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Psoríase, uma nova era no tratamento

Remédios de última geração prometem controlar melhor a doença que afeta pele, cabelo, articulações... Saiba o que é psoríase e como se tratar hoje em dia

Por Naira Hofmeister e Sílvia Lisboa
Atualizado em 1 fev 2021, 16h17 - Publicado em 5 jul 2018, 09h30

Um revólver de tiro certeiro. Esta é a metáfora usada pelo dermatologista André Carvalho para se referir aos novos remédios contra a psoríase, que causa vermelhidão, descamação e placas na pele em cerca de 5 milhões de brasileiros. Recém-aprovados para chegar às farmácias do país, esses medicamentos, injetáveis, pertencem à classe dos biológicos, isto é, são produzidos a partir de células vivas cultivadas em laboratório. O tiro certeiro tem como alvo moléculas inflamatórias que estão na origem das lesões cutâneas.

Fazem parte desse arsenal medicações que, em comum, têm princípios ativos de nomes cabeludos. Em maio, começa a ser vendido o ixequizumabe, do laboratório Lilly. O guselcumabe, da Janssen, também já foir aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). A dupla dividirá espaço com o secuquinumabe, da Novartis, já em uso no país.

A tecnologia dos biológicos começou a ser empregada contra a psoríase por aqui ainda em 2006, com fármacos destinados só a estágios avançados. Mas a nova geração, segundo os entendidos, traz uma vantagem sobre os precursores: a precisão. “Os primeiros biológicos agiam como uma granada, acertando o alvo, mas provocando estragos no entorno”, compara Carvalho.

Já o trio citado há pouco ataca diretamente proteínas ligadas às manifestações da doença – as interleucinas 17 e 23 – sem abalar as defesas do corpo. Essa mira precisa não só propicia um controle mais efetivo e duradouro da situação como evita que as quedas na imunidade piorem os próprios sintomas. É um alívio e tanto para quem tem de lidar com as lesões na pele e as demais repercussões em outros órgãos, algo que impacta a autoestima e a qualidade de vida.

A animação dos profissionais e pacientes diante dos novos fármacos se ampara em dados científicos. Nos testes clínicos do guselcumabe, por exemplo, a injeção subcutâneareduziu, em quatro meses, 90% dos sinais da psoríase em 70% das quase 2 mil pessoas tratadas. “Em quatro semanas já era possível notar uma resposta significativa”, destaca Telma Santos, diretora médica da Janssen no Brasil.

A medicação da Lilly também obteve resultados expressivos. Em 13 meses, logrou a remissão da doença em mais da metade dos 3 800 pacientes avaliados pelo mundo. No mesmo período, 80% dos voluntários tiveram uma melhora de pelo menos 75% das lesões – o efeito da medicação também já podia ser notado nas primeiras doses.

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Mas um dos aspectos mais celebrados foi a descoberta de que os ganhos se mantinham no longo prazo. Com os dois medicamentos, boa parte dos indivíduos gozou da redução dos sintomas entre um ano e meio e dois anos. “Os estudos refletem o que vemos na prática em locais onde a medicação já está sendo usada, como Estados Unidos, Japão e Europa”, conta Livia Gonçalves, gerente médica da Área de Imunologia da Lilly.

Outro chamariz da nova geração dos biológicos é que seu uso não está associado ao aumento no risco de tuberculose, um efeito colateral dos primeiros remédios do gênero – falamos dos anti-TNF, que inibem um grupo de substâncias inflamatórias. Tais remédios podem favorecer a reincidência da doença pulmonar causada por bactérias em pessoas com histórico da infecção.

E isso preocupa por aqui uma vez que a tuberculose é endêmica em algumas regiões do Brasil. Cabe ponderar, contudo, que os anti-TNF continuam bons aliados no tratamento da psoríase e de suas manifestações nas articulações. “É possível um paciente zerar a psoríase tomando um anti-TNF”, observa Caio Castro, coordenador da Campanha Nacional de Psoríase da Sociedade Brasileira de Dermatologia.

