LSD: riscos e consequências da droga para a saúde
Droga psicodélica não provoca dependência, mas altera a percepção, os pensamentos e as emoções
O LSD (dietilamida do ácido lisérgico) é uma droga psicodélica e dissociativa, que pode alterar o humor, os pensamentos e a percepção da realidade de maneira temporária.
Conheça em detalhes os efeitos da substância no corpo.
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O que é LSD?
O LSD é uma substância química sintética derivada do ácido lisérgico, um composto encontrado em fungos que crescem em cereais, como o Claviceps purpurea, que infecta o centeio. Ele é classificado como uma droga psicodélica, o que significa que altera a percepção, os pensamentos e as emoções de quem a consome.
“O LSD é conhecido por causar alucinações sensoriais ou visuais e mudar a maneira como as pessoas experimentam o mundo ao seu redor”, resume o farmacologista Lucas Gazarini, professor da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS).
Qual a origem da droga?
O LSD foi sintetizado pela primeira vez em 1938 pelo químico suíço Albert Hofmann, durante estudos de derivados do ácido lisérgico na busca por medicamentos para problemas respiratórios.
Inicialmente, o pesquisador não sabia sobre os efeitos psicodélicos da substância, tampouco fazia a pesquisa em busca dessas ações. Esse foi mais um caso de descoberta acidental na ciência. Toda a pesquisa, inclusive, foi apoiada por grandes farmacêuticas.
Os efeitos alucinógenos só foram descobertos em 1943, quando Hofmann acidentalmente ingeriu uma pequena quantidade de LSD e relatou experiências intensas de alucinação.
“A partir daí, a substância ganhou atenção, especialmente nos anos 1960, quando foi popularizada por movimentos contraculturais, especialmente o movimento hippie norte-americano. Justamente pelo uso amplo nesse cenário, o LSD virou um tabu nos anos seguintes, com redução muito clara nas pesquisas científicas com esse composto”, diz Gazarini.
Como o LSD é utilizado?
O LSD tem características químicas que permitem uma absorção muito rápida pelas mucosas e, mesmo em doses muito pequenas, pode causar efeitos significativos. Em geral, a droga é consumida por via oral, sendo as formas mais comuns:
1. Papel absorvente (“blotter paper”): pequenos pedaços de papel embebidos com solução líquida de LSD. Depois do líquido evaporar, o LSD é mantido nesses papeis, que são colocados na língua até serem absorvidos pela mucosa da boca.
2. Gotas líquidas: colocadas diretamente na língua ou em bebidas. Aqui, a concentração é maior, e a absorção ocorre tanto pela mucosa oral quanto gástrica e intestinal.
3. Comprimidos ou cápsulas: são menos comuns e a absorção tende a ser mais lenta, com efeitos que demoram mais para surgir.
Como o LSD atua no organismo humano?
O LSD chega rapidamente ao cérebro e atua principalmente ativando receptores de serotonina, neurotransmissor que regula o humor, o sono, a percepção e outros processos cerebrais.
É o mesmo neurotransmissor modulado pela maioria dos medicamentos antidepressivos. Tanto que, até poucos ano atrás, não se entendia por que essas drogas não causavam efeitos alucinógenos.
“Recentemente, ficou claro que o LSD tem uma ação diferencial porque ele consegue entrar nos neurônios e ativar receptores chamados 5-HT2A, localizados dentro das células nervosas, modificando funções metabólicas”, detalha o professor.
As áreas do cérebro mais afetadas incluem:
• Tálamo: exerce uma função de “filtro sensorial”, recebendo estímulos externos e priorizando o que deve ser processado pelo cérebro ou não, como uma forma de reduzir um excesso de informações sensoriais.
• Córtex pré-frontal: relacionado à tomada de decisões, pensamento crítico e percepção do ambiente.
• Rede de modo padrão: uma rede de regiões cerebrais envolvida na autoidentidade e no pensamento interno. O LSD tende a “desorganizar” essa rede, levando a experiências como sensação de unidade com o universo ou dissolução do ego.
• Sistema límbico: associado às emoções e memórias, o que explica as intensas alterações de sentimento durante o uso da droga.
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Quais são os efeitos imediatos após o uso?
Os efeitos do LSD começam cerca de 20 a 60 minutos após o consumo, variando de acordo com a quantidade usada e forma de administração, e duram de 6 a 12 horas.
A experiência inclui:
1. Alterações sensoriais e perceptivas
Visões de cores vivas, padrões em movimento e alterações na percepção de formas e tamanhos. Essas distorções também podem ser experimentadas em outros sentidos, como a audição. É comum a sensação de que o tempo está desacelerando ou acelerando.
Pode ocorrer ainda a percepção de estímulos que não existem na realidade (sons, visões, tato, odores, gostos, etc.), além da sinestesia, que consiste em uma mistura dos sentidos, como a ideia de “ver sons” ou “ouvir cores”.
