O que Preta Gil e Joe Biden têm em comum?
Não é só o diagnóstico de câncer. A partir da história das duas personalidades, médico explica o papel da genética no desenvolvimento da doença

O que a cantora brasileira Preta Gil e o ex-presidente norte-americano Joe Biden, além da fama, poderiam ter em comum?
A resposta não está apenas nos seus diagnósticos oncológicos — câncer colorretal e câncer de próstata, respectivamente —, mas no fato de que ambos os casos preenchem critérios para investigação genética de predisposição hereditária, algo cada vez mais essencial na prevenção e no cuidado oncológico.
Rastreamento e prevenção
Além disso, os dois tumores estão contemplados em programas universais de rastreamento populacional.
No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) recomenda exames de sangue oculto nas fezes e colonoscopia para detecção precoce do câncer colorretal. Já o câncer de próstata conta com diretrizes para rastreamento individualizado com base em PSA (Antígeno Prostático Específico) e toque retal.
No entanto, o que pouca gente sabe é que, mesmo dentro dessas doenças comuns, existem formas hereditárias, e é aí que entra a genética médica.
O papel da genética nos casos de Preta Gil e Joe Biden
Preta Gil optou por realizar um teste genético após o diagnóstico, uma decisão acertada, já que o câncer colorretal pode estar associado à síndrome de Lynch, condição genética que aumenta significativamente o risco de desenvolver alguns tipos de câncer e é a principal causa hereditária desse tumor.
Biden, por sua vez, teve um câncer de próstata metastático e, de acordo com as diretrizes internacionais da National Comprehensive Cancer Network (NCCN), esse é um dos cenários em que se recomenda a investigação genética para síndromes relacionadas a genes como BRCA1 e BRCA2.
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Quando considerar a avaliação genética
Entre as principais indicações clínicas para avaliação genética estão:
- Diagnóstico de câncer em idade jovem (geralmente antes dos 50 anos);
- Presença de mais de um tipo de tumor em uma mesma pessoa;
- Histórico familiar de câncer em múltiplos parentes de primeiro grau;
- Tumores raros ou com características específicas (como triplo-negativo ou próstata metastático);
- Pessoas com ascendência populacional de risco, como judeus Ashkenazi.
O que o teste genético pode mudar
A realização de um teste genético nesses contextos pode:
- Personalizar estratégias de prevenção (como exames mais frequentes ou cirurgias redutoras de risco);
- Orientar decisões terapêuticas (uso de medicamentos-alvo específicos);
- Planejar o acompanhamento ao longo da vida;
- Permitir a avaliação de familiares que também possam estar em risco.
Onde buscar ajuda
No SUS, já existem programas estruturados para o rastreamento e o atendimento de famílias com síndromes hereditárias, como o Programa de Genética Médica do Instituto Nacional de Câncer (INCA) e iniciativas regionais em diversos estados.
Além disso, no site da Sociedade Brasileira de Genética Médica e Genômica (SBGM) é possível consultar serviços de referência e médicos geneticistas em todo o Brasil.
Conclusão
A genética médica não é mais coisa do futuro: ela está na interseção entre prevenção, diagnóstico e tratamento.
Se você tem casos de câncer na família, especialmente em idade jovem, múltiplos tumores em uma mesma pessoa ou histórico em parentes de primeiro grau, procure um médico geneticista.
Quando falamos de câncer, conhecimento também é prevenção.
*Paulo Victor Zattar Ribeiro é médico geneticista, fellow em Oncogenética pela USP-Ribeirão Preto e fundador do podcast PodeRaro.
*Esse texto foi produzido pela Muitos Somos Raros, a maior plataforma brasileira independente dedicada às doenças raras — e a maior comunidade de pacientes e famílias raras do País.