Aproveitando a deixa, é preciso esclarecer que as medicações mais modernas não substituem de primeira as terapias tradicionais. Conforme o Consenso Brasileiro de Psoríase, a primeira opção no tratamento deve ser a fototerapia, na qual o paciente recebe radiação ultravioleta nas lesões em pelo menos 20 sessões.

Se necessário, parte-se para os remédios sintéticos, comprimidos com diferentes mecanismos de ação. Aliás, na mesma leva de aprovação dos últimos biológicos, foi liberado no mercado brasileiro o apremilaste, do laboratório Celgene – ele vem ampliar o leque de medicações de uso oral para a psoríase.

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Quando eles não dão conta do recado, aí, sim, o médico prescreveria os biológicos. Casos mais leves, por sua vez, até podem ser tratados com hidratantes e pomadas, mas essa estratégia isolada tem sido cada vez mais rara devido ao caráter sistêmico da doença.

A barreira do preço

No país, a indicação dos biológicos para domar a psoríase fica mais restrita aos casos severos. O motivo, no entanto, não é médico, mas econômico. De acordo com a Anvisa, um anti-TNF mais em conta custa ao redor de 1 400 reais, enquanto os da nova geração variam entre 4 mil e 34 mil, dependendo da dosagem e da forma de apresentação (injeção, caneta aplicadora…).

“No mundo ideal, começaríamos pelos biológicos porque eles têm muito menos efeitos colaterais”, afirma Castro. Porém, no mundo real, o custo elevado dificulta que essa conduta vire realidade.

Hoje o Sistema Único de Saúde (SUS) cobre gratuitamente o tratamento com biológicos apenas para quem tem artrite psoriática, uma das manifestações mais limitantes da doença. Segundo a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), por sua vez, os planos de saúde não estão obrigados a custear esses remédios, a menos que a aplicação ocorra durante uma internação. O jeito acaba sendo recorrer à Justiça, que costuma autorizá-los nos casos de falhas ou reações adversas das drogas tradicionais.

Com, então, se trata a psoríase hoje em dia

Hidratação: cremes hidratantes sem perfume são indicados para evitar o ressecamento da pele. Se a psoríase afeta o couro cabeludo, xampus especiais entram em cena.

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Fototerapia: além dos banhos de sol, existem equipamentos que emitem raios UV e modulam a atividade das células para que a pele não vire refém do autoataque das defesas.

Comprimidos: medicamentos de uso oral são destinados a coibir o processo inflamatório que culmina no aparecimento de descamação, vermelhidão, coceira e placas na pele.

Biológicos: remédios injetáveis de uso mensal e bimestral que miram moléculas inflamatórias envolvidas na psoríase. A nova geração é ainda mais precisa e efetiva.

Psoríase não é só uma doença de pele

Para os especialistas, os órgãos reguladores deveriam ampliar o acesso aos biológicos. Isso porque, sabe-se hoje, a psoríase vai além da pele. “Há todo um efeito em cascata a partir da inflamação. A lesão na pele é a ponta do iceberg”, explica a dermatologista Regina Carneiro, professora do Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade do Estado do Pará.

O mesmo processo inflamatório que leva à descamação da pele pode, por exemplo, comprometer as articulações. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), até 34,7% dos pacientes com a doença desenvolvem artrite psoriática.

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Além disso, outras condições são mais comuns nos portadores do que no restante da população, caso de distúrbios intestinais e hepáticos e a síndrome metabólica, uma coleção de fatores inimigos do coração.

Por falar em coração, estudos relacionam a psoríase, especialmente se o quadro não é tratado direito, a um maior risco cardiovascular. Culpa das moléculas inflamatórias que, se de um lado incitam as lesões na pele, do outro contribuem para o entupimento das artérias. Segundo André Carvalho, pacientes com psoríase grave encaram, desde cedo, uma probabilidade elevada de sofrer com a doença cardiovascular antes dos 65 anos. Isso só reforça a necessidade de seguir à risca o tratamento e hábitos saudáveis.

