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Covid-19: anticoagulantes em doses altas não trariam benefícios adicionais

Estudo diz que remédios contra trombose em doses elevadas não reduzem risco de morte em pessoas hospitalizadas por coronavírus, mas favorecem sangramentos

Por Maria Tereza Santos
Atualizado em 28 Maio 2021, 14h46 - Publicado em 21 Maio 2021, 12h20

O grupo Coalizão Covid-19 Brasil, formado por hospitais, redes e institutos de pesquisas, investigou o uso de anticoagulantes no tratamento de pacientes internados em decorrência do coronavírus. Os cientistas concluíram que, quando prescritos em doses altas, esses medicamentos não melhoram a condição clínica e aumentam o risco de sangramentos. A partir dos dados, alguns especialistas passaram a questionar inclusive a necessidade de receitar anticoagulantes a quaisquer indivíduos hospitalizados com Covid-19 que não tenham comprovadamente quadros de trombose.

Vamos por partes: já se sabe que essa infecção eleva a possibilidade de eventos trombóticos em vasos sanguíneos pequenos. Em muitos locais, o protocolo atual para pessoas hospitalizadas com o Sars-CoV-2 indica a utilização de anticoagulantes de forma profilática — em pequenas doses para prevenir trombos, assim que surgirem os primeiros indícios dessa consequência. A suspeita é verificada por meio de um exame de sangue chamado de D-dímero.

A ideia é evitar tromboses e a perigosa embolia pulmonar, que ocorre quando o coágulo se desprende de um vaso qualquer e segue para o pulmão.

O que os cientistas brasileiros decidiram checar é se, nesses casos, aplicar uma dose completa de anticoagulante seria mais eficaz para prevenir o agravamento da enfermidade e as mortes.

Para a pesquisa, foram selecionados 615 voluntários hospitalizados em 31 instituições no Brasil. Todos possuíam aquele D-dímero elevado ao entrarem no pronto-socorro.

Aí, 304 pacientes receberam as doses profiláticas (menores), enquanto 311, as terapêuticas (maiores). Nesse segundo grupo, os participantes estáveis usaram diariamente um anticoagulante chamado rivaroxabana. Já os instáveis, que estavam em um estado crítico, tomaram enoxaparina no período de hospitalização ou uma combinação de heparina seguida por rivaroxabana por 30 dias. A turma do protocolo profilático recorreu apenas à heparina.

No fim da análise, realizada entre junho de 2020 e fevereiro de 2021, os pesquisadores constataram que a taxa de mortalidade, o tempo de internação, a incidência de eventos trombóticos e a necessidade de oxigênio suplementar não foram estatisticamente diferentes entre os grupos. Em outras palavras, do ponto de vista de benefícios, não houve quaisquer diferenças.

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E o problema: quem recebeu a dose cheia apresentou mais sangramentos que o grupo profilático. De acordo com a cardiologista Viviane Veiga, da BP – A Beneficência Portuguesa de São Paulo e coautora da investigação, o grande achado foi entender qual a quantia adequada de medicamentos a ser dada na Covid-19.

“Apesar de muitos acharem que precisamos dar uma quantidade de anticoagulação plena para os casos graves, observamos que isso não é seguro”, pontua Viviane.

As limitações… e uma interpretação alternativa

“A principal limitação é que não analisamos outras drogas, que poderiam ter efeitos diferentes”, afirma Viviane. Ora, o arsenal de anticoagulantes é longo, e só alguns foram empregados na investigação.

Além disso, os quadros mais críticos representavam só 7% dos voluntários. Diante disso, a especialista acredita que os resultados da pesquisa só são confiáveis para os hospitalizados estáveis. Segundo ela, outros levantamentos deveriam ser feitos para examinar essa questão especificamente nos pacientes em estado crítico.

O cardiologista José Alencar, do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, em São Paulo, que participou da investigação, acrescenta que faltou comparar os participantes com um grupo placebo — que sequer tomaria um anticoagulante — para verificar se esses medicamentos trazem quaisquer benefícios. Pois é: ele suspeita que esse tratamento não necessariamente seria vantajoso para os pacientes hospitalizados com Covid-19, independentemente da dose.

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A hipótese de que a doença aumenta a probabilidade de trombose está comprovada, mas isso não significa automaticamente que o remédio contra isso diminua a mortalidade nos infectados”, pontua Alencar, que é especialista em medicina baseada em evidências.

Na visão dele, esses remédios só apresentam mais benefícios que riscos quando a trombose realmente está presente, e confirmada a partir de uma ultrassonografia. A prescrição preventiva, como tem acontecido costumeiramente no tratamento dos casos graves de Covid-19, não seria uma boa, considerando a probabilidade de sangramentos.

“Há médicos que ainda têm uma tendência mecanicista, mas a gente não conhece todos os fatores por trás da Covid-19 que provocam suas diferentes consequências. Acho que, a partir desse estudo, deve acontecer uma discussão profunda sobre a indicação de anticoagulantes”, reconhece o profissional.

Em seu perfil no Twitter, Alencar mostrou que essa classe de remédios carece de comprovação científica inclusive contra doenças para as quais é aplicada há décadas, como a trombose venosa profunda.

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