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O médico e CEO do A.C. Camargo Cancer Center, Victor Piana de Andrade, e outros experts da instituição desfazem os mitos e compartilham as descobertas e inovações na prevenção, no diagnóstico e no tratamento do câncer
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Existe mesmo uma epidemia de câncer entre jovens?

Médico explica o que contribui para a doença aparecer cedo e conta como se proteger

Por Victor Piana de Andrade
Atualizado em 31 out 2022, 18h13 - Publicado em 7 out 2022, 15h25

Em qualquer idade o diagnóstico de câncer é uma notícia devastadora, tanto para o paciente como seus familiares. Mas, quando ocorre antes dos 40 anos, surpreende ainda mais.

Vale esclarecer que a idade é o fator de risco mais forte para a doença, e esperamos que ela ocorra em indivíduos acima dos 60 anos. Contudo, andamos intrigados com a maior frequência de casos em pacientes antes dos 50 anos e nos perguntamos: será que estamos diante de uma epidemia de câncer em jovens?

A resposta é sim. Essa é a conclusão que temos com dados da Globocan, iniciativa da Organização Mundial de Saúde (OMS), que compara dados de 2012 e 2020. Os diagnósticos dos cânceres de mama, tireoide, endométrio, próstata, colorretal, rim e outros têm aumentado sistematicamente em todos os continentes em pacientes entre 20 e 49 anos.

Há diversos fatores envolvidos nisso. Em alguns deles podemos interferir para proteger os jovens (e também os idosos):

1. O câncer é causado pelo acúmulo de mutações genéticas ao longo da vida. E essas são causadas por fatores de risco ambientais, muitos deles evitáveis, como fumar, consumir álcool e se expor excessivamente ao sol. Os jovens precisam ser conscientizados sobre isso.

2. O risco não é igual para todo mundo. Nosso corpo possui genes que atuam na correção das mutações citadas acima e, por isso, muitos de nós nunca teremos câncer. Mas esses genes protetores não têm a mesma eficiência em todos. Algumas famílias e indivíduos com predisposição genética ao câncer têm falhas nesse sistema.

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3. Estamos fazendo muito mais exames do que antes e, dessa maneira, detectamos mais cânceres. Alguns deles não têm significado clínico, ou seja, jamais causariam alterações na longevidade ou qualidade de vida. Queremos descobrir os tumores cujo tratamento precoce beneficiará os pacientes.

Ainda faltam algumas peças no quebra-cabeças, e a ciência promete resolvê-los. Mas já podemos fazer muito com base no que aprendemos nos últimos anos – e os benefícios vão muito além da proteção contra o câncer.

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A exposição a fatores de risco

Ela tem acontecido cada vez mais cedo. Só que podemos mudar essa realidade. Até porque as mutações no DNA levam décadas para se acumular, transformando as células normais em um câncer.

Essas mutações são causadas por diversos agressores presentes no nosso meio ambiente, como fumo, álcool, luz ultravioleta, radiações, poluição, alguns vírus e bactérias, além de alterações metabólicas associadas à obesidade e ao consumo de alimentos processados, ricos em gorduras saturadas e açúcares.

Por outro lado, há bons hábitos que nos protegem, a exemplo de atividade física regular, consumo de alimentos frescos e ricos em fibras – como frutas e verduras–, ter filhos em idade jovem, amamentar um bebê e se vacinar contra o HPV e as hepatites A e B. Além disso, também é possível prevenir tumores relacionados a hepatite C por meio de tratamentos antivirais disponíveis no SUS.

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Tudo parece ao nosso alcance, mas a realidade é bem diferente. O consumo de álcool per capita aumenta a cada década e o fumo persiste, agora disfarçado em cigarros eletrônicos, que garantem um volume crescente de viciados em nicotina.

A idade média de início do diabetes era 52 anos na década de 1980 – nos últimos anos, a doença tem aparecido aos 46 anos. A vacinação tem sido questionada. Fórmulas artificiais estão substituindo a amamentação cada vez mais.