2. Mudanças emocionais
Surge uma euforia intensa e relatada como “hilária” em algumas pessoas, que é um dos motivos para repetir o uso da substância. Pode ocorrer ainda um sentimento de conexão profunda com outras pessoas ou com o universo.
Porém, há o lado negativo. “A alteração emocional também pode incluir sensações de ansiedade ou medo intensos, até mesmo adquirindo caráter de crise de pânico ou surto psicótico, que representam os maiores riscos no uso da substância”, alerta.
3. Alterações cognitivas
Aqui, entram pensamentos filosóficos, desconexos ou introspectivos, além de dificuldade de concentração ou raciocínio lógico.
4. Efeitos físicos
São raros, mas podem acontecer com o uso de doses muito grandes ou como resultado de experiências emocionais negativas durante o efeito agudo da substância.
“Eles incluem dilatação das pupilas, aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial, sudorese, tontura ou náusea em alguns casos, especialmente aqueles interpretados negativamente”, resume o especialista.
Quais são os efeitos colaterais?
A curto prazo, o usuário pode experimentar problemas psicológicos, como ansiedade, paranoia, episódios de pânico, confusão mental ou crises psicóticas.
Alguns embarcam na chamada “bad trip“, experiência desagradável com medo intenso ou alucinações perturbadoras, que pode levar a comportamentos arriscados. Pode haver dificuldade em distinguir realidade de alucinações, aumentando o risco de acidentes.
“Nesses casos, há risco de morte por tentativas frustradas de ‘fuga’, que podem facilitar atropelamentos, queda de edifícios, comportamento violento ou de autolesão”, pontua.
Em geral, o LSD tem poucas consequências a longo prazo, até porque seu uso, em geral, não é crônico, intenso ou diário. Contudo, alguns indivíduos têm flashbacks, ou seja, revivem de maneira espontânea experiências psicodélicas dias, semanas ou até meses após o uso, mesmo que único na vida.
“Como o LSD tem uma afinidade muito grande por tecido gorduroso, ele pode ficar ‘sequestrado’ na gordura corporal por muito tempo, sendo liberado frente a situações de estresse ou exercício físico vigoroso, que costumam preceder esses flashbacks. Por ser potente, mesmo essas quantidades pequenas poderiam causar efeitos alucinógenos”, explica Gazarini.
Por fim, há risco de danos à saúde mental, especialmente em pessoas com predisposição para condições como esquizofrenia ou transtorno bipolar.
Uma pessoa pode sofrer overdose de LSD?
Tecnicamente, uma overdose fatal de LSD é extremamente rara e pouco provável. Ainda não há uma resposta científica sobre a quantidade exata capaz de provocar o quadro extremo.
Um estudo publicado no periódico Forensic Science International sugere que até 200 microgramas não são capazes de intoxicar uma pessoa. Outra pesquisa, disponível no Journal of Studies on Alcohol and Drugs, descreve um caso de ingestão acidental de mais de 1 mil microgramas, que levou uma paciente para o hospital.
“Mesmo em doses muito altas, o LSD não é tóxico o suficiente para causar falência de órgãos ou morte diretamente, já que ele tem poucos efeitos físicos. No entanto, pode ocorrer uma intoxicação aguda, que representa riscos sérios de efeitos psicológicos, além de aumento da frequência cardíaca e pressão arterial”, diz Gazarini.
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Existe risco de dependência?
O LSD é considerado uma droga não viciante.
“Não causa dependência, porque ele não ativa diretamente os circuitos de recompensa no cérebro, como fazem drogas como nicotina, álcool ou opioides. Ele também não leva ao desenvolvimento de tolerância que gere compulsão para uso frequente”, diz o farmacologista.
No entanto, pode haver um risco psicológico em algumas pessoas, que buscam repetidamente os efeitos da droga para escapar da realidade ou experimentar estados alterados de consciência.
Esse comportamento, embora não seja dependência no sentido clássico, pode gerar problemas sociais, emocionais ou de saúde, sendo considerado um uso problemático de substância.
Como são os tratamentos de reabilitação?
Como o LSD não causa dependência clássica, a busca por tratamento associado ao uso dessa substância é baixa.
Em caso de uso problemático, o tratamento do uso problemático geralmente se concentra no apoio psicológico e social, além do controle de sintomas em intoxicações agudas. Podem ser adotados:
1. Psicoterapia: terapias cognitivo-comportamentais (TCC) para ajudar a entender e lidar com os motivos do uso da droga, principalmente quando há uso repetido como forma de “escape da realidade”. Terapias voltadas ao manejo de ansiedade ou traumas associados ao consumo podem ser adotadas, quando essas consequências persistirem.
2. Apoio psiquiátrico: em casos de transtornos mentais subjacentes (como ansiedade, depressão ou psicose), o tratamento com medicamentos pode ser necessário. Geralmente, antipsicóticos (medicamentos usados em esquizofrenia) e sedativos podem ser adotados para controle agudo de intoxicações.
3. Internação (em casos graves): quando há sintomas psiquiátricos severos em uma intoxicação aguda, pode ser necessária hospitalização temporária para estabilização.
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