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Saúde é pop

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Tá na internet, tá na TV, tá nos livros... tá no nosso dia a dia. O jornalista André Bernardo mostra como fenômenos culturais e sociais mexem com a saúde — e vice-versa.
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Barriga solidária avança no país e é opção para casais homoafetivos

Conheça a história de uma família que cresceu com a doação temporária de um ventre materno e as peculiaridades desse procedimento no Brasil

Por André Bernardo
9 ago 2020, 09h05
barriga solidária
O casal Fernando e Gustavo com a amiga e barriga solidária Suelen no chá de bebê do pequeno Lior. (Foto: Acervo pessoal/SAÚDE é Vital)
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Os destinos de Fernando e Suelen não foram traçados na maternidade, como diria Cazuza na letra de Exagerado, mas em um condomínio de Praia Comprida, em São José, a 6 quilômetros de Florianópolis (SC). De vizinhos, os dois, ainda crianças, logo passaram a amigos e daqueles inseparáveis. Na adolescência, Fernando gostava de ir ao apartamento de Suelen para bater papo e ouvir música.

Foi em um desses encontros que, ao som de Whitney Houston, ele contou para a amiga o sonho de construir uma família e de ter filhos. Na mesma hora, Suelen se ofereceu para ser sua “barriga solidária”. “Costumo brincar dizendo que, se eu não fosse gay, teria me casado com a Suh. De tão grudados que éramos, somos amicíssimos até hoje”, derrete-se Fernando Rodrigues, de 38 anos.

Em fevereiro de 2010, Fernando se mudou para o Rio, onde mora até hoje. Dois anos depois, conheceu Gustavo Bonjardim, de 31 anos, seu futuro marido. Os dois se casaram em 2013 e permaneceram juntos até 2018. Mesmo vivendo em cidades diferentes, Fernando e Suelen não pararam de se falar e, em uma dessas ocasiões, ela voltou a tocar no assunto: “Tô chegando perto dos 40, hein? Se quiser mesmo, a hora é essa. Bora fazer?”.

Desde 2015, Fernando e Gustavo já esperavam na fila da adoção. Mas nunca chegava a vez deles. “É muita família querendo adotar para pouca criança legalizada para adoção”, resume Fernando. “O que nos impediu de ter uma adoção rápida foi querer ter um bebê. A maioria quer menina, branca e recém-nascida. Nosso único filtro era ser um bebê saudável”, relata.

Em 2017, os dois, cansados de esperar, resolveram partir para a “barriga solidária”. Ou, para ser mais exato, “útero de substituição”. Antes disso, Fernando chegara a pensar em “barriga de aluguel”. Ou seja, pagar alguém para ceder o útero a uma gestação. Mas, felizmente, não foi necessário. Até porque a prática é oficialmente proibida no Brasil.

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“Na verdade, eu não fui convidada para ser barriga solidária. Eu que me ofereci”, diz Suelen, de 36 anos. “Sou sagitariana, sabe? Morreria de ciúme se outra pessoa fosse a barriga solidária do Fer no meu lugar”. Casada e mãe de três meninas, ela diz que sua família sempre apoiou a decisão. “Minhas filhas adoraram saber que eu guardaria o neném do Tio Fer na minha barriga”, conta, bem-humorada.

Escolhido o ventre materno, o próximo passo foi assinar um contrato de cessão temporária de útero e submetê-lo à aprovação do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro (Cremerj). “Nos casais femininos, os óvulos de uma mulher podem ser fertilizados pelo sêmen de um doador anônimo e transferidos para o útero da outra parceira. Nos casais masculinos, porém, os óvulos são obrigatoriamente de uma doadora anônima. Eles não podem ser da mulher que está cedendo o útero, seja ela da família ou não”, explica a ginecologista e obstetra Maria do Carmo Borges de Souza, diretora do Centro de Reprodução Humana Fertipraxis, no Rio.

Outra etapa importante do “útero de substituição” é a avaliação psicológica, tanto do casal quanto da mulher que desempenha o papel de barriga solidária. Por determinação do Conselho Federal de Medicina (CFM), as “doadoras temporárias de útero” – nome técnico das barrigas solidárias – devem pertencer à família de um dos parceiros do casal em um parentesco consanguíneo até o quarto grau: mãe (primeiro grau), irmã ou avó (segundo), tia (terceiro) e prima (quarto). “Em nosso caso, como era uma amiga que emprestaria o útero para gerar o bebê, tivemos que provar que não havia vínculo financeiro”, revela Fernando.

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A primeira tentativa de transferência de embriões não foi bem-sucedida. Da segunda vez correu tudo bem. “Aos casais, homoafetivos ou não, só digo uma coisa: jamais desistam do sonho de ter seu filho. Se lá atrás tivéssemos desistido, hoje não estaríamos aqui vivendo esse sonho lindo. Então, não desistam. Sejam firmes e lutem pelo filho que está por vir”, afirma Gustavo.

Logo no começo da gestação, quando Fernando contava a novidade para parentes e amigos, ninguém parecia acreditar. Sua mãe era uma delas. Vivia enchendo o filho e o genro de dúvidas e questionamentos: “A Suelen vai ceder o bebê depois que ele nascer?”, “Você vai deixar seu filho chamar a Suelen de mãe?”, “O que o menino vai pensar disso tudo quando crescer?”, e por aí vai. “Vocês são doidos!” foi a frase que Fernando e Gustavo mais ouviram por aí.

O sonho de Fernando e Gustavo de serem pais se tornou realidade no dia 20 de junho de 2019 com a chegada do pequeno Lior. “A primeira vez em que peguei o Lior no colo foi indescritível. Tremia dos pés à cabeça de tanto que chorava. Nunca senti algo parecido. Foi o dia mais emocionante da minha vida”, recorda Fernando.

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Para Gustavo, o nascimento de Lior, hoje com 1 ano e dois meses, mudou sua vida. “Hoje em dia, penso duas vezes antes de tomar qualquer decisão. Sei que meus atos podem influenciar a vida dele. Além disso, o Lior me trouxe uma forma diferente de enxergar o mundo, me ensina algo novo a cada dia e, principalmente, me fez saber o significado da palavra ‘pai’. Hoje posso dizer que sou um homem realizado”, diz.

P.S.: Quanto à adoção, Fernando não desistiu dela. Há oito anos na fila, pretende revalidar sua habilitação e, em breve, adotar uma menina, de uns 4 ou 5 anos. “Quero dar uma irmãzinha ao Lior”, se empolga.

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