Estudos também já associaram a obesidade materna durante a gestação e o peso ao nascer ao risco aumentado de câncer em pacientes jovens. Ser uma criança obesa e sedentária aumenta a probabilidade de ter diversos tipos de tumores na vida adulta, inclusive na juventude.

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Vale destacar ainda o papel da microbiota. O corpo humano é habitado por diversas bactérias que mantêm um equilíbrio dinâmico e regulam vários processos metabólicos e imunológicos no nosso organismo. A alteração desse conjunto de bactérias do nosso corpo leva a doenças agudas e crônicas, e eventualmente a danos celulares que evoluem para o câncer.

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Para ter ideia, há evidências do papel do desequilíbrio no microbioma em 14 tipos tumorais do trato gastrointestinal, incluindo boca, laringe, faringe, esôfago, estomago, pâncreas, vias biliares, fígado e colorretal.

O uso indiscriminado de antibióticos é um dos principais fatores que modificam nosso microbioma e podem desregular o equilíbrio natural, favorecendo tanto o surgimento quanto a velocidade de crescimento do câncer.

Fatores de risco assim (e tantos outros) precisam ser conhecidos, e as boas práticas devem ser bem comunicadas, incentivadas, valorizadas e implementadas. Mas essencialmente é a consciência individual que fará bem aos jovens e aos idosos. O câncer será cada vez mais frequente entre nós se não olharmos para essas situações.

Campanhas de hábitos saudáveis desde a infância seguramente ajudarão a reduzir o risco populacional para a doença – entre pacientes jovens e também entre os mais idosos. Outras medidas recomendadas pela OMS e que podem fazer muita diferença são alterações na cadeia de produção e distribuição que favoreçam o consumo de alimentos frescos, além de taxação de cigarros e bebidas alcoólicas e adoçadas.

+ LEIA TAMBÉM: As lições que aprendemos com a Covid-19 para o cenário do câncer

Acompanhamento próximo

A maioria dos procedimentos para detectar precocemente o câncer tem início aos 40 anos – isso porque o câncer é mais frequente após os 55 anos.

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Quando um tumor aparece antes dos 40 anos, em especial numa família com vários indivíduos afetados, acende o alerta de que podemos estar diante de um paciente portador de deficiência na função de alguns genes que reparam as mutações do DNA.

Para confirmar isso, precisamos estudar o DNA das pessoas diagnosticadas com o câncer na família e, caso alguma mutação seja detectada, o exame deve ser ampliado para quem ainda está livre da doença. Ou seja, famílias portadoras de síndromes genéticas precisam ser identificadas e monitoradas de forma personalizada.

Há diversas mutações envolvidas nessas síndromes de predisposição ao câncer, como a mutação do gene BRCA, que aumenta o risco das famílias para os cânceres de mama e ovário.

Já uma mutação no TP53 eleva a probabilidade de vários tumores raros. O CDK4 tem envolvimento no câncer de pâncreas e no melanoma. Portadores de mutações genéticas como essas necessitam de uma rotina diferente de rastreamento da doença e atenção redobrada aos hábitos saudáveis.

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Os estudos nos ensinam que 10 a 12% do câncer de mama, 16 a 20% dos cânceres colorretais, 18% dos tumores de endométrio e até 43% dos tumores de próstata que ocorrem em pacientes jovens têm variantes genômicas de alta penetrância que poderiam ser detectadas, prevenindo, assim, o câncer.

O médico oncogeneticista é o especialista mais bem capacitado para essa investigação e o seguimento dos indivíduos com alto risco do câncer familiar.

Quando rastrear

Diante do medo das doenças, estamos fazendo mais exames em todas as idades, e sem uma estratégia científica. Com isso, é esperado que esses exames detectem tumores pequenos e iniciais – alguns sem influência para os pacientes.

De uma forma populacional, sem uma individualização, temos alguns direcionamentos. O câncer do colo uterino, que está associado ao HPV, por exemplo, deve ser rastreado junto com o início da atividade sexual.

