“Cheguei ao pronto-socorro carregando minha filha desmaiada e logo apontei a região do baço, foi só depois disso que a médica percebeu a gravidade da situação”, contou Elizabeth do Carmo, mãe de dois jovens com a doença falciforme, durante o seminário Doença Falciforme: Conscientizar para Um Melhor Cuidado, promovido pela farmacêutica Global Blood Therapeutics (GBT), subsidiária da Pfizer.
Além de emocionar boa parte dos presentes, o relato de Elizabeth chega para reforçar a necessidade de maior disseminação de informações sobre o problema, inclusive entre os profissionais de saúde.
A doença, também conhecida como anemia falciforme, altera o formato das hemácias – células transportadoras de oxigênio no sangue – que assumem o formato de foice. Tal processo interfere com o fluxo sanguíneo e pode levar à obstrução e ao entupimento dos vasos, prejudicando órgãos.
Entre as complicações está o perigoso “sequestro” do baço, que é a retenção de sangue no órgão, e foi mencionado por Elizabeth. Acidente vascular cerebral, o AVC, comprometimento neurocognitivo e no crescimento, infecções e fortes dores engrossam a lista.
Durante o evento, outros danos foram pinçados de dados inéditos vindos da pesquisa SHAPE (Sickle Cell Health Awareness, Perspectives and Experiences), que ouviu mais de 1300 pacientes, cuidadores e profissionais de saúde (HCPs) em 10 países, inclusive no Brasil.
74% dos portadores da doença brasileiros apontaram a fadiga com um dos sintomas mais frequentes, 58% se queixaram das manchas amareladas nos olhos/unhas/pele e 55% mencionaram dores ósseas. Ansiedade, dificuldades para dormir, falhas na memória também foram listados.
Já sobre os cuidadores do nosso país, ouvidos na pesquisa, 68% relataram impactos na saúde mental. Adversidades financeiras desencadeadas por faltas no trabalho aparecem no estudo.
E as dificuldades não param por aí.
Maria Zenó Soares da Silva, coordenadora da Fenafal – Federação Nacional das Associações das Pessoas com Doença Falciforme, que foi diagnosticada tardiamente, chamou a atenção para a vulnerabilidade social. “Além de enfrentar a dor física, temos que lidar com as múltiplas faces de discriminação e racismo”, disse. Estudos mostram que a doença vitimiza mais as mulheres (52%) e a população negra (80%).
“Trata-se de uma alteração genética originária da África”, disse a hematologista e pesquisadora Clarisse Lobo, do Hemorio (RJ). Surgiu como adaptação evolutiva, para defender o organismo da malária.
“Com o tráfico forçado de pessoas africanas, o gene veio para a América”, contou a médica que também é membro do Comitê de Glóbulos Vermelhos e do Ferro da Associação Brasileira de Hematologia e Hemoterapia (ABHH).
Para Zenó é preciso unir as forças para disseminar o conhecimento, garantir acesso ao tratamento e trazer mais qualidade de vida tanto aos pacientes quanto aos cuidadores. “Ninguém chega a lugar nenhum sozinho, é luta ou luto”, salientou.