Após o estrago da Ômicron, uma sub-variante dela tem chamado a atenção. Primeiro, chegou ao Brasil a BA.1, responsável pelo surto de Covid-19 ocorrido entre dezembro e janeiro. Mais recentemente, foram detectados casos de BA.2 no país. Além disso, a China estuda as características de mais uma parente dela que foi encontrada por lá.
Mais contagiosa que suas antecessoras, a BA.2 ainda é objeto de estudo, mas assusta pelo número de infectados.
No Reino Unido, ela já é responsável por mais de 95% dos casos de Covid-19, e falta pouco para que números semelhantes cheguem à França, Itália e Alemanha, segundo dados do site CoVariants.org.
Na Dinamarca, o governo comparou a velocidade de disseminação da nova mutante e da BA.1. Enquanto a anterior surgiu e rapidamente passou a responder por 29% das infecções, a BA.2 atingiu quase 40% do total de casos positivos em intervalo de tempo semelhante.
Saiba o que se descobriu até agora e porquê a mutação ganhou o apelido de “Ômicron silenciosa”.
Quem é a BA.2?
Ela é parente da variante Ômicron, então vamos relembrar a original: ela possui 60 mutações em todo o vírus em comparação ao Sars-CoV 2 “original”, de Wuhan. Destas, 32 alterações estão na proteína Spike – estrutura usada pelo vírus para infectar nossas células.
Tem outro detalhe: 15 destas 32 mutações afetam o que os pesquisadores chamam de Receptor Biding Domain (RBD), que é a capacidade de interação entre a proteína spike e o receptor da célula do hospedeiro.
“Nesta área RBD, a variante BA.2 possui quatro mutações que não são encontradas na BA.1. Estudos apontam que o maior poder de transmissibilidade da BA.2 vem daí”, explica a bióloga Maria Helena Menezes, pesquisadora do Laboratório de Imunopatologia Keizo Asami da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
Uma notícia boa é que os dinamarqueses constataram que as pessoas vacinadas e com reforço transmitiram pouco a BA.2 aos seus familiares, enquanto aqueles que não tomaram nenhuma injeção passaram o vírus adiante 2,6 vezes mais rápido. Tudo indica, ainda, que os infectados pela BA.1 ficaram imunes à variante mais nova.
“Ela ganhou o apelido de ‘silenciosa’ porque nem sempre o infectado tem sintomas e, ainda, ela têm escapado dos testes PCR, dando falsos-negativos”, relata a pesquisadora. Ainda se investiga as razões desses fenômenos.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) a classifica como uma variante de preocupação, lista em que ainda está a Delta e por onde já passaram as mutantes Alfa, Beta e Gama.
Pode ser leve?
A cada nova mutação, é preciso avaliar tanto a estrutura do vírus quanto a dinâmica da pandemia para entender o comportamento dela.
“A Ômicron e suas variantes surgiram quando boa parte da população já estava imunizada, por isso não pudemos considerá-la leve, porque ela provocou a doença grave em quem não estava protegido. É a mesma coisa com a essa cepa”, alerta o virologista Fernando Spilki, coordenador da Rede Corona-Ômica, que monitora a evolução genética do vírus.
Com a BA.2, a lógica é a mesma. Dados preliminares apontam que a doença provocada por ela tende a ser mais leve, mas indivíduos não vacinados e imunocomprometidos seguem em maior risco de ter quadros graves.
Como está o Brasil?
Por aqui, ainda está predominando a subvariante BA.1. “A avaliação até agora é que há uma baixa dispersão da BA.2, com regiões que não passam de 4% dos casos. Na população brasileira em geral, ela representa menos de 1% das amostras que passam por sequenciamento genético”, afirma Spilki.
“É um movimento muito semelhante com o que ocorreu com a Delta (identificada na Índia) e a Gama (descoberta no Brasil). Elas se dispersaram rápido”, lembra o virologista.
Vacinas ainda nos protegem?
É provável que haja algum escape dos atuais imunizantes, mas ainda não há estudos que comprovem esse fato.
Como ocorreu no caso da primeira versão Ômicron, em que a terceira dose teve um papel crucial na luta contra a hospitalização e mortes, as pesquisas até agora apontaram que os imunizantes continuam protegendo do agravamento do quadro.
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Segundo artigo publicado na revista Science, que reúne estudos sobre essa variante, os cientistas ainda não chegaram a um consenso sobre o risco de infecção entre vacinados. Dinamarqueses concluíram que mesmo as pessoas que receberam doses de reforço teriam três vezes mais chances de pegar a BA.2 do que a BA.1.
Por outro lado, os britânicos entenderam que as pessoas com doses de reforço têm o mesmo nível de proteção contra infecções sintomáticas com BA.1 ou BA.2 (63% e 70%, respectivamente).
Como lidar com a notícia de uma nova variante?
Com lacunas na distribuição das vacinas mundo, a probabilidade de surgirem variantes se mantém. É com a circulação livre que o vírus consegue tirar proveito dos hospedeiros para se multiplicar e se transformar.
A tentativa de barrar essa evolução é seguir adotando medidas preventivas e manter o calendário de vacinação em dia.
“Ter cuidado é nosso padrão daqui para frente. Usar máscara é o básico, é cedo para liberar geral. O comportamento também tende a mudar. Não deve ser aceitável, por exemplo, entrar em um hospital sem proteção”, avalia Maria Helena.
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A confiança que está transparecendo pelo mundo, com a decisão de abandonar máscaras e liberar eventos, pode estar passando o recado errado sobre o contexto da pandemia, refletem os pesquisadores.
“Claro que óbitos, casos graves e níveis de internação melhoraram, mas ainda é possível sofrermos uma reviravolta por causa da evolução do vírus, que é imprevisível. Não podemos ter um otimismo irresponsável que leve as pessoas a pensarem que não teremos mais problemas”, alerta Spilki.
“E ainda teremos de lidar com a Covid longa e outras consequências da doença no organismo de quem foi infectado”, completa Maria Helena. Mesmo com variantes “mais leves”, as sequelas do pós-Covid ainda estão sendo notadas.