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Informação simples sobre saúde é chave para o engajamento no autocuidado

Em entrevista, especialista explica o conceito de letramento em saúde e a importância da comunicação eficaz no contexto da autogestão de cuidados

Por Abril Branded Content
2 Maio 2024, 09h00

Letramento e educação em saúde são expressões cada vez mais presentes quando se trata da comunicação capaz de promover o empoderamento das pessoas em relação a seu próprio bem-estar e qualidade de vida.

Entre os focos do Prêmio Autocuidado em Saúde ACESSA, comunicação e autoconhecimento formam a base de uma das categorias contempladas, a que busca reconhecer projetos com potencial para capacitar os indivíduos a obter, processar e entender informações básicas para tomar decisões sobre saúde apropriadas.

O conhecimento é também primordial para o Uso Racional de MIPs e outros Produtos, nome de outra categoria da premiação, esta voltada a destacar iniciativas que propiciem não apenas o uso correto de medicamentos isentos de prescrição, mas também produtos e serviços que facilitem toda a jornada do autocuidado – a exemplo de autotestes, dispositivos tecnológicos de automonitoramento, assim como suplementos alimentares e dermocosméticos.

Para entender melhor esses conceitos e sua importância no engajamento da população em torno do autocuidado, entrevistamos o médico Rogério Malveira, que estuda o tema há 11 anos. Rogério é médico de família e comunidade pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e mestre em saúde pública pela Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Malveira é também um dos jurados do Prêmio Autocuidado em Saúde ACESSA, hoje em sua terceira edição.

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Letramento em saúde é chave para o autocuidado
Rogério Malveira, médico de família e comunidade pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e mestre em saúde pública pela Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). (Samhouse (@samhouseprod)/Divulgação)

Como criador do Pulsares, plataforma que tem como objetivo simplificar a linguagem e as instruções de receitas médicas, poderia explicar a importância da comunicação do ponto de vista das decisões sobre saúde e os entraves que dificultam o entendimento da população?

Todo o processo de saúde acontece por meio da troca de informação, seja escrita, falada ou mesmo por gestos e símbolos. Sendo o ser humano um ser social que se comunica e saúde um aspecto inerente à vida, saúde é comunicação e vice-versa. Só há saúde onde existe comunicação eficiente, todo fazer saúde é comunicativo. E, mais que isso, saúde envolve aprender informações e aplicar mudanças, ou seja, é um processo educacional. Profissionais de saúde são mediadores de conhecimento, o que infelizmente não é uma visão disseminada. Além desse, o desafio na comunicação e saúde reside em quatro pontos principais: 

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– O excesso informacional em que vivemos, quando há muitas informações verídicas e falsas. Em uma edição de jornal impresso, por exemplo, há a mesma quantidade de signos a que uma pessoa era exposta durante a Idade Média. Como navegar nesse mar informacional? 

– O conhecimento tecnológico e científico avançou mais que a disseminação eficiente desse conhecimento, o que gerou abismos de compreensão entre as pessoas. Para quem o conhecimento é produzido e com que interesse? A quantidade supera a qualidade.

– A hierarquia de poder nas relações na área da saúde que ainda permanece. A vergonha é a grande barreira na comunicação. Quantas pessoas sentem-se confortáveis em dizer que não entenderam algo a um profissional de saúde? 

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– A sobrecarga assistencial e de trabalho, na qual não há espaço para profissionais estarem atentos de fato para a comunicação. Se não há espaço de autocuidado e reflexão, não há como brotar um cuidado humano.

Qual a melhor definição para letramento em saúde e os principais desafios enfrentados para a disseminação e aplicação desse conceito?

Há muitas definições para o termo. Gosto de dizer que letramento em saúde (LS) é verbo, ação, se conectar com a realidade que acontece, e não somente com o que quero. O que a pessoa faz com aquilo que eu comunico? O que eu compreendo do que essa pessoa me traz? É alinhar as pessoas envolvidas num processo de saúde. Baseado na definição de Sorense de 2012, LS é como as pessoas acessam, avaliam, interpretam e aplicam as informações sobre saúde para manter ou melhorar a sua qualidade de vida. Mas esse processo não é individual. As instituições de saúde (hospitais, clínicas, indústrias e qualquer órgão que produza informação em saúde) participam, tanto que há o letramento organizacional em saúde: como as organizações apoiam o LS. Importante notar que se fala aqui de saúde em sua visão ampliada, não somente tratar doenças, mas promover saúde e qualidade de vida. O LS envolve qualquer situação e contexto de saúde. Não é somente sobre o que eu digo, mas como o outro o recebe e o que faz com isso – muda algum hábito? Reforça uma atitude? É entender que quantidade sem qualidade e checagem não muda realidade, só atinge indicador. O objetivo do cuidado envolve atingir um entendimento em comum, não só informar e falar de um assunto. É mais que ensinar – do latim insignare, colocar uma marca –, é aprender.

