do que os demais… Até 94% dos professores universitários acreditam ter habilidades de ensino superiores aos colegas e cidadãos deixam de se vacinar por acreditarem ter menos chances do que a média de contrair gripe.
Não é fácil perceber, mas existe um problema nesses julgamentos: é estatisticamente impossível que a maioria das pessoas seja melhor do que a maioria.
Alicke foi um dos cientistas que refinou as evidências de um fenômeno conhecido como viés do autointeresse: a necessidade das pessoas em manter uma imagem positiva de si mesmas. Em outro estudo, ele pediu para os participantes analisarem as chances de eventos negativos acontecerem com eles e com outras pessoas.
Em 19 dos 24 eventos, os participantes acreditavam ter menos chances do que os outros em sofrer com alcoolismo, doenças sexualmente transmissíveis, ataque cardíaco e demais acontecimentos negativos. O nosso desespero por manter o ego elevado não somente viola as regras da estatística, como nos ilude de que a vida nos trará apenas momentos positivos.
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Manter uma imagem positiva de nós mesmos é importante para o bem-estar. No entanto, esse desejo também pode fazer com que as pessoas deixem de buscar por novos conhecimentos, negligenciem sua saúde, pratiquem sexo inseguro, dirijam depois de beber, não se vacinem e tenham outras atitudes perigosas.
Por essas razões, uma das principais habilidades que devemos cultivar é a humildade intelectual: reconhecer que nossas crenças podem estar erradas, permanecendo com a mente aberta para mudar de opinião e buscar novos conhecimentos.
O cientista Carl Sagan dizia que a verdade dolorida é melhor do que a fantasia confortante. Se você concorda com a frase, mas acha que as demais pessoas não estão cientes disso, leia o artigo novamente.
*Luiz Gaziri é professor de ciências comportamentais, palestrante e autor de A Arte de Enganar a Si Mesmo (clique para comprar).