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O combate à Covid-19 na Amazônia profunda

Projeto leva acesso à saúde a povos indígenas e ribeirinhos que vivem em comunidades mais distantes e isoladas do Amazonas

Por Virgilio Viana, engenheiro florestal do FAS*
Atualizado em 15 set 2020, 16h57 - Publicado em 15 set 2020, 12h32
coronavírus e os índios
É preciso garantir a proteção de povos indígenas e ribeirinhos contra o coronavírus.  (Ilustração: Studio Nebulosa/SAÚDE é Vital)
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A pandemia da Covid-19 revelou um quadro trágico em regiões remotas do país, onde a falta de estrutura de atendimento da saúde pública tem feito crescer o número de vítimas da doença causada pelo novo coronavírus. Entre a população indígena, principalmente da Amazônia, pouco protegida por um Sistema Único de Saúde (SUS), foram quase 23 mil casos confirmados até o final de agosto, com cerca de 400 mortes, conforme dados da Secretaria de Saúde Indígena (Sesai).

Essa situação tem sido combatida por entidades voltadas à proteção desses povos, com apoio essencial da sociedade civil, universidades, empresas, doadores individuais e cooperação internacional. Uma das ações mais importantes na prevenção e combate ao coronavírus entre os indígenas vem sendo realizada pela Fundação Amazonas Sustentável (FAS), organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, que está presente na Amazônia há 12 anos, com trabalhos voltados, entre outros, para saúde, educação, cidadania, geração de renda e conservação ambiental.

Com a chegada da Covid-19 no Estado, a FAS criou, há mais de três meses, a “Aliança dos Povos Indígenas e Populações Tradicionais e Organizações Parceiras do Amazonas para o Enfrentamento do Coronavírus”, que conta com o apoio de quase 100 instituições voltadas a combater as consequências da pandemia na região.

Até o final de agosto, foram arrecadados R$ 25 milhões com doações de materiais e em dinheiro, beneficiando quase 300 mil pessoas em todo o Estado do Amazonas, incluídas as populações indígenas e ribeirinhas. A Aliança já realizou 81 expedições de campo, muitas das quais em regiões remotas, onde só é possível chegar por meio das chamadas ambulanchas.

A principal característica da Amazônia profunda é o isolamento e disso decorrem as dificuldades de transporte, logística e comunicação. As comunidades mais distantes com as quais a FAS trabalha ficam a mais de 15 dias de viagem de Manaus. Existem mais de seis mil comunidades e aldeias apenas no estado do Amazonas.

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O apoio da Aliança na Amazônia pode ser medido por números. Foram entregues, até o final de agosto, 37 615 Equipamentos de Proteção Individual (EPIs); 14 497 materiais de comunicação sobre prevenção ao novo coronavírus; 11 853 litros de combustível utilizados no transporte de pacientes e produtos para as comunidades; 47 619 kits de higiene; 567 mil sachês purificadores; 7 841 cestas básicas; 500 mil máscaras, 21 500 unidades de álcool gel (500 ml); mil oxímetros; e materiais de saúde, entre outros. A maior parte desses materiais foi doada por empresas como Bradesco, Petrobras, Lojas Americanas e Carrefour, entre outras.

Não é uma tarefa fácil chegar às comunidades. O fornecimento desses equipamentos essenciais demanda uma logística difícil e complexa. Exemplo foi a recente doação de 10 mil cestas básicas pelo Carrefour. As primeiras 3 mil cestas foram transportadas por dois dias em um barco de recreio até a região de Tefé, distante 500 quilômetros de Manaus, e transferidas para barcos menores da associação de moradores das Unidades de Conservação (UCs), onde a FAS atua. Houve ainda apoio de voadeiras menores para chegar nas comunidades.

Além das doações, a FAS está utilizando o programa Telessaúde AM, da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), que disponibiliza a plataforma e profissionais para prestar assistência aos agentes comunitários de saúde (ACS). Por meio desse canal de comunicação, os ACS recebem orientação para atuar de forma adequada na prevenção da doença e observação dos pacientes suspeitos com coronavírus.

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A Aliança Covid Amazonas levou o sistema de telessaúde para 12 pontos do Estado, abrangendo cinco Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS), duas Reservas Extrativistas (Resex) e uma Área de Proteção Ambiental (APA). Em outra frente, a FAS e as Lojas Americanas também ampliaram a rede de internet, por meio do projeto de conectividade digital, para os núcleos de conservação e sustentabilidade (NCS) da FAS.

Além das orientações técnicas, os agentes de saúde (ACS) estão sendo instruídos sobre o uso do oxímetro (aparelho que mede os níveis de oxigênio no sangue) como marcador de urgência e até emergência, em casos mais complicados da doença.

A implementação da estratégia da Aliança permitiu à FAS uma série de aprendizados. Um dos mais importantes foi a constatação da necessidade de repensar o Sistema Único de Saúde (SUS) para a região. O SUS tem muitos pontos positivos, foi um importante esteio no enfrentamento da Covid-19 em todo o Brasil e, na média, funciona razoavelmente bem para a realidade urbana.

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Entretanto, o SUS não possui a mesma excelência na Amazônia profunda, onde vivem os povos indígenas e ribeirinhos. Essa realidade é totalmente diferente do restante do Brasil. A criação de um “SUS na Floresta”, proposta pela FAS, conta com apoio do “Todos pela Saúde”, iniciativa do Itaú Unibanco, e pode ser um caminho importante visando analisar, debater e propor ajustes no SUS para melhor adequá-lo à realidade da região.

*Virgilio Viana é engenheiro florestal pela Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), Ph.D. pela Universidade Harvard, ex-secretário de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas e superintendente-geral da Fundação Amazonas Sustentável (FAS)

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