Além do impacto no corpo, a psoríase não raro maltrata a mente. As pesquisas indicam que o convívio com a doença é capaz de predispor à ansiedade, à depressão e ao ganho de peso. “As substâncias liberadas durante o processo inflamatório da psoríase também estão relacionadas com a obesidade, e até a depressão pode ter esse vínculo”, diz Regina. Tais repercussões são agravadas pelo isolamento social e pela redução das atividades em meio às crises.

A preocupação com o estado mental e a qualidade da rotina já é tão levada em conta que, ao medir a gravidade do quadro, o médico não considera apenas os danos à saúde. O paciente também tem de responder a questionários que avaliam o impacto na vida social.

Exemplo de pergunta: deixou de usar alguma roupa ou sentiu desconforto em locais públicos por causa das marcas na pele? “Às vezes a pessoa pode até ter poucas lesões cutâneas, mas possui uma baixa qualidade de vida”, nota Regina.

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Mas quais são os sintomas na pele da psoríase?

A psoríase provoca descamação, vermelhidão, coceira e placas principalmente em:

  • Couro cabeludo
  • Cotovelos
  • Joelhos
  • Unhas
  • Axilas
  • Virilha

Em geral, os dois lados do corpo são afetados. Se notar algo parecido, é bom bater um papo com o dermatologista.

Em paz com o corpo

O fato é que a parceria com o médico, a adesão ao tratamento e alguns cuidados suavizam e muito o convívio com a psoríase. No consultório, é provável que o profissional fale de certas precauções diante de remédios para outras enfermidades. Alguns anti-hipertensivos, anti-inflamatórios e fármacos para transtornos psiquiátricos, como lítio, costumam ser contraindicados.

Os próprios corticoides, usados para sanar perrengues que envolvam inflamação, podem trazer problemas na dose errada. “Se o paciente tomar uma injeção de cortisona, por exemplo, poderá ter um efeito rebote e piorar a psoríase”, alerta Castro. Não tem jeito: a prudência manda acompanhar de perto e conversar sempre com o médico.

Um estilo de vida equilibrado, claro, só traz vantagens. Já existem fartas evidências de que cigarro, bebidas alcoólicas e estresse demais agravam os sintomas. Até a alimentação tem um papel aqui, ainda mais se lembrarmos que a psoríase está ligada ao maior risco de ganho de peso.

Com a pele em si, convém evitar banhos demorados e quentes, que ressecam esse tecido e favorecem a descamação e as lesões. Nesse sentido, hidratantes (sem perfume) viram aliados no dia a dia. Fora das crises, a exposição ao sol em horários indicados pelo dermatologista é bem-vinda. Ao combinar o autocuidado com o tratamento prescrito, as chances de sucesso só crescem. E a nova geração de remédios biológicos vem chegando para tornar mais rápido e sustentável o cumprimento dessa missão.

Cuidados com a pele no dia a dia

Hidrate-se: muita água e sucos de fruta ajudam a evitar o ressecamento.

Exercite-se: atividade física regular modula a imunidade e aplaca o estresse.

Tome sol: ele é ótimo fora das crises. Mas tem que se expor até as 10h ou após as 16h.

Coma peixe: pescados são fonte de ômega-3, gordura com propriedades anti-inflamatórias.

A psoríase pode ser confundida com:

Dermatite: não é simétrica como a psoríase e ocorre mais na parte interna das dobras.

Caspa: essa manifestação, mais comum, não gera vermelhidão no couro cabeludo.

Micose: as manchas nas unhas são menos espessas ou em áreas delimitadas.

Artrose: as juntas ficam mais rígidas sobretudo pela manhã. Na psoríase não é assim.

Fontes: Murilo Drummond, dermatologista e professor titular do Instituto de Pós-Graduação Carlos Chagas (PR); Clarissa Prati, dermatologista e presidente da Sociedade Brasileira de Dermatologia do Rio Grande do Sul

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