O sexo feminino possui um risco quase duas vezes maior de desenvolver a depressão. Pois um estudo da Universidade da Califórnia, nos Estados Unidos, investigou a fundo o cérebro de homens e mulheres para tentar desvendar possíveis mecanismos biológicos por trás disso.
Os pesquisadores recrutaram 115 indivíduos saudáveis (69 mulheres e 46 homens). Eles foram separados em dois grupos: um deveria ingerir pequenas doses de endotoxinas (substâncias que promovem uma inflamação cerebral controlada), e o outro, tomava um placebo.
Duas horas depois, todos os participantes executaram uma tarefa que visava testar o sistema de recompensa do cérebro — um conjunto de estruturas que promove a sensação de prazer e que, na depressão, é inibido. Enquanto isso, a massa cinzenta dos voluntários era monitorada por um aparelho ressonância magnética funcional.
Com base nas informações dos exames, os cientistas constataram que, nas mulheres que haviam recebido aquela substância inflamatória, a atividade do tal sistema de recompensa diminuiu, o que não aconteceu com os homens que tomaram as endotoxinas e com todo o grupo placebo.
“Isso sugere que mulheres com distúrbios crônicos inflamatórios podem ser particularmente vulneráveis a desenvolver depressão através da diminuição da sensibilidade a recompensas”, arremata, em comunicado à imprensa, a psicóloga Mona Moieni, da Universidade da Califórnia, que liderou a análise.
Limitações da investigação
Apesar dos resultados serem significativos, é importante analisá-los com cuidado. “Os autores sugerem que os achados explicariam a maior prevalência da doença em mulheres, mas isso não pode ser concluído através da pesquisa”, comenta o psiquiatra Antonio Egidio Nardi, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). “Certamente fatores genéticos e hormonais também devem influir aí”, completa.
Um trabalho de 2017 que contou com a participação de Nardi, por exemplo, mostra que o DNA pode estar por trás dos processos inflamatórios que desencadeariam certos transtornos mentais. Nesse levantamento, os experts avaliaram marcadores genéticos e inflamatórios em pacientes que já haviam tentado o suicídio.
“Demonstramos que a carga genética talvez dificulte o bom funcionamento cerebral em situações de estresse, favorecendo a reação inflamatória e agravando o quadro depressivo”, explica o psiquiatra.
Por que as mulheres são mais propensas à depressão
Segundo Nardi, em geral, esse transtorno surge da interação de fatores genéticos com o estresse. “Depois da primeira crise, parece que a doença segue um curso próprio. Os fatores ambientais e emocionais vão perdendo a capacidade de influir”, complementa o professor.
Acontece que a genética e a flutuação hormonal seriam mais preponderantes no desenvolvimento da doença entre o sexo feminino. “Antes da menopausa, a incidência de depressão é pelo menos duas vezes maior nas mulheres. Após a menopausa, é a mesma para os dois sexos”, exemplifica Nardi. Isso indica que os hormônios femininos, que caem em concentração depois dessa fase, têm um papel na depressão.
Discussões à parte, fica cada vez mais claro que a depressão não surge apenas por causa de aspectos sociais e psicológicos.