Muitos julgavam improvável, mas a cerveja sem álcool está ganhando bebedores Brasil e mundo afora. Segundo dados de empresas de pesquisa de mercado, o segmento teve um crescimento anual de 5% nos últimos anos, ante 3% da bebida convencional.
Na Espanha, por exemplo, o fenômeno impressiona: estima-se que 15% das cervejas vendidas ali sejam isentas de álcool. Punições mais severas a motoristas embriagados e um maior cuidado com a saúde ajudam a explicar o avanço. Saúde? Pois é. Já existem pesquisas sugerindo benefícios da cerveja sem álcool, como melhor reparação do organismo após a atividade física, proteção cardiovascular e até um apoio no combate à insônia.
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Aproveitando a chegada do calor, conversamos com a nutricionista clínica Alessandra Luglio, de São Paulo, para tirar as principais dúvidas sobre essa loira gelada menos tradicional.
SAÚDE: De uns tempos para cá, a cerveja sem álcool ganhou destaque inclusive por um suposto apelo saudável. Qual a razão desse movimento?
Estamos vivendo uma revisão de conceitos importante quanto aos hábitos saudáveis e sabemos que, de um modo geral, mesmo com tantas informações relacionadas à alimentação disponíveis na mídia e com tantas dietas da moda, os números relacionados ao sobrepeso e à obesidade continuam a crescer.
Poucos conseguem ou estão dispostos a abrir mão de seus prazeres e da praticidade para sair em busca de mais saúde. Sabemos, segundo o Ministério da Saúde, que 1 em cada 5 brasileiros que vivem nas capitais brasileiras consome refrigerantes ou sucos artificiais durante as refeições diariamente, o que colabora para um maior aporte de calorias proveniente de açúcares simples, além da carga significativa de aditivos artificiais. As pessoas são resistentes a abrir mão dos prazeres à mesa.
O movimento que estamos vendo recentemente é a procura por alimentos e bebidas que impactem positivamente a saúde e que, ao mesmo tempo, não façam com que tenhamos de abrir mão do prazer. Nesse nicho entra a cerveja sem álcool.
Uma bebida saborosa, refrescante e que, especificamente na versão 0% álcool, contém baixo teor de carboidratos e poucas calorias (80 por lata de 350 ml contra mais de 145 calorias da maioria dos refrigerantes e sucos artificiais). Isso sem contar que tem ingredientes naturais como cereais e ervas fermentados e é livre de açúcares, adoçantes artificiais e outros aditivos como corantes e aromatizantes.
Quais as principais evidências científicas dos benefícios da cerveja sem álcool?
A cerveja é uma receita simples e centenária que contém como ingredientes basicamente água, cevada, cereais não maltados e lúpulo. Nesse caso em particular, temos ainda a retirada do álcool após a fermentação natural da bebida. Com esse processo são mantidos em sua totalidade os nutrientes provenientes dos ingredientes originais.
Os cereais, por exemplo, são fonte de vitaminas do complexo B, diretamente ligadas aos mecanismos de produção de energia no organismo. Entre elas, aliás, cabe destacar a vitamina B9, ou ácido fólico, que está relacionada à saúde cardiovascular e neurológica.
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Outro ponto importante é a quantidade de compostos bioativos de ação antioxidante presentes na cerveja. O lúpulo é uma erva utilizada no processo de fermentação e é rico em vários desses compostos benéficos. O consumo regular de substâncias antioxidantes é importante para a manutenção das células, a geração de energia e a prevenção de doenças crônicas não transmissíveis [males cardiovasculares, câncer…], a maior causa de mortes no mundo.
A cerveja sem álcool também ajuda a hidratar. Grande parte da sua composição é água, e a bebida ainda possui minerais como o sódio e o potássio, que perdemos por meio do suor. A não reposição desses nutrientes pode levar à desidratação e é por isso que esse tipo de cerveja pode servir como repositor hidroeletrolítico em dias quentes e após a prática esportiva.
Alguns estudos sugerem que doses modestas de álcool seriam vantajosas à saúde (sobretudo a cardiovascular). Uma cerveja sem álcool seria menos proveitosa nesse sentido?
Existem vários estudos que correlacionam o consumo de álcool com a saúde de forma positiva ou negativa. O que realmente difere o “lado” em que essa ingestão ficará (positivo ou negativo) é a dosagem e a frequência de consumo.
A grande questão é entender o que seriam “doses modestas” e principalmente quem é o consumidor dessas doses, pois cada indivíduo possui características particulares do ponto de vista metabólico e fisiológico, o que dificulta criar regras e recomendações genéricas. A ausência de álcool na cerveja 0% pode isentá-la desses benefícios, sim, porém, ao mesmo tempo, abre novas janelas de consumo em momentos do dia em que o álcool normalmente não estaria presente, como em um almoço durante o expediente.
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É lenda ou verdade que algumas marcas de cerveja sem álcool possuem um pouquinho de… álcool?
Antigamente os processos de fabricação existentes realmente não conseguiam eliminar 100% do álcool das cervejas. Hoje, no entanto, nos processos mais modernos existe a eliminação do álcool por completo. Por isso vemos no mercado cervejas estampando 0% álcool.
Do ponto de vista nutricional, quais os principais atributos da cerveja sem álcool?
É uma bebida natural, nutritiva, por conter vitaminas, minerais e concentração significativa de compostos bioativos de ação antioxidante, além de apresentar perfil hidratante e poucas calorias. Também é um produto livre de açúcares de adição, aditivos químicos e adoçantes artificiais.
Mesmo que não tenha álcool, existe a recomendação de maneirar na ingestão da bebida, certo?
A quantidade de consumo é muito relativa. A cerveja sem álcool oferece 20 gramas de carboidratos por lata de 350 ml, ou seja, uma baixa concentração, o que faz com que seu limite de consumo diário não precise ser muito restrito. Mas a ideia, claro, é usá-la com equilíbrio e de forma complementar na alimentação.
Há alguma contraindicação em relação à ingestão do produto?
De modo geral, não existe contraindicação. Como toda bebida e alimento, porém, excessos não são recomendados. Uma vez que a cerveja sem álcool contém glúten, por causa da cevada, celíacos e intolerantes à proteína devem evitá-la.