A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou recentemente o medicamento Wegovy (semaglutida) para o tratamento da obesidade. Trata-se de uma injeção de uso semanal que ajuda a controlar a fome e promove uma redução expressiva no peso corporal.
A liberação foi recebida com entusiasmo pelos especialistas. “É o que há de mais eficaz no momento em matéria de medicamentos”, comenta o endocrinologista Marcio Krakauer, diretor da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (Sbem).
Nos estudos pré-aprovação, já publicados em grandes periódicos, a droga levou a uma perda de 15 a 17% do peso corporal. A título de comparação, os grupos que receberam o placebo (um fármaco “de mentirinha”) eliminaram cerca de 3%, e os remédios disponíveis hoje promovem, no melhor dos casos, uma queda de 9% no peso.
É importante ressaltar, contudo, que os participantes desses estudos também fizeram ajustes na alimentação e aderiram a programas de atividade física. “O medicamento não é uma solução final, mas uma ferramenta dentro de um tratamento completo, com acompanhamento multidisciplinar”, ressalta Krakauer.
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A semaglutida está indicada para indivíduos com índice de massa corporal (IMC) acima de 30 ou acima de 27 com doenças associadas ao excesso de peso, como diabetes e cardiopatias. Ainda não há data definida para que a substância chegue ao mercado.
Uma nova versão
O efeito expressivo da semaglutida no peso corporal não é uma novidade para os médicos: ele já havia sido demonstrado em diversos estudos anteriores.
O medicamento vem sendo prescrito há algum tempo no tratamento da diabetes (o uso com esse objetivo já estava aprovado no Brasil) e de maneira off-label (fora da indicação da bula) para a própria obesidade.
Até então, era comercializado na forma oral, chegando a uma dose de até 14 mg, de uso diário, ou, então, uma injeção de até 1 mg. O que muda agora é a indicação na bula com o aval da Anvisa, e em uma nova formulação, de 2,4 mg do princípio ativo.
“É uma caneta diferente que, com uma aplicação, atinge a dosagem necessária para o efeito semanal”, aponta o endocrinologista Ricardo Barroso, diretor da Sbem-SP.
Mecanismo de ação
A semaglutida pertence à classe dos análogos de GLP-1, hormônio produzido pelo próprio organismo, no intestino. “Ele atua numa região do cérebro chamada hipotálamo, regulando o apetite e promovendo saciedade”, explica Priscila Mattar, diretora médica da Novo Nordisk, que produz o medicamento.
Com a fome sob controle, o indivíduo come menos. A semaglutida tem 94% de homologia – isto é, semelhança – com o nosso GLP-1, e se conecta melhor aos receptores cerebrais onde ele atua.
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Tamanha tecnologia dentro de uma injeção é bem-vinda no arsenal contra uma das doenças em maior ascensão no planeta. Entretanto, o preço, ainda a ser definido pela Anvisa, deve dificultar o acesso para a maioria da população. Nos Estados Unidos, para ter ideia, o tratamento sai por cerca de R$ 6 mil ao mês.
Outro medicamento da mesma categoria já aprovado no Brasil, o Saxenda (liraglutida), tem ação semelhante, mas deve ser aplicado diariamente, ao custo de cerca de R$ 600 por embalagem com três doses.
Como o remédio deve ser tomado e quais os efeitos colaterais
Antes de tudo, é preciso receber indicação médica. “O papel do princípio ativo é inibir a fome, mas muitas pessoas não comem por falta de saciedade, e sim por ansiedade, compulsões, transtornos psiquiátricos… Nesse caso, a medicação pode não ser tão efetiva”, esclarece Krakauer.
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O tratamento é feito de maneira progressiva, começando com a dose mais baixa, de 0,25 mg. “Isso é necessário para a adaptação do organismo, porque o remédio também altera o funcionamento do intestino, podendo levar a náuseas, refluxo e constipação”, comenta Barroso.
A questão da mudança de hábitos é importantíssima. “Se a alimentação não melhora, é provável que a pessoa tenha mais efeitos colaterais e ganhe o peso de volta rapidamente”, ressalta Barroso.
Como a obesidade é considerada uma doença crônica, não há um prazo definido para o fim das picadas. “Tudo vai depender de como a pessoa se sairá nesse período e a quantidade de peso que ela precisa perder”, diz Krakauer.
Substituto da bariátrica?
A classe dos análogos de GLP-1, como a semaglutida e a liraglutida, tem demonstrado resultados tão bons que se vislumbra um futuro onde elas substituam a cirurgia bariátrica em certas situações.
“Outra molécula semelhante, recém-aprovada nos Estados Unidos, alcança 25% de redução de peso. Então, espera-se que a categoria poderá eliminar a necessidade de operar muitos pacientes”, aponta Krakauer.
A intervenção cirúrgica promove um emagrecimento que chega a 50% do peso, dependendo do caso e da técnica escolhida. Essa opção poderia ficar reservada, por exemplo, aos quadros mais severos de obesidade ou aos indivíduos que respondem pior à medicação.
Remédio não faz milagre…
… E nem deve ser usado por conta própria. “Em primeiro lugar, perder peso só porque não se está comendo nada não é algo saudável”, alerta Krakauer.
Sem o combo atividade física e dieta, o indivíduo tende a perder não só gordura, mas também massa magra, o que é prejudicial à saúde e ao próprio processo de emagrecimento. Além disso, a tendência é que a perda de peso não se sustente a longo prazo.
Por fim, a obesidade é uma doença crônica, cujo controle envolve não apenas medicamentos, mas acompanhamento de nutricionista, educador físico e, não raro, psiquiatras e psicólogos.