Já o rastreamento do câncer de mama se faz com mamografia. Esse exame deve começar a ser realizado aos 40 anos. Aos 45 anos temos o início da colonoscopia e a dosagem de PSA para o câncer de próstata.

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Aos 50 anos é indicada a tomografia de baixa dose nos pulmões para os fumantes. Estes tumores são frequentes e, por isso, os métodos disponíveis para detectá-los são considerados custo-efetivos e devem ser feitos mesmo sem qualquer sintoma.

Por outro lado, há muitos tumores para os quais o rastreamento não está indicado. E os motivos podem ser diversos: porque a detecção daquele câncer é muito rara; porque o crescimento do tumor é rápido e poderia acontecer entre os exames anuais; ou mesmo porque o câncer é tão indolente que é melhor aguardar para detectá-lo quando trouxer algum sintoma.

Observar para investigar

Todos nós devemos conhecer nosso corpo e estar a atento a mudanças em qualquer idade, porque ali estão os sinais e sintomas que não devem ser ignorados: manchas novas na pele ou mudanças nas antigas; sangramentos de qualquer natureza; feridas que não cicatrizam na boca, na língua e nas áreas genitais; fraqueza; emagrecimento; e dor sem causa aparente.

Esses são alguns exemplos que precisam ser investigados o quanto antes. Conversar com o seu médico anualmente já é útil para avaliar alterações de risco para cada idade.

O câncer da tireoide é um caso de tumor que aparece com alta frequência em pacientes jovens, e está muito associado ao excesso de exames do mundo moderno.

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Ora, não há indicação para rastreamento populacional de nódulos tireoidianos, mas a maioria deles é diagnosticado assim. Só que aguardar o nódulo ser palpável para investigar é seguro, afinal, mesmo quando comprovadamente maligno, seu comportamento é indolente ou benigno. Nódulos malignos de até 1 centímetro na tireoide, sem metástases (quando se espalha para outros órgãos), muitas vezes nem precisam de tratamento.

Eles podem ser vigiados ativamente pelo médico especialista com tratamento apenas quando o tumor passar de 1 centímetro ou mostrar gânglios acometidos. E a maioria nunca passa.

Países que implementaram ultrassom como rotina de rastreamento da tireoide viram a frequência do tumor subir até 30 vezes, mas sem alterações na mortalidade. Na verdade, houve uma possível piora na qualidade de vida dos afetados pela cirurgia, com seus efeitos adversos e controle hormonal posterior.

A vigilância ativa, aliás, é uma opção também em caso de pacientes idosos, frágeis, portadores de tumores indolentes ou de baixo risco da próstata, nódulos pulmonares e outros órgãos.

Essa conduta desafia a cultura de sempre tratar os tumores, mas profissionais com larga experiência sabem pesar o risco de progressão da doença e o benefício do tratamento. No exterior e no Brasil, mais e mais pacientes aceitam a vigilância ativa para preservar sua qualidade de vida no caso de tumores indolentes.

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E o futuro?

Há ainda muito espaço para pesquisas que ajudem a compreender o câncer em pacientes jovens – no contexto étnico, de gênero e da globalização dos hábitos. Estudos prospectivos que avaliem o papel dos hábitos saudáveis necessitam da colaboração dos pais e adolescentes para coleta rigorosa de dados.

As informações que se acumulam nos prontuários eletrônicos, se sistematizadas, podem ajudar com o auxílio da bioinformática. A genômica de larga escala também pode facilitar o entendimento do papel das variantes patogênicas, da influência poligênica e da epigenética no desenvolvimento do câncer e as causas das mutações que levaram a cada tumor em cada paciente.

Precisamos fazer a prevenção certa e o exame adequado para o risco de cada pessoa. A personalização da prevenção baseada na individualidade – tanto de riscos como de hábitos – e na consciência das pessoas tem o potencial de reverter o quadro crescente do câncer no mundo

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