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Acabar com as desigualdades para superar a aids e futuras pandemias

Especialistas lançam novo conselho global para construir políticas capazes de mitigar as desigualdades sociais e seus impactos na saúde pública

Por Winnie Byanyima, diretora do UNAIDS, e Sir Michael Marmot, epidemiologista*
6 jun 2023, 10h35
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Desigualdades entre grupos e nações são um dos fatores que limitam erradicação da Aids no planeta.  (Foto Veja Saúde/SAÚDE é Vital)
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A crise da Covid-19 tem demonstrado o perigo das pandemias. E crises sociais como esta deixam claro o perigo representado pelas desigualdades. A realidade é que os surtos se tornam pandemias em grande medida devido às desigualdades.

A boa notícia é que ambas podem ser superadas – se forem confrontadas como uma coisa só.

Os avanços científicos e médicos no tratamento e na prevenção do HIV já deveriam ter nos levado ao ponto de acabar com a aids. Infelizmente, entretanto, embora o número de novas infecções por HIV esteja caindo rápido em muitos países, ainda está crescendo em dezenas de outros.

O resultado é que a meta de acabar com a aids como ameaça à saúde pública até 2030 está em risco. O motivo: as desigualdades econômicas e sociais dentro dos países e entre eles continuam bloqueando o acesso das pessoas aos serviços de resposta ao HIV que salvam vidas.

Permitir que as desigualdades sigam crescendo acaba impulsionando surtos e epidemias e prolongando situações de emergência que esgotam as economias e os sistemas de saúde.

A consequência é que nos tornamos todos e todas vulneráveis à próxima pandemia, enquanto países inteiros e comunidades ficam em perigo.

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Em muitas partes do mundo, testemunhamos decisões políticas que acabam resultando no aumento das desigualdades e, em alguns casos, até as exacerbam deliberadamente.

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No âmbito global, quando países ricos investem rapidamente bilhões de dólares em suas próprias respostas médicas e sociais, deixando outros países em nível de endividamento tão alto que não têm espaço fiscal para fazer o mesmo, isso compromete a capacidade de o mundo combater a aids e outras doenças.

Durante a Covid-19, enquanto países ricos injetavam bilhões de dólares para combater a pandemia, quase metade de todos os países em desenvolvimento reduziram os gastos com saúde – e cerca de 70% reduziram os gastos com educação.

Vírus não respeitam fronteiras. Então, quando as vacinas, medicamentos e testes destinados a combater esses vírus vão de forma excessiva para países poderosos, enquanto outros têm pouco ou nada e são impedidos de produzir seus próprios medicamentos, a consequência é a perpetuação de pandemias em todos os lugares.

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Assim como ocorreu com as vacinas para a Covid-19, algo semelhante tem acontecido com o vírus Mpox.

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Nos últimos anos, o número de mortes pela infecção na República Democrática do Congo, por exemplo, foi o dobro do resto do mundo combinado, mas até o momento nenhuma vacina para o Mpox foi entregue ao país africano.

Os determinantes sociais e legais que tornam as pessoas vulneráveis a pandemias precisam ser abordados. Globalmente, quase 5 mil mulheres jovens e adolescentes são infectadas pelo HIV a cada semana.

Desmantelar as barreiras que dificultam ou impedem o acesso a serviços de saúde sexual e reprodutiva, investir na educação e combater a violência de gênero são elementos necessários para remover as desigualdades e resguardar a saúde desse público.

Leis que criminalizam e marginalizam comunidades LGBTQIA+, profissionais do sexo e pessoas que usam drogas enfraquecem abordagens de saúde pública e prolongam pandemias, como a da aids.

Em países da África Subsaariana nos quais relações entre pessoas do mesmo sexo são criminalizadas, a prevalência do HIV é cinco vezes maior entre homens que fazem sexo com outros homens em comparação com países onde as relações entre pessoas do mesmo sexo não são criminalizadas.

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Mesmo nos países que estão fazendo progresso substancial contra o HIV, os avanços podem não ser compartilhados de forma igual.

+ LEIA TAMBÉM: Desigualdade racial impacto no envelhecimento dos negros

No Brasil, por exemplo, as infecções por HIV estão diminuindo drasticamente entre a população branca à medida que o acesso ao tratamento é ampliado e novas ferramentas de prevenção, como a PrEP, são implementadas. Essa é uma ótima notícia e mostra o que pode ser alcançado.

No entanto, as infecções por HIV entre a população negra ainda estão aumentando. Uma situação semelhante ocorre nos Estados Unidos, onde homens brancos gays têm maior probabilidade de ter acesso aos cuidados de saúde e se prevenir.

Ressaltamos que não é apenas o acesso aos cuidados de saúde que perpetua essas desigualdades, mas também os determinantes sociais, que aumentam o risco de infecção.

Fortalecimento das comunidades e trabalho em rede

Para superar as desigualdades no acesso a serviços essenciais, as comunidades devem ser fortalecidas para exigir seus direitos.

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O movimento de organizações sociais e de coletivos que atuam com o tema da aids é um dos melhores exemplos de como grupos de pessoas que experimentam desigualdades interseccionais podem se unir para superá-las, salvando milhões de vidas.

Sucessivas grupos e comissões que estudaram temas relacionados aos determinantes sociais da saúde reuniram evidências sobre como as condições em que as pessoas nascem, crescem, vivem, trabalham e envelhecem são influências poderosas para essa busca pela equidade.

Por isso, nos próximos meses vamos juntar especialistas globais das áreas acadêmica, governamental, da sociedade civil, do desenvolvimento internacional e da economia criativa para construir um Conselho Global sobre Desigualdades, AIDS e Pandemias, a fim de promover soluções baseadas em evidências para as desigualdades que impulsionam a aids e outras pandemias.

O Conselho Global reunirá especialistas de campos distintos como economia, epidemiologia, direito e política. Incluirá, também, ministros, prefeitos, ex-chefes de estado, pesquisadores e clínicos, especialistas em segurança de saúde, além de lideranças comunitárias e ativistas de direitos humanos.

A iniciativa visa reunir evidências essenciais para o trabalho dos formuladores de políticas públicas, de forma a elevar a atenção política para a necessidade de ação.

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Ainda mais fundamental: vai ajudar a equipar a linha de frente de atuação das comunidades que lutam por suas vidas com recursos de advocacy, fornecendo-lhes o que precisam para influir nas mudanças políticas e de poder.

Não é sem razão que o Conselho Global está sendo lançado no Brasil. O país é um exemplo dos desafios representados pelas desigualdades interseccionais e os movimentos sociais têm sido pioneiros em enfrentá-las.

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O novo governo, sob a liderança do presidente Lula, comprometeu-se a combater as desigualdades no Brasil e no mundo.

Para dar uma resposta efetiva às pandemias de amanhã, precisamos de abordagens que acabem com as desigualdades nas pandemias de hoje.

As lideranças mundiais enfrentam agora uma escolha clara: ficar de braços cruzados, enquanto os perigos aumentam, ou unir-se para combater as desigualdades a fim de que tenhamos um mundo não apenas mais justo, mas também mais seguro.

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* Winnie Byanyima é diretora-executiva do UNAIDS e subsecretária-geral da ONU; Sir Michael Marmot é professor de epidemiologia do University College London (UCL) e diretor do Instituto de Equidade em Saúde do UCL. Ambos são membros fundadores do Conselho Global sobre Desigualdades, AIDS e Pandemias 

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