Cirurgia no coração? Só depois do almoço, por favor. Pesquisadores da Universidade de Lille, na França, descobriram que pacientes operados após o meio-dia têm um risco menor de sofrer complicações fatais nos meses que se seguem à operação. Calma que a gente vai explicar essa história.
No estudo em questão, a equipe do médico David Montaigne analisou os prontuários de 596 pacientes. Todos tiveram suas válvulas aórticas trocadas em procedimentos cirúrgicos – metade deles de manhã, a outra metade à tarde. Em um período de 500 dias depois desse momento, os operados matutinos tiveram problemas como insuficiência cardíaca e infarto em 18% dos casos, contra apenas 9% dos que passaram pela cirurgia depois do almoço.
Para entender melhor o resultado curioso, a equipe fez biópsias em 14 pacientes da manhã e 16 pacientes da tarde. Não por coincidência, descobriram que o tecido cardíaco dos voluntários do segundo grupo se recuperou melhor depois do período passado na mesa de cirurgia, sem oxigênio.
Essa flutuação foi atribuída à ação de 287 genes – vários dos quais também estão relacionados de alguma forma ao funcionamento do nosso relógio biológico em escala molecular. Aliás, a maneira como o funcionamento do nosso corpo muda ao longo do dia rendeu inclusive um Prêmio Nobel aos cientistas que consolidaram essa área da ciência.
“Nossas descobertas sugerem que isso acontece porque o mecanismo biológico por trás do dano é afetado pelos ciclos circadianos das pessoas e os genes que os controlam. Mover as cirurgias para a tarde pode reduzir o risco dos pacientes terem problemas no futuro”, explicou Montaigne ao The Telegraph.
“O que a pesquisa sugere é que o relógio biológico das células que formam o coração as torna mais suscetíveis a sofrer problemas em cirurgias que são feitas de manhã”, explicou ao The Guardian Bryan Williams, professor do University College de Londres. Ele não fez parte do estudo, e é cético em relação à possibilidade de reagendar cirurgias imediatamente. “Mais estudos seriam necessários para mudar os horários na prática. As implicações logísticas disso seriam enormes, então precisaríamos de uma prova definitiva de que os benefícios são reais.”
Outra possibilidade, um pouco menos complicada, seria usar drogas que criem uma espécie de jet lag artificial – convencendo o corpo, de alguma maneira, que são sempre duas da tarde, mesmo que na verdade sejam duas da manhã. Mas essa solução, pelo menos por enquanto, ainda está distante.
Este conteúdo foi publicado originalmente na Superinteressante.