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Acredito que a melhor definição depende de quem pergunta. Para um gestor, por exemplo, pode-se dizer que considerar o letramento em saúde reduz custos e gera melhores desfechos em saúde. Para um profissional formal de saúde, pode-se dizer que considerar o LS aumenta a adesão ao tratamento e torna o tempo de consulta mais efetivo. Para pessoas que buscam o cuidado em saúde (paciente), o LS representa autonomia, empoderamento e segurança. E para um profissional que produz rótulos, embalagens ou campanhas, o LS aumenta o engajamento com o produto.

Dentro do LS há técnicas e estratégias ditas “letradas”, ou seja, que propiciam a realização do LS. O desafio é que pouco ainda se fala dessas técnicas e do próprio termo. Até 2017, menos de 40 estudos sobre o tema existiam no Brasil – por mais que aqui tenhamos a Educação Popular em Saúde, que guarda relação com o LS. Falar de LS envolve mudar cultura e hábitos, compartilhar o poder das decisões, e aí reside o desafio. O quão preparados estamos para mudar algo que há séculos acontece a partir de uma mesma lógica? 

De maneira geral, os profissionais de saúde estão preparados para uma comunicação mais eficaz e humanizada? 

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De maneira geral não, mas a mudança acontece. Por muitos anos nas faculdades de saúde – especialmente a médica –, predominou o paradigma biomédico, que tem ligação com o paradigma cartesiano, em que o foco é o biológico. Esse paradigma estabelece relação com o modelo de comunicação da agulha hipodérmica, no qual o profissional assume que a informação vai penetrar na pessoa, como uma agulha, e ela vai assimilá-la da mesma forma que foi pensada. Na década de 1950, houve a crise da medicina, e ganhou força o paradigma biopsicossocioespiritual, que valorizou os fatores que o paradigma biomédico negligencia. Nesse paradigma “novo” – mas na verdade antigo e esquecido –, o biológico é parte de uma rede maior e complexa, e não somente único e hegemônico. O modelo de comunicação passa a abranger outros elementos e é entendido como partes que chegam a um entendimento em comum. É uma lógica parecida com o paradigma clássico newtoniano e o paradigma quântico. Dentro da medicina, quem mais representa essa visão é a medicina de família e comunidade, bem como demais profissionais não médicos. Fazer uma comunicação mais eficaz e humanizada é considerar o LS e, como dito, uma mudança de cultura. É preciso atenção, dedicação e escolher fazer diferente. E por mais que o profissional queira, há o fator limitante do ambiente: o quanto sistemas de saúde favorecem que uma comunicação humana aconteça? 

De que forma a educação em saúde pode estimular as pessoas a terem um papel mais ativo em prol de mais qualidade de vida? 

Na medida em que se entende o fazer saúde como um processo em que uma pessoa vai acessar, avaliar e compreender a informação, para aí aplicá-la e fazer uma mudança ou transformação, é possível criar espaço para a responsabilidade surgir. Tanto de quem está provendo o cuidado ou informação em saúde – ao entender que tem a responsabilidade de fazer a informação ser o mais compreensível possível – quanto de quem está recebendo o cuidado, ao responsabilizar-se por sua parte, que, dependendo do seu contexto, pode ser mais difícil do que já é normalmente. O processo educativo em saúde reconhece a ambivalência da mudança, ou seja, que há uma vontade de mudar ao mesmo tempo que há uma vontade de não mudar. Esse processo favorece a autonomia e cria um espaço de segurança para a pessoa vulnerabilizar-se.

Inteligência artificial e plataformas digitais vêm transformando a saúde. Que avanços tecnológicos se destacam no que diz respeito ao autocuidado? 

De maneira geral, entre as ferramentas que ajudam a navegar no mar informacional e a lidar com as barreiras para a mudança destacam-se: plataformas que conectam pessoas com determinadas condições de saúde ou pessoas engajadas em uma mudança de hábito; que explicam patologias, medicamentos, processos de mudança de hábitos de forma mais simples; que facilitam o tratamento e a mudança; que organizam as informações sobre saúde. Existe uma infinidade. Também há a inovação em produtos para o autocuidado mais eficazes. Vale pontuar que mudanças simples em processos, como adaptação de linguagem, têm o potencial de gerar melhorias e impactos consideráveis. O simples demanda tempo e técnica para ser executado.

Qual o papel de uma premiação como a da ACESSA na disseminação do autocuidado?

A premiação promovida pela ACESSA permite disseminar as estratégias para o autocuidado individual e coletivo, bem como difundir o conceito. Também reconhece o que está sendo feito e que merece ser reproduzido ou ampliado. Numa era de excesso informacional, é fundamental abrir espaço para iniciativas práticas e que lidam com o real e seus desafios.

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